Ovelhas conseguem reconhecer rostos humanos

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Reconhecer rostos é uma das capacidades do ser humano que também tem sido estudada em algumas espécies de animais: parece que as ovelhas, além de conseguirem identificar outros membros do seu rebanho, podem ser consideradas animais sociais com capacidades de reconhecimento facial de humanos. Embora a habilidade para “distinguir rostos de outras espécies” já tenha sido demonstrada num “pequeno número de estudos”, a mais recente descoberta de investigadores da Universidade de Cambridge, referida num artigo publicado esta quarta-feira, 8 de Novembro, na revista Royal Society Open Science, sugere que as ovelhas, após um breve período de treino, conseguem distinguir rostos familiares em fotografias, em detrimento de indivíduos desconhecidos.

Os autores do estudo sabiam que as ovelhas, animais habituados a viver em rebanho, utilizam uma série de métodos para comunicar, suspeitando que o reconhecimento facial — uma tarefa cerebral complexa — podia ser um deles. Para testar esta teoria, os investigadores treinaram oito ovelhas para reconhecer os rostos de quatro celebridades — o antigo presidente norte-americano Barack Obama, a apresentadora britânica Fiona Bruce e os actores Emma Watson e Jake Gyllenhaal —, a partir de retratos fotográficos apresentados em ecrãs de computador.

“O que fizemos foi perguntar se uma ovelha pode aprender a reconhecer alguém a partir de uma fotografia. Concentrámo-nos em saber se um animal era ou não capaz de processar um objecto bidimensional como consegue uma pessoa”, explica Jenniffer Morton, professora de Neurobiologia na Universidade de Cambridge, no Reino Unido, e principal autora do estudo, em declarações à BBC.

O primeiro passo da investigação foi ensinar os animais a reconhecer rostos. Numa sala com dois ecrãs, um desligado e outro com o rosto de uma das celebridades, era testada a capacidade de uma ovelha para escolher o ecrã com a fotografia. Cada vez que isso acontecia, o animal atravessava um raio de infravermelhos e recebia uma recompensa alimentar. O passo seguinte foi mostrar duas fotografias em cada teste: um rosto aleatório e uma celebridade. Se a ovelha escolhesse a fotografia de Barack Obama, por exemplo, recebia outra recompensa. Oito em cada dez vezes, as ovelhas sabiam a que rosto associar a comida.

Para comprovar que as ovelhas estavam a reconhecer verdadeiramente os rostos e não apenas imagens familiares, os autores do estudo apresentaram também imagens com diferentes perspectivas de cada celebridade. Nestes casos, as ovelhas conseguiram reconhecer os rostos mais de metade das vezes. Por último, os investigadores analisaram ainda se as ovelhas eram capazes de reconhecer os rostos familiares dos manipuladores – indivíduos que costumam passar duas horas por dia com as ovelhas – também a partir de fotografias, sem qualquer treino prévio. Aqui, quando o retrato do manipulador era intercalado aleatoriamente com as imagens das celebridades, as ovelhas escolhiam sete vezes a fotografia do manipulador a cada dez tentativas.

As principais conclusões da equipa de cientistas que observou a reacção das ovelhas em diversas apresentações evidenciam que estes animais “não só aprendem a reconhecer rostos desconhecidos, como também a reconhecer o rosto de uma pessoa familiar para as mesmas, através de imagens bidimensionais”, refere o resumo do artigo. O resultado foi também positivo quando foram confrontadas com fotografias de diferentes perspectivas dos mesmos indivíduos. Segundo os cientistas, até agora não era conhecido nenhum estudo que tivesse avaliado esta capacidade, anteriormente apenas demonstrada em humanos.

Esta descoberta pode vir a ser fundamental para o desenvolvimento de um tratamento para a doença de Huntington – uma doença degenerativa do sistema nervoso central que afecta a capacidade cognitiva, o equilíbrio emocional e a motricidade. Segundo a National Geographic, os dados da Organização Mundial de Saúde estimam que entre cinco e sete pessoas em cada 100.000 são afectadas por esta doença nos países ocidentais.

A ideia de estudar o comportamento das ovelhas está directamente relacionada com a dificuldade que estes doentes enfrentam em reconhecer rostos. Os primeiros sintomas são as mudanças de humor e de personalidade, que progridem, ao longo do tempo, para problemas de memória, fala, movimento e saúde mental, não existindo ainda uma cura conhecida. “Esperamos que, com tratamentos que melhorem a patologia de Huntington, possamos ver a reversão de algumas das mudanças cognitivas”, refere Jennifer Morton, ao The Guardian. “Queremos entender como a doença começa para que possamos começar a pensar em preveni-la”.

Os investigadores esperam que, ao entender melhor os cérebros das ovelhas, possam testar terapias que podem no futuro ser usadas em pessoas. O objectivo é testar a eficácia de novos medicamentos através dos resultados obtidos em ovelhas modificadas. “Podemos dar novos tratamentos às ovelhas e usar as nossas tarefas para medir quão bem se comportam ao longo do tempo”, disse ainda a investigadora, também ao jornal britânico. “Se o tratamento resultar, é expectável não ver qualquer diferença entre uma ovelha normal e uma ovelha com Huntington que esteja a receber tratamento”, conclui.

 

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