Igreja Católica chilena proíbe padres de "tocar nos genitais" de crianças

A Igreja chilena publicou um manual com os comportamentos que os sacerdotes devem adoptar na sua interacção com os fiéis. Vítimas consideram o documento - entretanto retirado - "vergonhoso".

Foto
A Igreja Católica chilena proíbe ainda "condutas que podem ser mal-interpretadas e por isso se devem evitar" Reuters/STEFANO RELLANDINI

A braços com um escândalo de pedofilia, a Igreja Católica chilena publicou um manual de instruções dirigido aos sacerdotes sobre os comportamentos proibidos na interacção com crianças e menores. “Abraços demasiado apertados”, “palmadas nos glúteos, tocar na áreas dos genitais ou no peito”, “fazer massagens”, “dar beijos na boca” ou “recostar-se ou dormir junto a rapazes, raparigas ou adolescentes” são algumas das proibições que constam no documento assinado pelo cardeal de Santiago do Chile, Ricardo Ezzati, e citado pelo El País.

O manual gerou indignação entre as vítimas, que acusam a Igreja chilena de não compreender a dimensão da tragédia dos abusos e classificam o documento de “vergonhoso”.

Ezzati, também ele acusado de encobrir casos de abusos sexuais no seio da Igreja Católica chilena, não fala directamente em abusos sexuais e recorre a expressões como "sinais ambíguos" e "factos dolorosos”.

O documento de nove páginas dedica um capítulo às “mostras de afecto”. Nele, a Igreja Católica chilena proíbe os “abraços por trás”, “lutar ou entrar em jogos que impliquem tocar de maneira inapropriada” e “condutas que podem ser mal-interpretadas e por isso se devem evitar”.

Os sacerdotes não devem “violar a privacidade, olhando ou tirando fotos a rapazes, raparigas, adolescentes ou pessoas vulneráveis que estejam nuas, a vestir-se ou a tomar banho”, continua o documento, acrescentando que “qualquer documento sexualmente explícito ou pornográfico é absolutamente inadmissível”.

O documento, intitulado Orientações que promovem o bom trato e a coexistência pastoral saudável, foi entretanto retirada após a polémica e o cardeal chileno veio esclarecer que se tratava de um instrumento de trabalho.

Ricardo Ezzati vincou que “vão ser corrigidos certos conteúdos que foram traduzidos de forma literal e que não são adequados e podem ser sujeitos a interpretações erradas” e informou que a versão final deverá ser apresentada em Abril de 2019.

O documento "demonstra com clareza que a Igreja não entende nada desta tragédia. É indigno", disse Jaime Concha, médico chileno que entre os dez e os 17 anos sofreu abusos sexuais de sacerdotes no colégio que frequentava. "Não são demonstrações de carinho, são crimes contra rapazes, raparigas e adolescentes. Foi isso que nos fizeram quando nos atacaram sexualmente", declarou o médico de 55 anos.

Pedofilia na Igreja Católica

O escândalo de pedofilia no Chile teve como protagonista o padre Fernando Karadima, acusado de violar pelo menos quatro jovens desde os anos 1980. Em 2015, o bispo Juan Barros foi acusado de ter encoberto durante décadas os crimes de Karadima.

Na visita do Papa Francisco ao Chile no início deste ano, algumas das vítimas do padre Karadima vieram a público exigir um pedido de desculpas do líder da Igreja Católica. Mas Francisco respondeu que eram “calúnias”. Meses depois admitiu o seu erro, dizendo sentir “dor e vergonha” pelos abusos cometidos, e encontrou-se com algumas das vítimas.

Em Agosto, o Papa publicou uma carta onde admite "vergonha e arrependimento" face às sucessivas denúncias de abusos sexuais de crianças por membros da Igreja em todo o mundo e pelo o encobrimento que a instituição fez a estes casos.

A viver uma crise de escândalos sexuais na instituição que dirige, o Papa Francisco convocou uma cimeira sobre a prevenção de abusos sexuais e protecção de crianças  para 21 e 24 de Fevereiro de 2019, na cidade do Vaticano.

Sugerir correcção
Ler 15 comentários