Inquéritos à morte de jovem após dez idas ao hospital estão por concluir há dois anos

Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa concluiu que clinicamente “nunca houve evidências” de que a jovem de 19 anos, que morreu após uma dezena de visitas à urgência, tinha um tumor cerebral. Entidade Reguladora da Saúde diz que poderiam ter feito mais, mas apenas emitiu orientações.

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Fernando Veludo

Das dez vezes que Sara deu entrada na urgência do Hospital Padre Américo, em Penafiel, saiu com o mesmo diagnóstico: estado de ansiedade. Os exames médicos e complementares foram considerados normais. As melhorias resultantes do tratamento pareciam confirmar o diagnóstico. Nada levava os médicos a crer que a jovem de 19 anos tivesse um tumor cerebral que lhe viria a tirar a vida em 2013, diz a versão do hospital.

O que a Entidade Reguladora da Saúde (ERS), que abriu um inquérito ao caso, não consegue responder é se há fundamentação nas decisões médicas tomadas ao longo dos três anos que Sara foi vista nas urgências. Para isso precisa das conclusões da Ordem dos Médicos sobre este caso, pelas quais espera há dois anos. O processo disciplinar instaurado em Julho de 2016 encontra-se em fase de instrução, confirma a ordem profissional.

É a esta entidade que cabe “aferir da existência ou não de fundamentação clínica para as decisões adoptadas pelo CHTS [Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa]”, no qual se integra o hospital de Penafiel, refere a ERS numa deliberação datada de Fevereiro, só divulgada nesta quarta-feira. O documento dá conta de que a Ordem demorou mais de um ano a responder ao regulador que o seu inquérito a este caso não estava concluído.

A ERS decidiu então emitir este primeiro documento e esperar pelas conclusões da Ordem.

Os pais de Sara defenderam junto do tribunal administrativo que o diagnóstico da neoplasia ficou comprometido por nunca ter sido feita uma tomografia axial computorizada (TAC) ou uma ressonância magnética.

Médicos "poderiam ter feito mais"

Entre 2010 e 2013, Sara foi por dez vezes observada na urgência do hospital de Penafiel e outras duas no Pólo de Valongo do Centro Hospitalar de São João com queixas de dores de cabeça fortes, desmaios, perdas de equilíbrio e vómitos. Perante esta sintomatologia não foram “descurados quaisquer procedimentos, técnicas ou violadas as guidelines em vigor”, refere a administração do CHTS em resposta à ERS. Clinicamente, sublinha, “nunca houve evidências da existência de um tumor cerebral”.

Não obstante, considerando o número de vezes que a jovem foi vista nas urgências, um perito ouvido pela ERS considera que os médicos poderiam ter feito "mais no sentido de esclarecer o quadro clínico da doente". Isto levou o regulador a emitir orientações ao centro hospitalar para que garanta “uma melhor articulação entre os profissionais de saúde” para responder adequadamente e em tempo útil. E, consequentemente, que assegure a “realização tempestiva de todos os meios complementares de diagnóstico”, para “uma adequada prestação de cuidados de saúde face ao hipotético diagnóstico”.

De todas as vezes Sara teve alta. Era-lhe dito para continuar a ser seguida pela médica de família e pela psicóloga escolar e estar a atenta a sinais de alarme. E, esclarece o CHTS, foi encaminhada para consultas de especialidade – de medicina interna e psiquiatria marcadas para Novembro de 2012 –, às quais a jovem faltou.

Tanto o processo de inquérito da Ordem dos Médicos como da ERS surgiram depois do Jornal de Notícias ter revelado a história, três anos após a morte de Sara, numa altura em que os pais recorriam à justiça para reclamar uma indemnização por negligência médica ao centro hospitalar. As averiguações multiplicaram-se. Entre elas, a da Administração Regional de Saúde do Norte à actuação dos cuidados de saúde primários não encontrou "quaisquer comportamentos passíveis de tutela disciplinar".

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