Abertura de bares e discotecas? É preciso controlar regras, dizem especialistas

Médico Ricardo Mexia diz: “Se conseguirmos minimizar os riscos é melhor do que as pessoas estarem a organizar outro tipo de eventos em que há menos controle.” Psicóloga acha, pelo contrário, que “não vai ser uma resposta à necessidade que os jovens têm de se divertir e conviver durante este período de férias”.

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Paulo Pimenta

Os médicos de saúde pública Ricardo Mexia e Mário Freitas, e a psicóloga especialista em jovens, Tânia Gaspar não se opõem a abrir discotecas e bares (até às 20h na Área Metropolitana de Lisboa e até à 1h no resto do país) desde que sejam cumpridas as regras da Direcção-Geral de Saúde para evitar a propagação da covid-19.

A medida foi aprovada no Conselho de Ministros desta quinta-feira: bares e discotecas poderão abrir desde que funcionem de acordo com as regras aplicadas aos cafés, pastelarias e casas de chá, com serviços condicionados e com a proibição de que estes locais possam ser usufruídos pelos clientes enquanto espaços de dança e de convívio próximo. 

Em conferência de imprensa, a ministra Mariana Vieira da Silva esclareceu a notícia avançada pelo PÚBLICO: o horário de funcionamento dos bares e discotecas que queiram funcionar como cafés irá até às 20h apenas na Área Metropolitana de Lisboa que, por continuar em situação de contingência, continuará com horários mais restritos até nova reavaliação.

Assim, os restantes bares e discotecas no resto do país podem receber clientes até à meia-noite e ficar abertos até à 1h, à semelhança dos restaurantes. 

A ministra reforço, no entanto, que o funcionamento destes bares e discotecas na sua actividade “normal”, com pista de dança onde “é difícil manter a distância”, representa um elevado risco e por isso “não existem condições para proceder à reabertura”.

Lembrando que se trata de “uma decisão complicada”, Ricardo Mexia, médico do Departamento de Epidemiologia (DEP) do Instituto Ricardo Jorge e presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública (ANMSP), comenta: “Sabemos que tendencialmente, em contexto de bares, até pelo hábito de quem frequenta o espaço, não será tão fácil como num café, que as pessoas fiquem na sua mesa, não interajam, não existam maiores aglomerações.”

O médico recorda que os locais nocturnos foram identificados como “espaços privilegiados” de propagação da covid-19 no Japão ou em Espanha, porque “tipicamente” as pessoas que os frequentam “tendem a não cumprir os comportamentos de distanciamento social”. Mas afirma: “Se conseguirmos minimizar os riscos é melhor do que as pessoas estarem a organizar outro tipo de eventos em que há menos controle.”

Defende que se faça uma campanha de comunicação para “evitar que se tornem espaços de contaminação”, acrescenta. 

Para este especialista, a questão do horário - que tem sido criticada pelo sector - faz diferença. Porque prolongá-lo “aumenta o tempo de exposição em que as pessoas estão neste contexto e propicia outro tipo de comportamentos”, refere. “Às 23h não há mais riscos do que às 17h, a questão são os comportamentos que se podem adoptar”. Por isso diz: “o ovo de colombo” é “encontrar o equilíbrio entre a manutenção de regras que diminuem o risco de contágio e as actividades habituais destes espaços”. 

Não responde a necessidade de jovens

Já a psicóloga Tânia Gaspar, mestre em Saúde Pública, directora do Instituto de Psicologia e Ciências da Educação da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais e coordenadora do Grupo de Investigação Cidadania, inclusão e bem-estar social, considera que esta medida responde às necessidades dos empresários e profissionais dos bares e discotecas. Mas “não vai ser uma resposta à necessidade que os jovens têm de se divertir e conviver durante este período de férias”. Ou seja, “os jovens depois de confraternizarem nos bares e discotecas até às 20h vão continuar a diversão noutros locais, festas privadas ou festas espontâneas em espaço público”, continua.

Também acredita que se forem cumpridas as regras não irá “trazer maior risco que a abertura de restaurantes e cafés”. Mas certo é que “desvirtua a actividade dos bares e discotecas que normalmente está ligada a divertimento nocturno”.

Defende que “o mais importante e sustentável é a educação para a saúde, acções de saúde pública”. Acha importante sensibilizar os jovens e os frequentadores de bares e discotecas com uma linguagem que entendam. Fundamental é também “a assertividade” dos responsáveis desse espaços para o cumprimento das “medidas de saúde e segurança”, bem como a fiscalização efectiva “para avaliar se as medidas estão a ser implementadas”. 

O médico Mário Freitas, também delegado de saúde em Braga, comenta: “Já sabemos que o uso de máscara, a higiene e etiqueta respiratória e lavagem de mãos são fundamentais. Se cumprirmos, o risco consegue-se ir gerindo”. Chama a atenção para o uso de máscara em espaços fechados: não a usar “é um risco exponencial”. “Se estes estabelecimentos cumprirem as regras o risco é gerível e nesta nova normalidade podemos voltar a alguns aspectos da antiga. Resta saber se estamos a ser realistas: todos conhecemos estes espaços. Quem é que vai controlar o cumprimento das regras? O problema não são as leis, mas o cumprimento.”

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