Resultados finais da DGArtes confirmam concentração de excluídos nos apoios bienais. Uma “injustiça” que a Plateia quer ver corrigida

Reforço de verbas beneficiou apenas a modalidade quadrienal, o que explica o grande número de exclusões nos apoios bienais. A Plateia acusa o ministro da Cultura de ter quebrado o diálogo.

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O Espaço do Tempo, em Montemor-o-novo, Alentejo é uma das entidades apoiadas na modalidade quadrienal Rui Gaudencio

A larga maioria das entidades não apoiadas no programa de apoio sustentado às artes na área da Programação ficou excluída por se ter esgotado o montante disponível, de acordo com os resultados finais divulgados esta sexta-feira para a área de Programação (Artes Performativas, Cruzamento Disciplinar e Artes de Rua) nas modalidades quadrienal e bienal. Confirmam-se assim os resultados provisórios, revelados a 4 de Novembro, que o sector tinha criticado pela discrepância das verbas alocadas aos apoios quadrienais e bienais, beneficiando os primeiros em detrimento dos segundos, dos quais ficaram excluídas 41 candidaturas, 34 das quais por se ter esgotado o financiamento disponível.

No concurso para apoios quadrienais e bienais foram admitidas 90 candidaturas, no total das duas modalidades, mas das 43 que vão receber apoio, 30 candidataram-se aos apoios quadrienais, e apenas 13 aos bienais. Na modalidade quadrienal (com uma dotação de 27,7 milhões de euros), foram admitidas 36 candidaturas, das quais 30 recebem apoio, para projectos nas áreas da música, cruzamento disciplinar, teatro, dança e circo. As restantes seis foram excluídas "em virtude de ter sido esgotado o montante global disponível para a modalidade de apoio em causa", lê-se na decisão final.

Ou seja, 83% das candidaturas a quadrienais vão ser apoiadas, uma percentagem que desce para 24% quando passamos às bienais. Nesta modalidade (com uma dotação de 4,9 milhões de euros), das 54 candidaturas admitidas foi proposto apoio a 13. E das 41 não apoiadas, 34 tinham sido consideradas elegíveis para apoio pelo júri, e só não o receberam por falta de verba.

As entidades apoiadas na modalidade bienal incluem a Boca, de Lisboa, a Lavrar o Mar, do Algarve, a Jazz ao Centro Clube, de Coimbra, o Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica (FITEI), do Porto, a Associação Sons da Lusofonia, de Lisboa, e a Associação Porta-Jazz, do Porto. Entre as muitas excluídas, encontram-se projectos como o festival Jardins Efémeros, de Viseu, o Varazim Teatro, da Póvoa de Varzim, a Música Portuguesa a Gostar Dela Própria, da Lousã, a Associação Cultural Gerador, de Lisboa, o festival Terras sem Sombra, do Alentejo, e a Fundação Casa de Mateus, de Vila Real.

Já na modalidade quadrienal, entre as entidades apoiadas estão O Espaço do Tempo, de Montemor-o-Novo, Alkantara, de Lisboa, a Ou.Tra, do Barreiro, o Festival Internacional de Música da Póvoa de Varzim, o Teatro Viriato, de Viseu, a PédeXumbo, de Évora, e a Zé dos Bois, de Lisboa. Na lista de excluídos, por ter sido esgotado o montante disponível, ficaram, entre outros, o Festival de Jazz de Valado dos Frades/Nazaré, o Orfeão de Leiria e a Associação Orquestra e Banda Sinfónica de Jovens de Santa Maria da Feira.

Quando abriram as candidaturas, em Maio, os seis concursos do Programa de Apoio Sustentado tinham alocado um montante global de 81,3 milhões de euros. Em Setembro, o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, anunciou que esse valor aumentaria para 148 milhões de euros. No entanto, esse reforço abrangeu apenas a modalidade quadrienal dos concursos.

Os resultados finais de quatro dos concursos Dança, Música e Ópera, Artes Visuais, e agora Programação já foram divulgados, e confirmam os provisórios, embora várias candidaturas tenham reclamado, em período de audiência de interessados.

Os resultados continuaram a ser contestados por várias associações representativas do sector da Cultura, tendo dado origem a vários apelos ao ministro da Cultura e a abaixo-assinados. A Plateia Associação de Profissionais das Artes Cénicas manifestou esta sexta-feira, em comunicado, a "mais profunda decepção pela total quebra de diálogo do ministro da Cultura" com o sector, acusando-o de "ignorar todas as vozes que justamente apelam à correcção da injustiça no reforço" de verbas dos apoios sustentados para o quadriénio 2023-2026, "confundindo, deliberadamente, a opinião pública".

O comunicado foi divulgado poucas horas depois de a DGArtes ter divulgado este resultados finais do Programa de Apoio Sustentado às artes, na área da Programação, que mostram que a larga maioria das entidades não apoiadas ficou excluída por se ter esgotado o montante disponível, apesar de terem tido uma classificação que as tornava legíveis. São resultados muito similares aos dos concursos para as áreas da Dança, Música e Ópera e Artes Visuais, já conhecidos.

Reforço de verbas criou injustiça

A Plateia lembra que, no último mês e meio, desde que começaram a ser divulgados os resultados provisórios dos concursos, a associação e outras estruturas representativas do sector "têm reivindicado um novo reforço de verbas para a correcção da arbitrariedade na opção do Governo de apenas ter reforçado a modalidade quadrienal, em detrimento da modalidade bienal".

"O reforço anunciado em Setembro foi muito importante, mas sendo totalmente assimétrico, criou uma injustiça", sublinha a Plateia, acrescentando que "todos os resultados provisórios mostraram uma grande diferença entre modalidades nas percentagens de candidaturas apoiadas em função das elegíveis", confirmando, assim, que "esta decisão foi um erro, defraudando as expectativas das estruturas que fundamentaram as suas escolhas quanto à modalidade a que concorreram e colocando em causa a equidade e a legitimidade do concurso público".

Conhecidos os números, ficou patente que cerca de metade das estruturas elegíveis para apoio, na modalidade bienal, perdeu-o por falta de recursos financeiros, ao passo que a quase totalidade das candidaturas elegíveis na quadrienal obteve apoio.

No caso da modalidade bienal, a Plateia sublinha que "a verba é da tal forma limitada que não permite o cumprimento do próprio aviso de abertura, que indicava um mínimo de cinco estruturas a serem financiadas na região norte".

"Por falta de verba, só foram financiadas três estruturas, ficando de fora outras com pontuação excelente", observa a associação, considerando tratar-se de um exemplo "escabroso" que "prova como, desde o início, é fundamental o reforço das modalidades bienais, e sublinha a opção errada do Governo".

Apesar de nas últimas semanas se terem "multiplicado" os "comunicados, entrevistas, abaixo-assinados e outras formas de protesto e apelo dirigidas directamente ao Ministério da Cultura, demonstrando que a correcção deste erro é necessária, justa e viável", o ministro "tem ignorado este movimento", observa a Plateia.

Pedro Adão e Silva, acusa a associação, "nunca respondeu às entidades representativas, nomeadamente a nenhum dos mails enviados directamente para o seu gabinete nos últimos meses", e recusa-se "a assumir a injustiça criada por si com o reforço desproporcional anunciado em Setembro".

Desde a sua intervenção no Teatro Nacional D. Maria II, no passado dia 30 de Novembro, quando ainda só eram conhecidos os resultados provisórios, o ministro tem destacado os números globais de entidades apoiadas nos concursos do Programa de Apoio Sustentado para os anos de 2023-2026, sublinhando o aumento para 211, por oposição às 186 do ciclo anterior, mas sem distinguir as diferentes modalidades bienal e quadrienal.

A associação considera que, embora o ministro refira à comunicação social que "não cabe ao Governo tomar opções discricionárias com base em descontentamentos", "o que acontece de facto é um justo descontentamento perante, precisamente, a sua decisão discricionária".

Uma "ausência de resposta e de disponibilidade para o escrutínio" que, segundo a estrutura, se "estende não apenas ao sector que tutela, mas também aos deputados da Assembleia da República", já que, tendo sido convocado pela comissão parlamentar de Cultura para falar sobre este tema, Pedro Adão e Silva "apenas o irá fazer a 11 de Janeiro de 2023, numa audição regimental, alegando constrangimento de agenda".

"É de lamentar que o ministro não encontre tempo para prestar esclarecimentos, quando, pela primeira vez desde que tomou posse, se confronta com manifestações e apelos do sector, optando por apenas deixar comentários junto da comunicação social, ou escolhendo intervenções públicas sem direito a contraditório, perguntas ou confronto com os factos", conclui a Associação de Profissionais das Artes Cénicas.

A Plateia e o Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculos, do Audiovisual e dos Músicos (Cena-STE) foram ouvidos na comissão parlamentar de Cultura, sobre estes concursos, na passada terça-feira.

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