Falta de informação volta a ensombrar assembleia da PT SGPS

CMVM diz que há incógnitas sobre o conhecimento da Oi na Rioforte, e a Oi queixa-se que Henrique Granadeiro prestou informação falsa.

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Assembleia geral corre risco de novo adiamento Nuno Ferreira Santos

A assembleia de accionistas para decidir a venda da PT à Altice está marcada para quinta-feira, mas a pressão para que o negócio não seja votado mantém-se. Na segunda-feira, o presidente da mesa da assembleia geral (AG) da PT SGPS, António Menezes Cordeiro, afirmou numa carta enviada à administração da PT e à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) que tem de assegurar-se que os accionistas podem votar de forma esclarecida.

Menezes Cordeiro volta a insistir que há “inadimplemento (existente e confirmado) do contrato Oi/PT” no que se refere à criação de um grande operador lusófono e que “o esquema de reversão mútua [da combinação de negócios] é possível” e deveria ser estudado. Este é um tema controverso, porque inevitavelmente empurraria as duas empresas para um processo de litigância que se arrastaria por vários anos. Ainda assim, Menezes Cordeiro entende que a PT SGPS deve tentar anular o acordo.

E embora afirme à CMVM que “nada tem a ver com os negócios em discussão”, tem obrigação de assegurar-se que  os accionistas “estão esclarecidos no momento da votação”. Segundo a CMVM, não estão, porque “há aspectos ainda a carecer de clarificação”.

Estão em curso “processos administrativos e outros cujas conclusões poderão trazer novos elementos”, diz a CMVM na resposta enviada a Menezes Cordeiro nesta terça-feira. Entre elas o grau de conhecimento da Oi quanto às aplicações na Rioforte. O regulador lembra que a auditoria solicitada pela PT SGPS à PwC “conheceu limitações relevantes” e nota que foram excluídos do relatório quaisquer juízos jurídicos sobre a actuação dos membros dos órgãos sociais (administração, comissão executiva e de auditoria).

Isso mesmo foi ontem confirmado pelo presidente da PwC, José Pereira Alves, na comissão de inquérito ao BES, referindo que foram retirados do relatório de auditoria “juízos de valor de ordem jurídica relativos ao que foram as responsabilidades individuais dos órgãos sociais da PT” no caso Rioforte. E foram retiradas a pedido da PT SGPS, num processo que motivou “uma discussão muito grande”, admitiu José Alves.

Também não foi incluída na análise “a questão do conhecimento da Oi”, ou seja de membros com funções relevantes nos seus corpos sociais, quanto aos investimentos. Foi apenas “abordado o conhecimento dos mesmos” por parte de Zeinal Bava, lembra a CMVM. O regulador considera que sobre estas matérias existem “elementos adicionais” que talvez permitam retirar consequências ao nível dos novos termos da fusão renegociados com a Oi (um processo que partiu do alegado desconhecimento da operadora brasileira quanto às aplicações).

O ex-presidente da PT, Henrique Granadeiro, garantiu na semana passada à CMVM que as empresas da PT Portugal (empresa que foi presidida até Agosto por Bava, que era simultaneamente presidente da Oi) foram responsáveis por investimentos de 697 milhões de euros. Granadeiro dá força a este argumento referindo que a passagem da gestão da tesouraria centralizada da PT para a PT Portugal aconteceu a 10 de Abril (antes da renovação dos investimentos de 897 milhões, a 15 e 17 de Abril).

Brasileiros refutam acusações
Já a Oi contestou esta terça-feira junto de Menezes Cordeiro e da CMVM os argumentos de Granadeiro. Numa carta a que o PÚBLICO teve acesso, a empresa brasileira fala mesmo em “informações falsas”. Para a Oi, ainda que tenha havido uma transferência da gestão de tesouraria a 10 de Abril, tanto a PT Portugal, como a PT International Finance se mantiveram na esfera da PT SGPS, que à data dos investimentos era presidida por Granadeiro, até 5 de Maio. A Oi anexa à carta o esclarecimento sobre a Rioforte, que a PT divulgou a 30 de Junho. A nota assinada por Granadeiro e por Luís Pacheco de Melo (então administrador financeiro da PT SGPS) representa, no entendimento da Oi, a assunção da responsabilidade do ex-gestores da PT.

A operadora brasileira defende que não se pode falar em incumprimento dos contratos para refutar a venda da PT Portugal quando está a permitir que os accionistas decidam ou não se querem vender a empresa. E garante que é impossível desfazer um aumento de capital que foi colocado junto de investidores de todo o mundo.

Na nota enviada ao mercado esta terça-feira a CMVM considera ainda que os os pareceres de direito disponibilizados pela PT SGPS na semana passada não correspondem “ao necessário estudo aprofundado (jurídico e económico) das alternativas que deverão ser avaliadas pelos accionistas da PT SGSP.

Só o conselho de administração da holding está em condições de informar “sobre as condições em que a Oi teve conhecimento das aplicações” e em que medida este grau de conhecimento influenciou os novos termos de fusão aprovados em Setembro (a troca de acções da Oi pela dívida da Rioforte), frisa a CMVM. Da mesma forma, só o conselho de administração poderá informar sobre as consequências da oposição do regulador brasileiro CVM a esta permuta e explicitar “o impacto que numa eventual alteração dos contratos” terá a aprovação da venda da PT Portugal, que assim passa para a esfera de terceiros.

Incógnitas sobre as transferências de passivos
A CMVM recorda ainda que em Junho a dívida bruta consolidada da PT Portugal era de 6547 milhões de euros, dos quais 81% correspondia a dívida média e de curto prazo e 4733 milhões respeitavam a empréstimos por obrigações não convertíveis, onde se incluem 400 milhões de um empréstimo obrigacionista de retalho emitido pela PT Portugal, sendo a restante dívida da PT International Finance (PTIF).

 A CMVM não recebeu as cópias dos acordos de venda com a Altice, mas considera que parte ou a totalidade dos passivos serão transferidos para a Oi. “Poderá desta forma resultar que uma parte não determinada dos créditos sobre a PT Portugal seja transformada em créditos sobre a Oi, “com risco exclusivamente ligado a esta empresa”. Com as revisões em baixa das notações financeiras da Oi (o rating atribuído pela Fitch à empresa brasileira é "lixo"), isto significa que o risco para os credores poderá agravar-se. Para além desta dívida, registavam-se ainda as responsabilidades com benefícios de reforma (967 milhões de euros) e contas a pagar (525 milhões), que poderão em parte ou na totalidade passar para a Oi, lembra o regulador.

Sindicato e comissão de trabalhadores em pólos opostos
Também esta terça-feira, o Sindicato dos Trabalhadores da Portugal Telecom (STPT) veio pedir, enquanto pequeno accionista da empresa, que Menezes Cordeiro desconvoque a reunião da próxima quinta-feira por ter "dúvidas sérias de que haja alguma vantagem para os accionistas da PT SGPS, SA na alienação da PT Portugal”, refere a estrutura sindical numa nota.

O STPT pede que seja marcada uma nova reunião de accionistas “onde, previamente, possa ser discutida a resolução do contrato concluído com a Oi, mas já com todas as informações relevantes disponibilizadas de forma a que os accionistas possam deliberar conscientemente”.

Já a comissão de trabalhadores da PT entende que o que é necessário é "a clarificação do futuro da empresa" o mais rapidamente possível. Rejeitando os "argumentos emocionais", fonte da comissão de trabalhadores sublinhou que um universo empresarial com uma dívida de quase 19 mil milhões de euros, como é a Oi mais a PT, jamais será viável e que a empresa precisa de "projectos concretos" para garantir os postos de trabalho e a continuidade da liderança de mercado.

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