Ordens querem combate à publicidade enganosa, mais profissionais e alimentação saudável na Lei de Bases da Saúde

As ordens da área da Saúde foram ouvidas na terça-feira no Parlamento pelo grupo de trabalho sobre a nova Lei de Bases da Saúde.

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Joana Goncalves

A Ordem dos Nutricionistas quer que a promoção da alimentação saudável esteja explicitada na nova Lei de Bases da Saúde, enquanto a Ordem dos Médicos Dentistas sugere que seja contemplado o combate à publicidade enganosa. Já a Ordem dos Enfermeiros pede que esta lei estabeleça a "garantia das dotações seguras dos profissionais de saúde". 

Por sua vez, a Ordem dos Médicos pede que a Entidade Reguladora da Saúde (ERS) seja retirada da proposta da Lei de Bases da Saúde, e depois extinta. Excluída também deve ser a referência às terapêuticas não convencionais. 

As ordens da área da Saúde foram ouvidas na terça-feira no Parlamento pelo grupo de trabalho sobre uma nova Lei de Bases da Saúde que substitua o documento actual, de 1990.

Pela Ordem dos Nutricionistas, a bastonária Alexandra Bento entende que a nova Lei de Bases deve explicitar "as questões da promoção da saúde e da alimentação saudável", no sentido em que compete ao Estado promover, monitorizar e avaliar uma alimentação adequada para a população.

A Ordem dos Médicos Dentistas começou por considerar que o momento actual não é o mais adequado para mudar a Lei de Bases da Saúde, por ser o último ano de legislatura e com actos eleitorais previstos. "Não é por ser uma lei antiga que precisa ou não de ser mudada. É uma lei que tem correspondido às expectativas da sociedade portuguesa. Este não parece o momento adequado para alterar, a não ser que haja um consenso muito grande de todos os partidos e da sociedade civil", defendeu o bastonário Orlando Monteiro da Silva.

Em relação a propostas, a Ordem dos Médicos Dentistas considera que os subsistemas de saúde, os seguros e os planos de saúde "não estão suficientemente abordados em nenhum dos projectos". Para o bastonário dos Dentistas, "há aspectos fundamentais que nenhum dos projectos" para a nova Lei de Bases contempla, como a questão da ADSE. "Esta Lei de Bases não é uma lei do Serviço Nacional de Saúde, vai além disso", recordou Orlando Monteiro da Silva.

Para os médicos dentistas, a Lei de Bases deve ainda contemplar questões sobre a publicidade em saúde e sobre a difusão de informação sobre saúde. "Não é matéria assim tão específica ou sectorial e também não está em nenhum dos projectos", defendeu o bastonário. A ideia é combater a indução artificial de procura, a publicidade enganosa e as técnicas pseudoinovadoras e sem base científica.

Ao contrário da Ordem dos Dentistas, a Ordem dos Psicólogos considera "que chegou o momento de uma nova Lei de Bases" no sector, dado que "muita coisa mudou" e que "novas áreas surgiram".

Isabel Trindade, dirigente da Ordem dos Psicólogos, lembrou que só o Serviço Nacional de Saúde pode garantir a igualdade no acesso aos cuidados de saúde, sugerindo ainda que a nova Lei de Bases define que a saúde deve ser transversal a todas as políticas.

Também a Ordem dos Farmacêuticos foi hoje ouvida no parlamento, tendo defendido que a nova Lei de Bases coloque os direitos sociais como uma das prioridades da lei da estratégia orçamental, com objectivos de bem-estar, além dos objectivos financeiros e económicos.

Os farmacêuticos sugerem ainda que a nova Lei tenha um ponto específico para a genética humana, estabelecendo princípios a respeitar em termos de realização de testes genéticos preditivos, de rastreios genéticos ou de terapia génica.

A Ordem dos Biólogos defendeu um incremento da promoção da saúde e prevenção da doença na futura Lei de Bases da Saúde e sugeriu também que a "especificidade das doenças raras" justifica uma menção específica.

Contudo, o bastonário sublinhou que a Lei de Bases que ainda está em vigor "não impede que o Governo e a Assembleia da República possam investir mais no Serviço Nacional de Saúde" e aumentar a capacidade de resposta do serviço público.

Enfermeiros pedem mais profissionais

Foi ainda ouvida a Ordem dos Veterinários, que remeterá as suas propostas num documento escrito. A Ordem dos Enfermeiros não enviou qualquer representante à audição, mas fez chegar aos deputados um documento escrito.

Nesse documento enviado ao parlamento, a Ordem dos Enfermeiros argumenta que uma nova Lei de Bases deve concretizar que o SNS "só é possível com profissionais motivados e em número suficiente e seguro para prestar cuidados de saúde". E entende que a Lei de Bases deve estabelecer a "garantia das dotações seguras dos profissionais de saúde".

Neste aspecto, os enfermeiros concluem que o projecto do PCP para uma nova Lei de Bases é mais adequado e "tem como virtude defender na política de recursos humanos a necessidade de garantir as dotações adequadas à prestação de cuidados".

A Ordem considera que "a proposta de lei apresentada pelo Governo é aquela que fica mais aquém daquilo que é considerado por todos como relevante para incluir numa Lei de Bases, deixando aos Governos a liberdade de promover ou garantir elementos que deveriam ser reconhecidos como concretizadores do direito fundamental à saúde".

No documento que remeteu ao parlamento, a Ordem sublinha que todos os projectos de lei em discussão na especialidade na Assembleia da República "reconhecem a necessidade de garantir um tratamento igual aos profissionais de saúde, seja submetendo-os todos ao mesmo regime, seja estabelecendo carreiras unitárias, aplicadas independentemente do seu vínculo de emprego".

Exclusão do regulador e das terapêuticas não convencionais

Também presente na audição às ordens da Saúde, o bastonário dos Médicos optou por deixar os contributos da Ordem num documento escrito, criticando os cinco minutos atribuídos para apresentar sugestões sobre a Lei de Bases.

Nesse documento, a Ordem dos Médicos critica todas as cinco iniciativas legislativas sobre uma nova Lei de Bases da Saúde por referirem a Entidade Reguladora da Saúde, que, no entender da Ordem, deve ser "suprimida".

"A posição da Ordem dos Médicos é a da extinção da Entidade Reguladora da Saúde (ERS), até porque, como nos demonstra a realidade, esta cada vez mais se assume como uma entidade (meramente) licenciadora e fiscalizadora de unidades de saúde, funções que não carecem nem justificam a sua entrega a uma entidade administrativa independente (...). A ausência da função principal que deveria presidir à actuação da ERS justifica amplamente a sua exclusão da Lei de Bases da Saúde e a sua posterior extinção", refere a proposta do Conselho Nacional da Ordem dos Médicos.

A Ordem rejeita também a referência às terapêuticas não convencionais, prevista pelo menos nos projectos de lei do Bloco de Esquerda, do PSD e do CDS.

"Rejeita-se que uma lei que contém os princípios gerais em matéria de saúde faça referência às terapêuticas não convencionais, porquanto se tratam de práticas sem bases rigorosas e sem comprovada evidência científica", defendem os Médicos.

Aceitar a inclusão das terapêuticas não convencionais numa Lei de Bases da Saúde seria, no entender da Ordem, "negar a ciência, a investigação, o método científico", considerando que isso é inaceitável.

Sobre a proposta do PCP, a Ordem dos Médicos considera que a concepção de sistema de saúde coincidente com o serviço nacional de saúde, não articulada com os outros operadores, sociais ou privados, é irrealista face "aos recursos limitados do Estado em matéria de concretização dos direitos a prestações sociais".

O documento da Ordem começa por salientar aquilo que tem sido defendido pelo bastonário dos Médicos, Miguel Guimarães, reforçando que "não é preciso uma nova Lei de Bases" para investir mais no SNS.

Audições com tempo limitado

Sobre a escassez de tempo para as audições dos representantes dos profissionais, vários deputados de diferentes grupos parlamentares lembraram que o grupo de trabalho sobre a Lei de Bases terá de ouvir largas dezenas de entidades.

"Este exercício pode não ser o óptimo, mas é o exequível. E não é nenhum desrespeito para com ninguém", afirmou a deputada do CDS, Isabel Galriça Neto, que é também médica de profissão.

O grupo de trabalho vai tentar recolher contributos para uma nova Lei de Bases da Saúde, que substitua a de 1990, estando em cima da mesa cinco propostas: do Governo, do Bloco de Esquerda, do PCP, PSD e CDS, todos em análise em especialidade parlamentar.

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