Recuo de cortes salariais nos contratos colectivos não convence sindicatos

Governo desiste da iniciativa, por esta ser uma “questão sensível” para a UGT.

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O ministro Pedro Mota Soares garantiu que a prioridade é alterar os critérios para a publicação das portarias de extensão Rita Baleia

Poucos dias após ter avançado com a proposta, o ministro do Emprego e da Segurança Social, Pedro Mota Soares, anunciou que vai desistir da iniciativa que abria a porta a reduções ou cortes nos complementos salariais, após a caducidade das convenções colectivas. O passo foi dado para não afastar a UGT, mas terá ficado a meio caminho. Lucinda Dâmaso, presidente da UGT, garantiu que não fará um acordo “a qualquer preço” com o executivo. Já a CGTP, pela voz de Arménio Carlos, acusou o Governo de “dar com uma mão e de tirar com as duas”.

A decisão do executivo, apresentada ontem, foi tomada menos de uma semana depois de o Governo ter enviado aos parceiros sociais uma alteração ao Código do Trabalho em que se previa que, após o fim dos contratos, os trabalhadores apenas manteriam a remuneração-base e as diuturnidades (ligadas à antiguidade na empresa), perdendo outros complementos previstos nas convenções,

“Percebemos que alterar a legislação relativamente a uma clarificação da lei sobre o que integra o conceito de remuneração era algo de particularmente sensível para a UGT. Para conseguirmos manter sempre uma boa-fé negocial, não vamos avançar com a clarificação dessa matéria”, disse o ministro no final da reunião da Comissão Permanente de Concertação Social que correu ontem.

Acrescentou que, para o Governo, “é fundamental a protecção dos trabalhadores durante o período de caducidade e de sobrevigência”. “Não iremos propor qualquer alteração à actual legislação”, reforçou.

O Governo mantém a proposta que visa reduzir a validade das convenções colectivas (de cinco para dois anos, no caso das cláusulas que dizem que a convenção só caduca quando for substituída por outra, e de 18 para seis meses), mas acabou por ceder às críticas da UGT e da CGTP que se insurgiam contra a perda de direitos previstos nessas convenções.

O ministro garantiu que a prioridade é alterar os critérios para a publicação das portarias de extensão, permitindo que os efeitos da contratação colectiva (aumentos salariais e organização do tempo de trabalho) sejam alargados ao maior número possível de trabalhadores e permitir a extensão do regime especial de pagamento do trabalho extraordinário até ao final do ano (a lei previa a suspensão dos contratos colectivos em matéria de pagamento de trabalho extra até final de Julho de 2014).

Mota Soares justificou ainda que a extensão do pagamento do trabalho extra foi uma das medidas discutidas com a troika, que recuou na redução das indemnizações por despedimento ilícito.

Já em relação à suspensão dos contratos colectivos em caso de crise empresarial — proposta que, segundo os relatos de João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), não suscitou “muitas simpatias” aos parceiros sociais —, o ministro não tomou uma posição definitiva.

Apesar da sensibilidade do ministro às posições da UGT, Lucinda Dâmaso, presidente da confederação, garantiu que não fará um acordo “a qualquer preço”. E deixou claro que há dois pontos que são “incontornáveis”: permitir que as comissões sindicais negoceiem a suspensão de contratos colectivos “não faz qualquer sentido” e a partir de 1 de Agosto de 2014 os trabalhadores têm de começar a receber pelo trabalho suplementar de acordo com o que está previsto nos contratos colectivos.

Procura de consenso
O recuo do Governo não foi entendido por António Saraiva, presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP/CEP), como sendo definitivo. “É excessivo dizer que o Governo recuou. É uma das matérias de que o Governo admite prescindir”, disse.

A CIP, acrescentou, continuará a exigir a clarificação do conceito de remuneração “para diminuir a litigância” em torno deste assunto. Porém, a confederação admite ceder nesta matéria no contexto de um acordo e desde que não haja recuos em relação à suspensão dos contratos em situações de crise empresarial, à redução dos prazos de caducidade das convenções colectivas e à manutenção do regime especial de pagamento do trabalho extraordinário pelo menos até ao final do ano (embora a CIP exija por mais dois anos).

Para a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), o recuo do Governo ficou claro. Algo que o presidente João Vieira Lopes não valoriza: “O mais importante é a agilização dos prazos [de caducidade das convenções colectivas] e não o seu conteúdo.”

A CGTP acusou o Governo de “dar com uma mão e de tirar com as duas”. “O Governo disse que o conceito de retribuição se manteria, mas mantém a redução do tempo para a caducidade das convenções e a intenção de prolongar a redução do trabalho extraordinário até ao fim do ano.”

Arménio Carlos, secretário-geral da confederação, acredita que o ministro irá recuar também na intenção de permitir a suspensão dos contratos colectivos em situações de crise empresarial, por acordo com as comissões sindicais e intersindicais. A CGTP entende que a proposta tem problemas constitucionais.

“É táctica negocial. Pede-se tudo, mas há objectivos centrais: reduzir a caducidade das convenções colectivas e a diminuição da remuneração dos trabalhadores e a partir daqui introduzem alguns mecanismos de diversão. A retribuição e a suspensão foram artifícios introduzidos na negociação”, alertou.

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