Melhor notificação e mais testes ajudam a aumentar número de doentes recuperados

Portugal tem 917 recuperados, um acréscimo de 50% ao divulgado no dia anterior, quando ao número estava nos 610. Desde 1 de Março realizaram-se mais de 274 mil testes para diagnóstico da covid-19.

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Tiago Lopes

“Pela primeira vez, o número de recuperados é maior do que o número de óbitos”, destacou o secretário de Estado da Saúde António Lacerda Sales, na conferência de imprensa desta terça-feira. Segundo o último boletim da Direcção-Geral da Saúde (DGS), Portugal tem 917 recuperados, um acréscimo de 50% ao divulgado no dia anterior, quando ao número estava nos 610.

O que poderá explicar um aumento de 307 casos em 24 horas? “O aumento dos recuperados deve-se em parte ao reforço da notificação, através do levantamento junto das Administrações Regionais de Saúde”, diz a DGS, em resposta ao PÚBLICO, explicando que “está ainda a ser feita uma distribuição dos casos recuperados pelos dias de recuperação”. O “critério preconizado” para ser dado como curado é a realização de dois testes negativos.

Quanto ao futuro, “o que é de esperar é que haja um aumento do número de recuperados, pelo facto de o maior número de casos [positivos] ter sido no final de Março e no início de Abril”. “É natural, por outro lado, que haja uma melhoria do sistema de reporte”, acrescenta a DGS.

O médico de saúde pública Bernardo Gomes aponta o facto de o sistema de notificação “ter funcionado sob stress” neste último mês, desde as unidades clínicas aos laboratórios, e ter agora conseguido adaptar-se. O aliviar da pressão está a permitir “recuperar informação”.

“O sistema estava a dar prioridade aos positivos. Agora, tivemos milhares de casos negativos recuperados [na contabilização] e com o aumento da capacidade laboratorial haverá uma recuperação da contabilização dos casos recuperados”, considera, destacando que a informação que nos deixa com uma visão mais próxima da realidade é a data de início de sintomas. “O expectável é termos mais casos de doentes recuperados” se se mantiver a tendência que se está verificar.

Para Fernando Maltez, director do serviço de doenças infecciosas do Hospital Curry Cabral, este salto de casos recuperados pode resultar de uma “mistura de razões”. “Pode haver atrasos na notificação e pode haver também a coincidência do número acumulado de doentes, nomeadamente os que estão no domicílio que aguardavam resultados laboratoriais para determinar a cura virológica, ter sido elevado”, diz o especialista, que não lhe parece que seja de esperar que um acréscimo desta proporção se repita nos próximos dias.

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Mas será de esperar “com certeza” um contínuo aumento do número de recuperados. “A grande maioria dos doentes que aguardam pela cura são doentes que estão no domicílio, que não inspiram grande cuidado clínico e, portanto, a cura é uma questão de tempo”, refere. No caso destes doentes, pode significar entre duas a perto de três semanas desde o início e o fim dos sintomas. Para os doentes clinicamente mais complicados, a recuperação “pode ir até às seis, sete, oito semanas”.

Mais de 274 mil testes realizados

“Provavelmente a melhoria da resposta laboratorial facilitou a aplicação do critério de cura microbiológica”, admite o pneumologista Filipe Froes, referindo-se ao aumento da capacidade de realização de testes para diagnóstico da doença. “Deveriam existir muitas pessoas à espera para realizar teste, porque a percentagem de cura mantém-se estável”, acrescenta.

Desde 1 de Março, contabilizou o secretário de Estado da Saúde na conferência de imprensa, “foram realizados mais de 274 mil testes para diagnóstico, 70% dos quais já no mês de Abril”. A última sexta-feira “foi o dia, até à data, com mais testes desde o início do surto: cerca de 14.500 amostras processadas”, afirmou Lacerda Sales. Segundo o site Worldometer, que actualiza ao dia estes dados para todos os países, Portugal está a fazer mais de 26 mil testes por milhão de habitantes.

Outro factor justificativo, refere Filipe Froes, pode ser “a melhoria do seguimento de doentes através do Trace Covid”, sistema criado para registar e seguir os doentes desde a suspeita até à recuperação, e que “pode estar a enviar mais doentes para critérios de cura microbiológica”. O também coordenador do gabinete de crise da Ordem dos Médicos para a covid-19 salienta que estes 917 recuperados serão candidatos “ideais para a realização dos testes serológicos” para avaliar a imunidade ao vírus.

O pneumologista também diz que “será de esperar um aumento de recuperados” à medida que temos mais tempo decorrido desde os primeiros casos de infecção. Mas lembra que “mesmo depois de resolver a sua situação clínica, há doentes que se mantêm positivos, o que faz com que nem todos tenham critério para cura microbiológica”. Ou seja, é preciso dar tempo ao tempo.

O “desejável e o objectivo”, afirma Fernando Maltez, “é conseguir que não existam novas infecções e só termos doentes a recuperar”. “Esta semana e a próxima serão decisivas no que diz respeito ao estarmos a caminhar para uma situação de tranquilidade ou não. O número de novos casos de hoje [terça-feira] é animador.”

Bernardo Gomes salienta que “estes dias são muito difíceis do ponto de vista da comunicação de risco”. “É preciso comunicar que vamos abrir, sempre com a noção que vamos ter medidas do mesmo género que temos agora” e este é “um jogo de aprendizagem” que temos de manter.

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