Tancos devia ser tema de campanha

Sim, Tancos deveria ser tema de campanha, porque continua a ser necessário questionar a forma como a Procuradoria-Geral da República e o Ministério Público conduzem os processos mais mediáticos, nomeadamente os que envolvem políticos.

Sem que ninguém tivesse pedido, mas com aviso prévio no passado sábado na capa do semanário Sol – “MP já tem acusação de Tancos pronta” – o caso do desaparecimento das armas dos paióis do Exército entrou na campanha com algum estrondo mas, até agora, sem provocar vítimas.

Seria espectável que o principal visado fosse o Governo, por causa de uma acusação que pode vir a ser tornada pública em tempo de campanha (a que este jornal ainda não teve acesso) que deverá por em causa a actuação de um seu ex-ministro, Azeredo Lopes. E talvez não tenha sido por acaso que no último debate Assunção Cristas considerou “vergonha nacional” que António Costa não seja confrontado com os diferentes casos que levaram à demissão de membros do executivo e, no dia seguinte, repetiu o argumento.

Só que as notícias que vieram anteontem a lume ao visar mais alto, o próprio Presidente da República, acabaram por ter o efeito de colocar toda a gente a declarar que Tancos “não é um caso de eleições”, nas palavras de Catarina Martins.

Mas, numa outra perspectiva, este devia ser mesmo um caso de campanha. Não as incidências do roubo e da devolução das armas porque, mesmo que a acusação possa trazer algumas novidades, é pouco provável que venha acrescentar algo de substancial ao que já se conhece.

Mas quando um presidente da República, ausente do país em representação do Estado, na Assembleia Geral da ONU, é obrigado a vir prestar declarações para afirmar que “não é criminoso”, era bom que alguns espíritos se sobressaltassem. Quando um presidente da República é trazido à colação num caso criminal através de uma fuga de informação de uma escuta telefónica que, ao que tudo indica, nem sequer faz parte do processo, há uma obrigação colectiva de nos perguntarmos a quem isto interessa.

Sim, Tancos deveria ser tema de campanha, porque continua a ser necessário questionar a forma como a Procuradoria-Geral da República e o Ministério Público conduzem os processos mais mediáticos, nomeadamente os que envolvem políticos. A gestão das fugas de informação e as violações do segredo de justiça continuam constantemente a ser usadas como estratégia, sem que haja qualquer responsabilização, e se os políticos não podem estar acima da lei, também não podem ser despojados dos seus direitos.

Mas, se excluirmos Rui Rio, não parece haver coragem da classe política para fazer da Justiça um tema de campanha. Um dia chegará, mas ainda não foi ontem.

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