UNESCO premeia o “coração árabe” do poeta e ensaísta português Adalberto Alves

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Adalberto Alves vai receber cerca de 22 mil euros, o valor do Prémio Sharjah para a Cultura Árabe

Adalberto Alves consegue precisar o momento em que se apaixonou pela cultura árabe. Foi aos cinco anos, quando viu o filme Ladrão de Bagdad, “não a versão muda” mas a que foi realizada em 1940 por Ludwig Berger, Michael Powell e Tim Whelan. Ontem, a UNESCO recompensou esse amor, mas também a sua “busca interior”, que o levou a escrever “uns 30 e tal livros”, como afirmou ao PÚBLICO, por telefone.

Autor de "O Meu Coração é Árabe", provavelmente uma das suas obras mais conhecidas — “os leitores sentiram-se tocados como se tivessem reencontrado um parente perdido” — o poeta, ensaísta e tradutor português vai receber cerca de 22 mil euros, o valor do Prémio Sharjah para a Cultura Árabe, criado pela UNESCO em 1998. A mesma quantia será atribuída ao académico egípcio Gabel Asfour, director da Fundação de Tradução Nacional no Cairo.

A Asfour foi reconhecido o seu “importante papel na divulgação da cultura árabe pelo mundo” – é professor em universidades dos EUA, Europa e Médio Oriente. No caso de Adalberto Alves, director do Centro de Estudos Luso-Árabe, em Silves, a UNESCO enalteceu-o por ter “inspirado muitos escritores portugueses e espanhóis [um deles o romancista Pedro Plasencia, autor de El Tiempo de los Cerezos] a divulgar a história da cultura árabe do Gharb al-Andalus”

Hoje, o advogado que de dia trabalhava no gabinete jurídico de um banco e de noite “dormia pouco” para ir além do “romantismo e exotismo” do filme Ladrão de Bagdad, está a preparar um dicionário de palavras portuguesas com origem árabe (toponímia, antroponímia, léxico corrente e empréstimos semânticos), a publicar em 2009. Já havia um, de José Pedro Machado, mas o de Adalberto Alves tem mais elementos, “ainda que não pretenda ser exaustivo, porque todos os dias a língua portuguesa recebe contribuições árabes, como Al-Qaeda/A Base).

Assim, se já sabíamos que “oxalá” derivava de Insh’Allah (Deus queira), ficamos a saber também que os árabes nos deram a “bochecha” (mashash), o jorro (jara), o açaime (al-zimân), a febra (habra) ou o tamarindo (tamr al-hindi, tâmara do Índico). Como chegou ele aqui? “Consultando muitos dicionários e fontes árabes”, língua que aprendeu na Universidade Nova, nos anos 1980.

Para fazer a necessária pesquisa e escrever este dicionário, o arabista bateu às portas de “várias embaixadas e instituições culturais”. Nenhuma se abriu, lamenta, e agora parte do prémio será usado para pagar despesas como a compra da imprescindível Enciclopédia do Islão, “com 12 volumes e cada um a 150 contos”.

O Prémio Sharjah deve o seu nome e fundos a um emirado do Golfo Pérsico. Curiosamente, Sharjah é um dos raros territórios árabes que Adalberto Alves, de 69 anos, ainda não visitou. A sua atenção vira-se agora para o sufismo, o misticismo islâmico. “Se perguntarem se sou muçulmano digo que sim, mas também digo que sou hindu, porque acredito na unidade de todas as religiões.”

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