Bud Spencer: Deus perdoa, ele não

Com a morte de Bud Spencer, há menos um modelo de virilidade para seguir neste mundo em que os homens querem ser mais femininos e as mulheres mais masculinas

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Sempre achei que o meu pai tinha o seu quê de Bud Spencer, sobretudo por causa da barba, farta, cerrada e negra. Por isso, sempre esperei que ele, tal como Bud, aviasse uma roda de bandidos com uma chapada só. Foi sempre essa a bitola que escolhi para ele e para qualquer dos meus ídolos.

Agora já não, porque a barba dele está branca e Bud Spencer morreu. E com ele morreu não só essa característica única, mas também toda uma infância de tardes passadas em frente à televisão a ver religiosamente as películas de Bud Spencer e Terence Hill que passavam na RTP ou eram alugados no videoclube. Isto na altura em que o cinema realmente significava algo e os heróis se mediam aos palmos como deve ser — porque para comuns mortais estamos cá nós.

Apesar da sua intocabilidade no ecrã, ao contrário de um 007, ele preferia os prazeres simples e comuns da vida, como comer um tacho inteiro de feijão com cebola, de preferência do modo mais ruidoso e labrego possível. Nada de cortesias e de ser politicamente correcto, não no seu mundo, onde ser gordo, barbudo, guedelhudo, desgrenhado e rosnar era sinónimo de viver a vida do modo mais puro e espontâneo possível. Portanto, também nada de histórias complexas cheias de reviravoltas, apenas a vida na forma mais fidedigna possível.

Carlo Pedersoli, cujo nome artístico Bud Spencer era uma junção da sua marca de cerveja preferida (Budweiser) e do seu actor preferido (Spencer Tracy), vinha do tempo em que os homens tinham pelos no peito e voz grossa. E por causa disso e do seu carácter genuíno marcou duas gerações portuguesas: a dos pais do PREC que tinham os filmes em VHS e a dos seus filhos que os viram até à exaustão. E se ele não deixou mais nada, deixou pelo menos a valiosa lição de que ter bom coração não significa deixar que nos comam as papas da cabeça.

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