“Qualifica”(r) os portugueses

Penso que “Qualifica” deverá distanciar-se das “Novas Oportunidades”, sobretudo tendo em conta aquilo que falhou.

“Nestes últimos anos, a escolarização dos adultos apresenta um panorama de irregularidades com altos e baixos. Descurada, desprezada e negligenciada pelos nossos políticos, os quais focalizados nas questões iminentes da escolarização obrigatória descuram as oportunidades que se impõem para aqueles que deixaram de prosseguir estudos por circunstâncias da vida, ou por não terem agarrado a oportunidade surgida no seu tempo. Contudo, muitos adultos com baixa escolaridade almejam voltar aos bancos da escola para aprender a ler e a escrever com vista a adquirir mais conhecimentos e competências, úteis à vida.”

Apresento excerto de artigo que escrevi artigo no passado mês de março, nestas mesmas páginas, intitulado “Educação de Adultos – agora ou nunca!”, criticando a “inaceitável letargia com que olham a Educação de Adultos, mau grado o trabalho meritório exercido nesta área”, apresentando números (que nos envergonham!) que evidenciam uma baixa taxa de escolarização e fazendo fé para que “o ministério da Educação” não despreze “este problema, implementando rapidamente medidas que ajudem a ultrapassá-lo.”

Semanas depois, em Coimbra, os ministérios da Educação (ME) e do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS), através dos respetivos líderes, apresentaram o sucedâneo das Novas Oportunidades (a maioria da população lembra-se e sabe o que foi, pelos bons e maus motivos) e dos Centros para a Qualificação e o Ensino Profissional - CQEP (poucos conhecem), prometendo elevar as qualificações dos portugueses, aumentar-lhes a escolaridade e, por via disso, tornar o nosso país mais competitivo.

Apesar de ainda estar em fase embrionária (embora já conte com 2 apresentações públicas!), esta medida saúda-se!

Por um lado, a Educação de Adultos quase parou nestes últimos anos (os CQEP mal funcionaram), podendo mesmo dizer que foi ignorada e não esteve seriamente na agenda política (raramente a oposição se manifestou contra esta inércia…).

Por outro lado, o quadro comunitário 2020 privilegia o “investimento no capital humano” e deve ser usado e concretizado, por forma a existir a esperada rentabilização.

Um fator fundamental para congratular-me com esta iniciativa diz respeito ao facto da escolarização dos portugueses ainda estar muito aquém do desejado, sendo, por isso, necessário investir neste particular.

Contudo, penso que “Qualifica” deverá distanciar-se das “Novas Oportunidades” (propostas do Partido Socialista, embora em diferentes governos), sobretudo tendo em conta aquilo que falhou (os nossos políticos sabem certamente aprender com os erros cometidos…é um gesto nobre de humildade apreciável); este programa foi severamente criticado face ao (aparente?) facilitismo atribuído na obtenção dos diplomas, ao ponto de se brincar (quantas vezes injustamente), em termos de anedota, com os “doutores das Novas Oportunidades”.

A meu ver, impõe-se implementar novos pilares estratégicos de atuação que passem por quatro níveis, a saber: uma desburocratização processual, uma plataforma de entendimento, rigor e exigência.

Urge a desburocratização dos procedimentos administrativos, que se pretendem céleres e de simples apreensão pelo comum dos mortais. Quantas vezes ideias bem intencionadas não singram, em virtude da complexidade dos normativos que as suportam, criando mais obstáculos do que soluções.

No passado assistiu-se a uma “desarticulação tripartida” (ME, MTSSS e entidades promotoras), prejudicando o trabalho de quem diariamente estava no terreno. Os ministérios intervenientes devem criar uma plataforma de entendimento de modo a funcionar em consonância, não puxando cada um para seu lado. E bem sabemos que, por vezes, estas iniciativas interministeriais dão mau resultado por existir “um capoeiro para dois (ou mais) galos”. É necessário entendimento institucional e planeamento estratégico.

A noção de rigor deve firmar as ações públicas a desenvolver, nomeadamente quando estas se destinam a “reforçar e validar competências” de jovens e adultos. Este plano perderá muito, se der uma imagem de laxismo, descredibilizando a pertinência dos seus méritos.

Aumentar os níveis de exigência é imprescindível para o reforço positivo da imagem que nem sempre foi conseguida anteriormente. A filosofia deste programa não é igual à do ensino regular, mas também não será lícito descurar o pedido imperioso que ele impregna, substrato essencial ao sucesso pretendido.

Concluo, relembrando que “As escolas públicas e as instituições (educativas) financiadas pelo Estado têm a responsabilidade de contribuir para dar resposta a estas pessoas mais velhas, doutores da vida, mas que não sabem ler nem escrever, ou possuem escolarização baixa (os seus percursos escolares foram curtos ou intermitentes) e pretendem elevá-la.”

Professor/director

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