Promotor de obra em Montebelo no Porto critica embargo total

O promotor afirma que a sentença que determinou o embargo total da obra na rua de Montebelo "é um estranho caso de activismo judicial".

Foto
O processo está em tribunal e o juiz decretou o embargo total da obra

O promotor do projecto de construção de uma residência para idosos na Foz Velha, no Porto, alega que, "no limite", o Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) deveria proibir demolições no local, mas não decretar um "embargo total da obra".

"Deveria o tribunal ter, no limite, decretado uma providência que preservasse o risco de produção da situação de facto consumado identificada, devendo a mesma consistir não num embargo total da obra - como foi decretado - mas, mais simplesmente, na proibição da execução de obras de demolição. Ao conceder um embargo total da obra, o tribunal decretou providência cautelar que não se limita ao estritamente necessário para evitar a lesão dos interesses defendidos" pelo promotor, lê-se no recurso interposto em tribunal, a que a Lusa teve acesso.

No âmbito da providência cautelar interposta pela Associação dos Moradores e Amigos da Foz Velha (AMAFV), o tribunal determinou, em Agosto, "o embargo total" daquela obra na rua de Montebelo e alertou para a "probabilidade" de "ser julgada procedente" a acção principal, o que levaria à "nulidade" de decisões camarárias e à "demolição" da construção, no âmbito da providência.

No recurso interposto em tribunal, a que a Lusa teve acesso, o promotor afirma que a sentença que determinou o embargo total da obra na rua de Montebelo "é um estranho caso de activismo judicial", com o TAF do Porto a substituir-se às entidades administrativas - Câmara do Porto e Direcção Geral do Património Cultural (DGPC) - "na interpretação e defesa do interesse público".

Para o promotor, substituindo-se às entidades administrativas "e à margem da posição que estas apresentaram no processo", o tribunal "interpretou, ele próprio, o interesse público, caindo numa intolerável intromissão do poder judicial sobre o poder executivo", e este embargo "não se limita ao estritamente necessário para evitar a lesão dos interesses defendidos" pela AMAFV, "assim violando" o código de processo dos tribunais administrativos.

O promotor alega também que a sentença "inclui meras conjecturas genéricas" quando refere "risco de destruição ou deterioração de um conjunto classificado", e sublinha que "está válido e em vigor um alvará de loteamento que permite edificações".

Assim, "estando em questão (apenas) o uso a dar aos edifícios, a construção do edifício não pode considerar-se como de facto consumado, porque será facilmente reversível em caso de procedência da acção principal, alterando-se o uso para habitação inicialmente prevista", acrescenta, indicando também que "os custos advenientes de tal reposição da legalidade urbanística não podem ser considerados como de difícil reparação, pois são perfeitamente quantificáveis em dinheiro".

Sustenta que "os danos que resultam" deste embargo total mostram ser "superiores aos que resultariam da sua recusa (que são nenhuns, a bem dizer)".

Considera ainda que o tribunal deveria ter imposto à AMAFV a prestação de garantia por uma das formas prevista por lei.

Na decisão de dia 03 de Agosto, o TAF determina "o embargo total da obra de construção, demolição e escavação, que está/esteve em curso" no local, pois a "continuação dos trabalhos pode constituir uma grave lesão para o interesse público e para [...] o município", uma vez que, se a acção principal reconhecer a "nulidade de actos administrativos", levará à "obrigação de demolição e reposição do anteriormente existente" na zona classificada como de interesse público em 2013.

Tal representaria "um prejuízo muito maior se comparado com o mero atraso da obra", diz o TAF naquela decisão, afirmando ser "grande a probabilidade de a pretensão da requerente [a AMAFV], formulada na acção principal vir a ser julgada procedente".

A AMAFV interpôs em 2016 em tribunal uma acção contra a Câmara do Porto e o Ministério da Cultura, considerando existirem ilegalidades na aprovação e licenciamento de um loteamento para construir uma residência para idosos naquela zona de interesse público, que está classificada desde 2013.

Nessa acção principal, a associação pede ao TAF que condene a Câmara do Porto a "abster-se de aprovar quaisquer licenças de construção para aquele local objecto do loteamento, sem previamente verificar a caducidade do loteamento e assegurando a conformidade do licenciamento com a classificação da Foz Velha e o Plano Director Municipal do Porto".

No âmbito da providência cautelar, a que o promotor recorreu, o juiz determinou em Abril a "suspensão" dos trabalhos.

Contactada hoje pela Lusa, fonte da Câmara do Porto afirmou que "não comenta contendas entre privados".

Em agosto, após ser conhecido o embargo total da empreitada, a autarquia portuense disse à Lusa que "a obra já se encontrava embargada", pelo que lhe não compete, "nesta fase, tomar qualquer ato ou iniciativa", aguardando "pela decisão da acção principal".