Castração química: resposta à Sra. Dra. Suzana Garcia

Fui informado que a Sra. Dra. Suzana Garcia, no programa Você na TV, se referiu ao meu artigo de opinião sobre o projecto de lei apresentado pelo deputado André Ventura em que defende a castração química para alguns crimes. A temática é demasiado séria, não pode ser personalizada e muito menos objecto de populismo.

Acabo de ser informado por alguns amigos que a Sra. Dra. Suzana Garcia, no programa da TVI Você na TV se referiu ao meu artigo de opinião aqui publicado sobre o projecto de lei apresentado pelo deputado André Ventura, em que defende a castração química para alguns crimes que protegem a autodeterminação sexual de menores. Começo por lhe agradecer o interesse no que escrevi, nunca pensando que seria alvo de atenção de tão afamada rubrica. 

Não conhecia a colega (também sou advogado) nem o programa em que intervém. Fui ver o que disse. E sorrio, tanta é a mentira e o ódio que parece perpassar, sem que perceba porquê. O estilo, pelos vistos, é o da Sra. Dra., ao que me informam, e escuso-me a comentá-lo, por ser pessoa educada e por achar que, nestas coisas, quem viu e ouviu tirará as suas ilações. Diz ainda que insultei o deputado André Ventura. Insto-a a referir com precisão em que trecho, pois não encontrará qualquer insulto, tanto mais que aquele deputado partilhou no seu “Facebook” o meu texto, em total discordância, como é natural, sem qualquer referência a um suposto crime de injúria ou difamação. É importante conhecer a liberdade de expressão e os seus limites para saber que jamais os ultrapassei ou ultrapassarei em tudo o que venha a escrever. E para quem diz que eu “atiro coisas para o ar sem as provar”, também estamos conversados.

Ora, a Sra. Dra. começa por me identificar como “membro do Bloco de Esquerda”. Sabe mais que eu próprio, pois nunca fui militante de qualquer partido e nem sequer sou simpatizante do BE. Para quem me acusa de “desonestidade intelectual”, estamos conversados. Aliás, em lado algum apareci, nas minhas intervenções públicas, como membro do BE ou de qualquer outro partido político, pelo simples facto de não corresponder à minha vontade sê-lo.

Depois, o que para mim é o essencial, a flagrante inconstitucionalidade material do projecto de lei, por violar o art. 30.º da Lei Fundamental, a dignidade da pessoa e as finalidades das reacções criminais, também com assento na Constituição e na legislação infraconstitucional não mereceu uma única palavra por parte da comentadora. Para jurista, estamos também conversados.

Se bem tivesse lido o artigo que escrevi, não citei apenas um estudo, mas dois, e podia ter citado muitos mais que levantam dúvidas ou mesmo objecções cientificamente provadas à eficácia em termos de reincidência da castração química. E o artigo sul-coreano que referi, no seu desenvolvimento vai no mesmo sentido. Mais uma vez, um pouco mais de estudo não estaria mal. 

Disse que me “ia desmascarar” por ser “desonesto”. Não o pode fazer por não ter mentido e por nunca ter usado qualquer máscara nas minhas intervenções públicas. Simplesmente chamo a atenção para aquilo que pode não ser popular, mas é inconstitucional, cientificamente criticado e, apesar de a Sra. Dra. não gostar, um grande retrocesso civilizacional. Devia saber que estas questões político-criminais devem ser tratadas com frieza e objectividade, sob pena de voltarmos à barbárie. E porque não também a prisão perpétua ou a pena de morte? E porque não cortar os membros a todos quantos cometem crimes aquisitivos?

Ao que entendi, a Sra. Dra. propõe um referendo sobre o tema. Também quer referendar estas outras ideias? Disse na sua intervenção que medidas como esta “saem mais baratas”. O seu apego aos valores constitucionais fica bem claro nesta afirmação.

Por mais que uma vez pasmou-se com o facto de eu ser “Professor Doutor”. Estranho: nunca invoquei o meu título académico e a referência à minha profissão é tão normal como a Sra. Dra., em qualquer artigo de opinião e no referido programa se apresentar – e bem – como advogada. Faz-lhe alguma confusão que os académicos não se fechem em torres de marfim e contribuam para o debate democrático sobre matérias que ensinam? Porventura muita gente preferiria isso e para mim seria mais cómodo, mas encaro-o como um dever de cidadania, sempre sujeito à crítica. Aliás, leio as caixas de comentários e distingo bem as críticas construtivas, que agradeço, do insulto fácil, que nunca me afecta.

Diz que eu faço das pessoas “néscias e ignorantes”. Os estudos que citei e tantos outros no mesmo sentido aí estão para demonstrar o contrário. Se há algo de muito bom na sociedade hodierna é o acesso à informação e um simples clique ajuda muito qualquer cidadão a informar-se. A Sra. Dra. fala de mim como se me conhecesse e como se me aproveitasse de algum modo da minha profissão para impor quase “dogmas”. Muito lhe agradeço tão devotada atenção, que de todo mereço, mas sempre que intervenho – como a Sra. Dra., creio – é para manifestar uma opinião, que é apenas isso mesmo: uma visão particular sobre um fenómeno social. Felizmente que cada um pensa pela sua cabeça.

Convido amistosamente a Sra. Dra. a consultar o sítio da Assembleia da República e a verificar que o projecto de lei só não foi declarado desde logo inadmissível pelo seu Presidente, não obstante as dúvidas (eu diria, certezas) de inconstitucionalidade, em virtude de uma discutível praxe parlamentar que não permite, nesta fase, que o projecto não seja discutido. Mas verá o seu destino. E como a Sra. Dra. é advogada, não pode ignorar a inconstitucionalidade do que propõe o Chega e com o que concorda.

Parece então pretender arrancar palmas e encómios cavalgando uma matéria sensível sob a bandeira de argumentos inconsequentes como “se fosse a tua filha não dizias isso!” ou “não te preocupas com os direitos das vítimas!”. A temática penal é demasiado séria e não pode ser personalizada e muito menos objecto de populismo, como a Sra. Dra. acaba de fazer. 

Bom, as acções e os comentários ficam com quem por eles é responsável. Apenas lhe respondo pelo conjunto de inverdades que sobre mim disse. E já agora, quando souber de outro partido político a que eu pertenço diga-me, Sra. Dra. Pelos vistos conhece mais da minha vida que eu mesmo.

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