Bruxelas vai analisar os excedentes da Alemanha sem pôr em causa o seu modelo económico

Olli Rehn e Durão Barroso sublinharam que a Comissão não está a criticar o modelo económico.

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O desconforto foi palpável esta quarta-feira entre os responsáveis da Comissão Europeia quando anunciaram a sua já esperada decisão de lançar uma análise aprofundada da economia da Alemanha para determinar se a sua dependência excessiva das exportações poderá estar a prejudicar o resto da Europa.

A decisão de Bruxelas resulta das novas regras europeias de "governação económica" instituídas em plena crise da dívida soberana, que impõem o acompanhamento da emergência de eventuais "desequilíbrios macroeconómicos" nos Estados-membros capazes de desestabilizar a totalidade da economia europeia, a par da imposição de medidas para a sua correcção.

As novas regras, instituídas há dois anos, têm visado apenas os países em situação de défice relativamente a cerca de 30 indicadores macroeconómicos. Bruxelas confirmou, aliás, esta quarta-feira que os 13 países que colocou sob vigilância há seis meses voltarão a ser objecto de análises aprofundadas para averiguar se os desequilíbrios macroeconómicos então detectados se mantêm.

Estes países incluem a França, Espanha, Itália ou Holanda. Na sua decisão de quarta-feira, Bruxelas acrescentou mais três – Luxemburgo, Croácia e, sobretudo, a Alemanha –, o que significa que todas as maiores economias do euro estão agora sob vigilância.

No caso da Alemanha, a decisão é inédita pelo facto de visar um país excedentário e que é considerado o modelo económico da Europa. Em causa está o seu excedente externo que ronda 7% do PIB desde 2007 e assim deverá permanecer nos próximos anos.

Bruxelas, que colocou o limiar de sustentabilidade dos excedentes externos em 6% do PIB, não teve assim alternativa senão lançar uma análise aprofundada da situação alemã, embora sublinhando que este passo não significa necessariamente que se trate de um "desequilíbrio macroeconómico" passível de correcção.

Essa decisão só será tomada no final da análise, em Março, altura em que Bruxelas decidirá se se justifica ou não emitir uma recomendação para o Governo alemão tomar medidas destinadas a corrigir a situação.

Berlim tem estado sob um fogo cerrado de críticas de europeus, americanos e FMI por causa do seu excedente externo, que traduz um volume muito superior de exportações do que de importações e impede a penetração no seu mercado das exportações de que os parceiros europeus, sobretudo os periféricos, precisam desesperadamente para relançar as suas economias. 

Estas críticas são, no entanto, vividas internamente como uma afronta ao que é visto como um sucesso nacional.

Olli Rehn, comissário europeu responsável pelos assuntos económicos e financeiros, que se multiplicou nos últimos dias em justificações da decisão da Comissão, lamentou, aliás, a "politização excessiva" da questão em Berlim. Rehn, que elogiou o comportamento "excelente" e o "sucesso" da economia alemã, garantiu que a análise dos seus serviços será conduzida de "mente aberta" e "sem conclusões pré-determinadas".

Tanto Rehn como Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, trataram, de resto, de sublinhar na quarta-feira que a sua decisão não constitui de modo algum uma crítica ao modelo económico alemão.

O problema para a Europa não é que a Alemanha é competitiva, mas que os outros países estão "longe desse nível de competitividade", sublinhou Barroso. A decisão dos comissários, prosseguiu, "não deve ser entendida como um desacordo da Europa relativamente à competitividade" da economia alemã. "Pelo contrário (...) gostaríamos de ter mais Alemanhas (...) na Europa", afirmou.

Segundo o presidente da Comissão, o problema "nunca será a competitividade da Alemanha mas se a Alemanha, enquanto motor económico da UE, pode fazer mais" em favor da retoma na Europa. Isto, através de um aumento da procura interna – investimento e consumo – e da abertura do sector dos serviços à concorrência, considera a Comissão.

Em contraponto com a decisão relativa à Alemanha, Bruxelas confirmou o lançamento de uma nova análise aprofundada da economia francesa para determinar se os desequilíbrios macroeconómicos detectados há seis meses se mantêm. Neste caso, as razões são as opostas das que foram apontadas a Berlim: deterioração persistente do défice externo, perda de competitividade e elevado endividamento público.

A análise relativa à Espanha incidirá, por seu lado, nos elevados défices externo e público, e na explosão do desemprego. Em Itália, os desequilíbrios que estão sob vigilância referem-se à elevada dívida pública e à perda contínua de competitividade.

Finalmente, no caso da Holanda, Bruxelas visa o excedente externo, mas igualmente a elevada dívida pública e privada, sobretudo no sector da habitação.

Sexta-feira, Bruxelas voltará à carga sobretudo contra Paris e Madrid, embora desta vez a propósito da respectiva situação orçamental, para averiguar se estes países, que obtiveram em Maio dois anos suplementares para reduzir o défice orçamental para menos de 3% do PIB, estão a cumprir a trajectória de consolidação nas suas propostas de Orçamento do Estado para 2014.
 
 

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