“Ronda significativa de pagamentos” do Garantir Cultura feita esta semana

O anúncio foi feito esta quarta-feira pelo ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, no mesmo dia em que beneficiários do programa denunciam atrasos que chegam a ser de cinco meses.

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O ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, reconhece atrasos, mas deixa a promessa de que serão feitos pagamentos significativos até à próxima semana Matilde Fieschi
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Uma "ronda significativa de pagamentos" da segunda tranche do subprograma do Garantir Cultura destinado às entidades artísticas será feita "no final desta semana, início da próxima", anunciou esta quarta-feira o ministro da Cultura.

"Se não for possível neste final de semana, no início da próxima será feita mais uma ronda significativa de pagamentos", afirmou Pedro Adão e Silva na comissão parlamentar de Cultura, durante uma audição regimental, quando questionado pela deputada do PCP Paula Santos sobre o programa Garantir Cultura.

No subprograma do Garantir Cultura destinado a entidades artísticas, gerido pelo Gabinete de Estratégia, Planeamento e Avaliação Culturais (GEPAC), sob alçada do Ministério da Cultura, o pagamento dos apoios é feito em duas tranches, devendo a segunda ser paga nos 30 dias úteis após validação do relatório final do projecto apoiado.

Com uma dotação total de cerca de 53 milhões de euros, o Garantir Cultura é um programa de apoio à criação e à programação artísticas, criado no início de 2021 pelo Governo em contexto de pandemia. Desde o início, estruturas e artistas têm denunciado atrasos nos pagamentos da segunda tranche. Esses atrasos mantêm-se.

Esta quarta-feira, no Parlamento, o ministro da Cultura admitiu os atrasos, mas salientou que a tutela foi "bastante flexível e aberta para serem entregues relatórios fora do prazo, para haver mais tempo".

"Tem sido feito um esforço tremendo da parte do GEPAC para tentar que tudo o que é despesa possa ser elegível. O GEPAC tem feito aqui um trabalho de enorme empenho para, em conjunto com as entidades, poder financiar o máximo daquilo que as entidades conseguem ter como despesa elegível. E já estamos a falar de muito poucas entidades", afirmou.

Embora sejam poucas, Pedro Adão e Silva assume que para essas entidades "o valor é significativo, porque foram essas que não receberam". "Mas o nosso empenho, e estou a falar em particular o GEPAC, tem sido total e de grande diálogo [para que as despesas possam ser elegíveis]. Uma grande parte dos atrasos tem que ver com isso", disse.

O subprograma gerido pelo GEPAC tem uma dotação anunciada de 23 milhões de euros, e entretanto corrigida para 21,8 milhões de euros, tendo sido apoiados 1095 projectos.

De acordo com o ministro, da dotação total, "já foram pagos 20,1 milhões de euros, sendo que houve oito entidades que desistiram e 33 que nunca apresentaram o relatório final".

Fonte oficial do Ministério da Cultura, em resposta a questões da Lusa, referiu que "existindo projectos ainda a decorrer, cujo prazo de execução termina no final do ano de 2023, só nessa altura todos os projectos estarão em condições de receber a última tranche".

Segundo a tutela, dos 1095 projectos apoiados, 944 já receberam as duas trances de pagamento. Dos 151 que ainda não receberam as duas tranches, 110 já entregaram o relatório final.

O programa Garantir Cultura tem um outro subprograma, para empresas, gerido pelo COMPETE 2020, sob alçada do Ministério da Economia, através do Turismo de Portugal, com uma dotação anunciada de 30 milhões de euros, que afinal se traduziu em 29,5 milhões de euros.

No âmbito deste subprograma foram aprovados 622 projectos, dos quais "565 apresentaram já o pedido de pagamento final", tendo sido já pagos "globalmente 25,6 milhões de euros", segundo o ministério da Economia, em resposta a questões da Lusa.

No subprograma para o tecido empresarial os pagamentos seriam feitos em três tranches: a primeira de 50%, a segunda de 35% e a terceira de 15% do valor do apoio concedido, de acordo com o regulamento publicado em Diário da República (DR) em Março de 2021. Mas, em Março deste ano, foi publicada em DR uma portaria que alterou o peso de cada tranche, que passou a ser de 50%, 45% e 5%.

O ministro da Cultura salientou hoje que "isso significou que entidades que já tinham recebido os 35% receberam mais 10%". "Cerca de três milhões de euros foram pagos assim, e isso permitiu responder a uma parte do problema do Garantir Cultura para o tecido empresarial", disse.

Dos 565 projectos deste subprograma que já apresentaram o pedido de pagamento final, "a análise técnica encontra-se concluída em relação a 477, estando em curso os procedimentos associados ao pagamento dos valores que ainda são devidos em resultado dessa análise", refere o ministério da Economia na resposta enviada às questões da Lusa.

Quanto aos restantes projectos, a tutela afirma que está "em falta a apresentação de evidência documental da realização de onze projectos".

O Turismo de Portugal está ainda "a concluir a análise" 77 projectos que sobram, "cujos elementos para encerramento foram recebidos mais recentemente e em relação aos quais espera concluir a respectiva análise até ao final do corrente mês".

A tutela salienta que "também em relação a estes processos em curso, apenas se encontram por liquidar os 5% finais".

Apoios continuam a registar atrasos

O pagamento da segunda tranche dos apoios do subprograma do Garantir Cultura destinado a entidades artísticas continua a registar atrasos, que chegam a ser de cinco meses, de acordo com beneficiários ouvidos pela agência Lusa.

O bailarino e coreógrafo Romulus Neagu submeteu em Janeiro deste ano o relatório, do qual recebeu o "ok" do GEPAC em final de Fevereiro, depois de resolvida uma "situação irregular", mas até hoje ainda não recebeu os cerca de 20 mil euros relativos à segunda tranche, contou à Lusa.

No GEPAC não conseguiram dizer-lhe quando o dinheiro seria depositado: "Sugeriram que fosse verificando a conta bancária, não souberam dizer uma data".

"Já passaram cinco meses desde a confirmação de que estava tudo ok e não há resposta coerente e conclusiva. É muito angustiante. Este atraso causa desânimo", disse.

No projecto aprovado para receber o apoio do Garantir Cultura esteve envolvida uma equipa de 14 pessoas, "uma parte em situação desconfortável". "Há colaboradores em situação complicada, porque já passaram os recibos, que entraram para IRS, mas não receberam o dinheiro", contou Romulus Neagu.

Para este artista, "é quase um trabalho perdido". O programa surgiu numa "altura crítica", quando o mundo enfrentava a pandemia da covid-19, e era "direccionado para os artistas", então "tinha tudo para dar certo", por isso resolveu candidatar-se.

Além disso, parecia "o instrumento ideal para projectar mais e de forma mais corajosa" o trabalho da associação Cultural Intruso, que fundou há 14 anos em Viseu, mas à qual não consegue ainda dedicar-se a 100% porque ainda é "bailarino e coreógrafo activo".

Também no caso do projecto de Rute Rocha, realizado no Verão do ano passado, o prazo de pagamento já ultrapassou os 30 dias úteis definidos.

"O relatório foi submetido no final de Abril e o GEPAC disse que está tudo ok, mas falta o pagamento", contou à Lusa.

No caso de Rute Rocha, o valor da segunda tranche é de cerca de quatro mil euros, que servirão para pagar a quem trabalhou com ela no projecto.

Já a associação cultural A Caravana Passa submeteu em Maio/Junho do ano passado o relatório final do projecto concluído no final de 2021. Depois disso, segundo o director daquela associação, Fernando Mota, foi "um ano de troca de correspondência com a GEPAC, porque não aceitou facturas de colaboradores da Argentina".

Fernando Mota atribuiu parte do atraso à comunicação "lenta e ineficaz" com o GEPAC: "Nunca atendiam o telefone e os emails demoravam várias semanas a serem respondidos".

"Tivemos feedback que o processo ficou finalizado há cerca de um mês e meio", relatou.

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