Embaladores acusam Governo de usar SPV para subir encaixe da privatização dos resíduos

Accionistas da SPV estão contra aumento de 7% do valor que a sociedade gestora dos resíduos de embalagens paga aos sistemas multimunicipais pela recolha selectiva do lixo.

Foto
Reciclagem continua a subir, mas vidro não deverá cumprir a meta europeia Fernando Veludo

A Embopar, accionista maioritária da Sociedade Ponto Verde (SPV), teme que o aumento das contrapartidas pagas por esta entidade aos sistemas municipais de gestão de resíduos sejam usadas pelo Governo para tornar mais atractivo o concurso de privatização da empresa, já que representam uma receita garantida para o futuro comprador.

Em causa está a proposta de aumento dos valores de contrapartida que a SPV paga aos sistemas multimunicipais (EGF) e intermunicipais de gestão de resíduos urbanos para fazerem a recolha selectiva e triagem do lixo, que foi apresentada pelo Ministério do Ambiente em Janeiro e que representa, segundo esta entidade gestora do sistema de resíduos de embalagens, um agravamento de 7% face aos valores actuais.

Um agravamento cujos pressupostos a Embopar, que reúne produtoras e importadoras de produtos embalados como a Sovena, Sumol+Compal, Unilever e Renova (e que é quem financia a SPV através do chamado “valor ponto verde”, que varia em função dos materiais das embalagens) diz não compreender. “Não há custos acrescidos que justifiquem esta subida, antes pelo contrário”, disse ao PÚBLICO José Brito Ribeiro, representante da Sovena na comissão executiva da SPV.

“É algo que só se pode perceber numa lógica de aumentar as receitas dos sistemas”, afirmou o responsável, acrescentando que a SPV “desconhece a forma de cálculo do modelo” utilizado pelo Governo para actualizar o valor da contrapartida, que deverá vigorar até ao final de 2015 (data em que, na proposta do Ministério do Ambiente, será apresentado novo modelo de cálculo).  

Em 2012, os 30 milhões de euros de contrapartidas da SPV representaram cerca de um quinto das receitas da EGF (157 milhões de euros). As contas de 2013 da empresa ainda não são conhecidas, mas as contrapartidas pagas pela SPV subiram para 38,733 milhões de euros. Sendo “expectável um incremento” das quantidades de resíduos recolhidos, a Embopar receia, por isso, que a subida do valor de contrapartida seja um mecanismo utilizado pelo Governo para engordar as receitas futuras da EGF e maximizar o montante do encaixe com o concurso de privatização, cujo caderno de encargos foi aprovado esta quinta-feira, em Conselho de Ministros.

“Se num processo de privatização o vendedor tem a tentação de vender ao preço mais alto e o comprador espera uma garantia de retorno do que vai investir”, há razões para temer que isso “possa ser feito à custa de distorcer o que as empresas [embaladoras] pagam” aos sistemas, disse ao PÚBLICO Rui Frade, administrador da Sumol+Compal.

Segundo a SPV, o aumento de 7% aplicado às quantidades estimadas de resíduos retomados pelos sistemas multimunicipais no período transitório de 2014/2015 representaria um acréscimo dos valores de contrapartida de cerca de 8 milhões de euros. Um aumento que teria de ser reflectido no “valor ponto verde” e “para o qual não é feita qualquer demonstração de correspondência” em termos de “um acréscimo equivalente de custos com a recolha selectiva e triagem” que é suportada pelos sistemas e que os embaladores/importadores estão obrigados, por lei, a financiar através da SPV.

Os embaladores garantem que, se este aumento de 7% fosse aplicado para lá do período transitório, entre 2016 e 2020, o custo acrescido para a SPV seria de 29 milhões de euros. O reflexo seria sentido pelo consumidor “aquando da aquisição de produtos embalados”, garantem.

“O objectivo da SPV é atingir as metas ambientais ao menor custo possível, não é subsidiar sistemas”, frisou Brito Ribeiro, que garante que a Embopar, que detém 54,2% da SPV, está disponível para “procurar caminhos” de consenso com o Governo, tendo também apresentado, no âmbito do pedido de nova licença de actividade à Agência Portuguesa do Ambiente, um modelo para a determinação do valor da contrapartida que "permite calcular o justo valor" dos serviços de recolha selectiva e triagem dos resíduos urbanos de embalagens.

Sem uma explicação "clara e transparente" do aumento de custos subjacente à proposta de aumento de 7% da contrapartida e da sua fórmula de cálculo, "esta fica reduzida a uma aparente tentativa de incrementar o envelope financeiro a pagar pelos embaladores/importadores de forma a reduzir o risco do processo de privatização em curso", defende a Embopar.

Sugerir correcção
Comentar