Volkswagen enfrenta crise com novo CEO e reestruturação profunda

Governo revelou que a empresa também falseou resultados de testes na Alemanha.

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Müller começou como aprendiz da Audi, em 1977 Alex Domanski/REuters

Para lidar com a maior crise da sua história, o Grupo Volkswagen nomeou um novo presidente executivo e mudou significativamente a estrutura internacional da empresa.

Sem surpresa, Matthias Müller, até aqui CEO da Porsche, uma das marcas do grupo alemão, foi o escolhido para liderar a multinacional. Vai suceder a Martin Winterkorn, que se demitiu na sequência do escândalo das emissões de gases poluentes.

Müller, de 58 anos, fez toda a carreira dentro o grupo: entrou para a Audi em 1977, como aprendiz de maquinaria. Saiu para tirar uma licenciatura em engenharia informática, tendo regressado logo depois à empresa. Lidera a Porsche desde 2010. As promoções para alguns dos lugares mais importantes que desempenhou antes de liderar a marca de luxo foram feitas por Winterkorn. O executivo é também descrito como tendo boas ligações às famílias Porsche e Piech, que têm a maioria dos votos que controlam o Grupo Volkswagen.

"A minha tarefa mais urgente é reconquistar a confiança no Grupo Volkswagen", afirmou Müller, num comunicado. "Sob a minha liderança, a Volkswagen fará tudo para desenvolver e implementar os mais rigorosos padrões de conformidade e governança do nosso sector".

A empresa anunciou também reestruturações de fôlego. As estruturas da empresa no México, Canadá e EUA – que representaram, no primeiro semestre deste ano, 9% das vendas de automóveis de passageiros – vão ser combinadas, ficando sob a alçada do actual presidente da Skoda, Winfried Vahland, que deixará o cargo. Michael Horn, o CEO da Volkswagen Group of America, que admitiu que a companhia fez “asneira”, vai manter-se no cargo, embora passe assim a ter um novo executivo acima de si.

 Como parte das mudanças, Jürgen Stackmann, o presidente da Seat, a subsidiária espanhola do grupo, foi chamado para funções na sede e será substituído por Luca de Meo, um executivo actualmente na Audi.

O conselho de supervisão decidiu também atribuir mais responsabilidades às marcas e grupos regionais, com o objectivo de simplificar a estrutura. A marca Volkswagen passará a estar organizada em quatro regiões, cada uma com um CEO local.

Ainda antes de serem conhecidas as mudanças, as acções da empresa fecharam a cair 4,3%, terminando assim em terreno negativo uma semana na qual a empresa perdeu quase um terço da capitalização em bolsa.

Matthias Müller tem a tarefa de conduzir a empresa por um processo que fez rebentar uma polémica sobre os procedimento usados na União Europeia para testar as emissões dos automóveis e que já salpicou de suspeitas todo o sector automóvel na Europa.

Cada dia tem trazido uma nova revelação. Nesta sexta-feira, o Governo alemão revelou que a Volkswagen falseou os resultados de testes de 2,8 milhões de veículos na Alemanha, um número muito superior ao que foi descoberto nos EUA.

A informação foi dada no Parlamento alemão, pelo ministro dos Transportes, Alexander Dobrindt, que já na quinta-feira tinha avançado que os motores a diesel com cilindradas de 1.6 e 2.0 comercializados na Europa também estavam equipados com o sistema para reduzir as emissões durante os testes, permitindo que os carros infrinjam os limites legais quando em condução normal.

A empresa, por seu lado, revelou que o sistema que falseia os resultados está instalado em cerca de cinco milhões de automóveis da marca Volkswagen (já tinha indicado serem 11 milhões em todas as marcas). O Golf de sexta geração, o Passat de sétima geração e o Tiguan de primeira geração usam exclusivamente o motor fraudulento. Segundo o fabricante, os veículos a diesel mais recentes, feitos para estarem em conformidade com as novas normas europeia, não são afectados.

A Volkswagen acrescentou ainda que divulgará informação sobre o número de veículos afectados nos diferentes mercados. Em Portugal, a marca alemã, representada pela Siva, foi a segunda que mais vendeu ligeiros de passageiros ao longo dos primeiros oito meses deste ano (atrás da Renault). Tem uma quota em torno dos 10%. A Audi tem 5% do mercado português, a Seat tem 5% e a Skoda, 2%. Ao todo, o grupo vendeu um pouco mais de 26 mil automóveis.

A sucessão de episódios está a danificar a reputação da Volkswagen e, por arrasto, da Alemanha como fabricante de automóveis. A última capa da influente revista alemã Der Spiegel mostra um Volkswagen Carocha, a ser transportado por seis homens de preto, como se fosse um caixão. No tejadilho está uma coroa de flores com as cores da bandeira alemã. O título é sucinto: “O suicídio”.

Dos EUA, veio também outro golpe para o grupo. A Agência de Protecção Ambiental – que divulgou na semana passada que cerca de 482 mil veículos estavam equipados para falsear os testes – não deu autorização para que a empresa coloque no mercado novo veículos com motorização a diesel. Os EUA representaram 6% de todos os carros de passageiros vendidos pelo grupo.

A fraude da Volkswagen tem também trazido a público questões regulatórias que estavam afastadas dos holofotes mediáticos. Nesta sexta-feira, o jornal Financial Times noticiou a existência de um documento de um centro de estudos da Comissão Europeia que aponta precisamente para a existência do tipo de sistemas capazes de enganar os testes de emissões que estão na base do escândalo. O documento é de 2013 e está publicado no site da Comissão.

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