REPA: as peças sustentáveis de um ilustrador fascinado por candeeiros

Sem emprego na sua área, o ilustrador Gabriel Loureiro criou uma marca de mobiliário sustentável que quer distinguir-se pela "criatividade" e praticar preços "low cost" — sem a pretensão de concorrer com grandes empresas como a Ikea

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Adriano Miranda

Gabriel Loureiro lembra-se perfeitamente do dia em que um amigo lhe pediu ajuda para se desfazer de mobiliário que tinha lá por casa. Tentaram, sem sucesso, oferecê-lo à Remar e a história acabou com os dois a destruírem as peças contra uma parede para que coubessem num ecoponto municipal. "Aquilo causou-me estranheza. Há tantas famílias com necessidades e no entanto estávamos ali a desperdiçar..." Não foi apenas por aquele dia, mas houve ali um clique que o ilustrador, actualmente desempregado, não esquece e que acabou por contribuir para a criação da REPA, um projecto que se dedica à criação de peças de mobiliário, decoração e design de interiores a partir de matérias-primas recicladas.

As criações da REPA querem distinguir-se pela “criatividade” (mais do que pelos acabamentos) e preços "low cost". E isto, obviamente, não significa concorrer directamente com grandes empresas: “Comparativamente com o preço de peças novas da Ikea nem sempre parecem baratas. Mas é impossível competir nesse segmento. O meu objectivo é que as pessoas atribuam valor pela criatividade.” As peças que Gabriel cria — mesas, cadeiras, candeeiros (sobretudo candeeiros, já lá vamos) — prometem “transmitir vivências e experiências” e têm um objectivo final bem delineado: “Tentar sensibilizar para a reciclagem”.

Quando viveu em Londres, o ilustrador de 31 anos cruzou-se com alguns hábitos que gostava de ver em Portugal: “Era recorrente encontrar peças com um papel colado a dizer ‘Please, take me’. Cheguei a levar um armário e um monitor para casa. Cá não existe essa sensibilidade”, lamenta. Em Aveiro, onde Gabriel Loureiro vive actualmente, nem o hábito de colocar peças junto aos caixotes de lixo (como já é relativamente comum em Lisboa e no Porto) existe: “Há uma desvalorização clara de peças antigas.”

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Adriano Miranda

Uma rápida passagem pelo reportório de Gabriel basta para perceber rapidamente o "fascínio" que o criador tem por candeeiros: "É uma paixão antiga. Para mim, tudo dá para fazer um candeeiro" (ver fotogaleria), disse ao P3, acrescentando que a última criação (candeeiro cork breader) foi apresentada à Corticeira Amorim ("Estou à espera de uma resposta, vamos ver no que vai dar").  

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Candeeiro cork breader foi apresentada à Corticeira Amorim Adriano Miranda

Portugal não valoriza a criatividade

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Adriano Miranda

O negócio, iniciado em Abril, não é fácil. “As reacções e os comentários têm sido muito bons, mas isso não paga contas”, disse ao P3 numa conversa telefónica: “Portugal não é um mercado que valorize muito a criatividade, mas por carolice cá me mantenho.” Gabriel Loureiro sabe bem do que fala — o número de peças da REPA vai crescendo entre procura de emprego como ilustrador (e muitas entrevistas infrutíferas) e o percurso artístico vai longo e inclui projectos como o RERA ou o tipTYPE

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ilustrador vende candeeiros desde 20 euros Adriano Miranda

No site do ilustrador é possível ainda encontrar um secção apelidada de “Eggs” (iniciais para Eco, Green, Getaway, Structure's). Um projecto de casas portáteis sustentáveis que gostava de explorar um dia: “É uma forma de expor uma potencial ideia para um potencial cliente. Eu também trabalho com 3D e se houver um cliente interessado num projecto destes eu posso fazê-lo.”

Para já, no que à marca de mobiliário diz respeito, ainda são poucos os pedidos de peças “à medida”, mas o criador também espera entrar nesse mercado: “o cliente decide que móveis quer recuperar e Gabriel faz um trabalho e orçamento à medida. Um projecto futuro que garanta a sustentabilidade da REPA? conquistar o exterior, apostando numa “exploração do comércio online” através de “sites específicos deste tipo de mobiliário”.

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