Economia portuguesa foi vítima de “doping temporário”

Governador do Banco de Portugal fala no Ciclo de Conferências da CIP.

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Carlos Costa, governador do Banco de Portugal josé Manuel Ribeiro/Reuters

Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, admitiu, nesta quinta-feira no ciclo de conferências da Confederação da Indústria Portuguesa (CIP), que Portugal terá beneficiado de um "doping temporário” que durante anos sustentou artificialmente a procura interna e levou à crise actual.

Segundo Costa, o Estado, as empresas e as famílias foram gastando acima das suas possibilidades, levando então ao “destorcimento do modelo produtivo”. Este fenómeno provocou uma excessiva alavancagem da economia portuguesa.

Costa acrescenta que o investimento efectuado durante este período foi principalmente para fins não produtivos. “Não vale a pena uma empresa investir numa cantina ou num edifício de prestígio,” disse o Governador, “se depois não tem dinheiro para as máquinas”. Assim, durante anos, Portugal endividou-se para comprar bens acessórios que em pouco acrescentaram a produtividade nacional.

Este recurso ao crédito por parte das empresas levou também a “um distanciamento entre o empresário e a empresa”. Carlos Costa diz que as empresas portuguesas deram prioridade ao endividamento em vez de recorrer a capitais próprios, assim distanciando os empresários dos riscos inerentes à sua actividade. Se um empresário não é pessoalmente afectado pelo risco do seu investimento, diz Costa, contrairá dívidas e investirá de uma maneira menos sustentável. Isto levou a que as empresas nacionais estejam, actualmente, muito endividadas.

Para além do problema do excessivo endividamento do país, o Governador do Banco de Portugal diz que a economia portuguesa também tem problemas mais estruturais. Costa afirma que o “tecido produtivo” do país é adversamente afectado pela falta de articulação entre a formação das pessoas e as necessidades das empresas. A educação, formação profissional e a investigação encontram-se inteiramente desfasadas da realidade comercial.

O governador do BdP conclui que o “triângulo” da inovação e as empresas estão em esferas distintas porque são financiadas por entidades completamente diferentes. Isto conduziu à realidade actual em que as competências das pessoas não são absorvidas pela economia portuguesa, levando muitos a recorrerem à emigração. Se houvesse uma ligação entre as universidades e as empresas podia-se adequar a pesquisa e formação às necessidades de mercado, sugeriu.

Os benefícios desta necessária união entre empresas e universidades tem um exemplo prático na indústria do calçado. Graças a uma coligação entre empresas, laboratórios e universidades, a indústria do calçado foi capaz de desenvolver a técnica de corte de peles por jactos de água.

Costa refere que a acrescentar ao problema dos recursos humanos portugueses, a precariedade do emprego impede a formação profissional. Os jovens encontram-se em empregos pouco duradouros, nunca tendo a estabilidade para justificar a formação profissional. Esta questão tem sido um entrave ao aumento da produtividade do país.

Contudo, o governador acredita que a crise levará a uma união bancária europeia que abonará a favor de Portugal, acreditando que a união levará as empresas a serem independentes dos problemas de endividamento do Estado. Utilizando os Estados Unidos como exemplo, Costa refere que Portugal funcionará como a Califórnia: apesar do Estado ter falido, Sillicon Valley não tem tido falta de investimentos dos bancos americanos.

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