Bruxelas espera mais 1700 milhões de euros de austeridade em 2015

Comissão Europeia diz que retoma da economia se deveu a factores extraordinários e questiona a sua durabilidade.

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Passos Coelho falou em Maio de cortes de 473 milhões de euros para 2015, muito abaixo do valor que a Comissão Europeia diz ser necessário Miguel Madeira

Nas previsões de Outono apresentadas esta terça-feira, Bruxelas confirma os valores do défice público para Portugal acordados durante a última avaliação da troika de credores internacionais ao programa português: 4% do PIB no próximo ano e 2,5% em 2015.

A Comissão esclarece, no entanto, que estes valores estão dependentes da estrita execução dos planos de consolidação orçamental acordados. Para 2014, as medidas de austeridade são, confirma Bruxelas, equivalentes a 2,3% do PIB, cerca de 3900 milhões de euros. E para 2015, diz o relatório, Portugal terá de concretizar um novo esforço de consolidação ligeiramente superior a 1% do PIB, ou seja, cerca de 1700 milhões de euros. "A previsão [do défice] para 2015 é suportada por medidas equivalentes a um valor ligeiramente acima de 1% do PIB, maioritariamente do lado da despesa", afirma a Comissão.

A última vez que o Governo português avançou com a dimensão dos cortes a realizar em 2015 foi, em Maio deste ano, no momento em que o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, enviou uma carta aos responsáveis máximos da troika com o plano de redução da despesa pública. Nessa altura, porém, a redução de despesa prevista para 2015 era de apenas 473 milhões de euros e centrada em cortes adicionais nos consumos intermédios. No OE para 2014, apenas é feita referência aos cortes a realizar durante o próximo ano.
 

Questionado pelo PÚBLICO, o Ministério das Finanças garante que não negociou valores alguns com a troika e que os valores ontem avançados resultam de cálculos realizados pela Comissão.


No relatório agora publicado, a Comissão diz que, a nível orçamental, os principais riscos que pesam sobre o cumprimento das metas do défice já não resultam tanto da situação macroeconómica (como aconteceu nos anos passados), mas sobretudo de considerações "legais" resultantes da avaliação das medidas em causa pelo Tribunal Constitucional.

Para este ano, a Comissão assume que o défice será de 5,9%, embora aceite que, retirado o efeito da injecção de capital no Banif, o objectivo de 5,5% será atingido.

Bruxelas assinala, contudo, que este valor foi atingido depois de "uma lacuna de 0,5% do PIB ter sido identificada após a utilização das reservas orçamentais". Essa lacuna apenas será preenchida devido a poupanças adicionais e, principalmente, à receita extraordinária obtida com o perdão fiscal que o Governo colocou em prática no final do ano.

De acordo com as previsões, a dívida pública atingirá este ano um pico de 127,8% do PIB (contra 124,1% no ano passado), antes de começar a descer para 126,7% em 2014 e 125,7% em 2015.

Recuperação pode não durar
A Comissão Europeia confirma igualmente a estimativa de ligeira melhoria da situação económica e do desemprego em Portugal nas suas previsões económicas semestrais, embora acompanhadas do aviso de que esta evolução mais favorável assenta em factores extraordinários.

Segundo Bruxelas, a contracção do PIB será este ano de 1,8%, um valor meio ponto percentual melhor do que o crescimento negativo de 2,3% avançado nas anteriores previsões da Primavera, em Maio.

Em 2014, a Comissão confirma o regresso da economia a terreno positivo com uma previsão de crescimento de 0,8%, mais duas décimas do que os 0,6% avançados há seis meses. Em 2015, a recuperação da economia deverá prosseguir com um crescimento de 1,5%.

Esta ligeira melhoria do panorama resulta do inesperado forte crescimento do PIB no segundo trimestre deste ano (1,1% face aos três meses anteriores), e que foi sobretudo impulsionado pelo consumo interno. Esta situação, que Bruxelas considera surpreendente, resultou de factores "extraordinários" (presumivelmente a devolução dos subsídios de Natal e de férias da função pública).

A revisão em alta das previsões para 2013 e 2014 resulta assim essencialmente do "impacto mecânico" da evolução inesperadamente melhor do segundo trimestre, sublinha a Comissão.

Esta melhoria da actividade deverá permitir uma contracção menos acentuada do emprego, embora esta situação seja provocada sobretudo pelo turismo e agricultura, o que, para Bruxelas, suscita "questões sobre a sua sustentabilidade".

Em consequência da evolução da economia e do emprego — mas não só —, a taxa de desemprego esperada este ano, de 17,4% da população activa, será igualmente melhor do que os 18,2% previstos em Maio. No próximo ano, esta taxa subirá para 17,7% — contra 18,5% previstos há seis meses —, antes de começar, previsivelmente, a baixar para 17,3% em 2015. Bruxelas sublinha, no entanto, que esta melhoria da taxa de desemprego também se deve a uma redução da população activa.
 
 
 
 
 

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