Os senhores que assinam as notas de euro

Mario Draghi, mesmo enquanto presidente do BCE, continua a pertencer ao "lobby" bancário G30, onde se organiza com os banqueiros da JP Morgan Chase, Goldman Sachs, Morgan Stanley, Santander ou UBS

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SAMUEL KUBANI

Uma parceira publico-privada é uma transacção em que os Estados entram com o dinheiro e os privados entram com os bolsos. E se muito se fala hoje da bazuca de dinheiro que há uma semana o presidente do Banco Central Europeu disparou perante a ameaça da deflacção, agora, como sempre, Mario Draghi injecta dinheiro no sistema, mas é proibido que esse dinheiro chegue às populações (é obrigatório continuar a destruir os países com o “ajustamento estrutural”). Draghi e a UE continuam a salvar o sistema financeiro, ignorando as pessoas que têm de ser salvas. Draghi, “O Dragão”, mostra a consistência e a coerência com que sempre beneficiou os privados, não só quando trabalhava para estas empresas, mas principalmente quando ocupou destacados cargos públicos.

Mario Draghi sucedeu a Jean-Claude Trichet em novembro de 2011. Nos anos 80, era de ouro das políticas de “ajustamento estrutural” do FMI e do Banco Mundial nos países mais pobres do mundo (que os tornaram paupérrimos), Draghi começou a dar nas vistas no Banco Mundial, de onde deu o salto para o sistema bancário público em Itália. Foi director-geral do Tesouro italiano entre 1991 e 2001, onde foi o responsável pela privatização das maiores empresas públicas do país e pelo processo de entrada no euro.

Draghi, à frente do Comité de Privatizações em Itália, foi responsável, entre outras, pela entrega dos sectores industriais mais avançados, incluindo a IRI que era a 7.ª maior empresa industrial mundial na altura (liderada na época por Romano Prodi, que vinha da Goldman Sachs e seguiu para primeiro-ministro italiano e presidente da Comissão Europeia), a Telecom Itália, a companhia energética nacional ENEL e o gigante petrolífero ENI, aos bancos e fundos Carlyle, Whitehall, Morgan Stanley, Merryl Linch e Goldman Sachs. Usando a porta giratória público-privada, saltou para a direcção da Goldman Sachs nos Estados Unidos em 2001.

Independência

Quatro anos mais tarde, foi nomeado presidente do Banco Central de Itália, onde foi responsável pelos principais resgates à banca privada italiana, dos quais se destaca o Monte dei Paschi di Siena, que custou às contas públicas italianas pelo menos 6,8 mil milhões de euros. No final, apesar da fortuna recebida, este banco despediu 4600 trabalhadores e fechou 400 balcões em todo o país, continuando hoje a receber dinheiro público. A falha gigantesca enquanto regulador não impediu, naturalmente, que Mario Draghi fosse nomeado o regulador principal da União Europeia, presidente do Banco Central Europeu.

O BCE deve ter como critério as falhas de regulação para eleger os seus dirigentes, ou não tivesse Vítor Constâncio sido escolhido para vice-presidente do BCE depois das gigantescas perdas no BPN, BPP, BCP e BES, sucedendo a Lucas Papademos, antigo presidente do Banco Central Grego responsável pelas fraudes às contas públicas para aderir ao euro, feitas em conjunto com o Goldman Sachs, no qual também (oh surpresa!) tinha trabalhado.

Mario Draghi, mesmo enquanto presidente do BCE, continua a pertencer ao "lobby" bancário G30, onde se organiza com os banqueiros da JP Morgan Chase, Goldman Sachs, Morgan Stanley, Santander ou UBS para discutir e influenciar a política financeira e monetária internacional. O presidente do G30 é Jean-Claude Trichet, ex-presidente do BCE. Ainda bem que um dos critérios da actuação do Banco Central Europeu é independência, senão poderíamos ser tentados a pensar que este banco é apenas uma parceria publico-privada, em que os senhores que assinam as notas de euro e dão o dinheiro, estarão depois do lado dos privados com os bolsos abertos para recebê-las.

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