Errando por desenhos e fotografias da Rússia à Nova Zelândia

Susana Gasalho e José Perico já partiram de Moscovo em direcção à Nova Zelândia, entre as fotografias dela e os desenhos dele, imortalizando paisagens e experiências nos Diários da Errância. Uma viagem sem data de regresso ou percurso planeado, o ritmo definido clique a clique, traço a traço

Foto
Susana Gasalho

Todos os passeios terminavam invariavelmente com Susana Gasalho atrás de uma máquina fotográfica, José Perico curvado sobre o caderno de sketches e aguarelas. Resultado? A mesma viagem olhada a quatro mãos e duas técnicas diferentes, que desde 2012 se unem no blogue Diários da Errância. “Aliamos estes mundos que nos fascinam, que são a viagem, o desenho e a fotografia, e mostramos os nossos pontos de vista dos sítios por onde andamos”, resume José.

O casal lisboeta lança-se agora na sua primeira grande viagem, desde a Rússia até à Nova Zelândia, divulgando pelo caminho testemunhos de cada vivência, com as fotografias dela e os desenhos dele. Só num momento o papel se inverte: todos os dias, às 20h locais, José faz uma montagem com duas fotografias, uma selfie e outra revelando o que se encontra à frente dele naquele momento.

A cada disparo, a cada traço, o objectivo é serem “fiéis ao que estão a ver” e ao mesmo tempo transmitirem “a alma do que estão a viver e sentir”. No Facebook já há pormenores de Moscovo, incluindo panorâmicas do rio e a catedral de São Basílio, que mais parece “uma colorida casa de bonecas feita de doces e suspiros”. Há Baikal, o maior lago doce do mundo, muitas carruagens de comboio, por dentro e por fora e pequenos vídeos de 17 segundos.

Agora andam pela Mongólia, um mês depois de aterrarem na capital russa. O regresso a Portugal só as vivências do caminho o ditarão. É que Susana, 30 anos, e José, 27, partem nesta aventura como as imagens que criam: trabalhando com o que encontram a cada instante e jogando ao improviso, sem pressas, grandes planos ou orçamentos traçados a “folhas de Excel”.

O casal prevê, por isso, que a viagem dure entre seis meses a um ano, mas não há data definitiva para o regresso. Não só porque acreditam ser “a forma mais fácil de viajar” – “sem a obrigação de ver tudo a correr como nas férias” –, mas também porque partem com a vida “em aberto”.

José, designer de comunicação, terminou o trabalho no Museu Nacional de História Natural e da Ciência, em Lisboa, depois de a bolsa de investigação não ter sido renovada. Susana, licenciada em geografia, pós-graduada em jornalismo e amante de fotografia, não se revia no emprego que tinha como administrativa e demitiu-se para iniciar esta viagem. Como tal, o casal quer aproveitar para “experimentar fazer voluntariado”, “quem sabe agarrar alguma oportunidade de trabalho” e sobretudo “crescer, tanto a nível pessoal como profissional”, ganhando experiência a fazer o que mais gosta.

Depois do comboio transmongoliano que os levará à China, voam para o Japão e de seguida visitam um amigo em Hong Kong. “Até aqui sabemos que vamos, depois ficamos lá um tempo com ele para planear o que vamos fazer a seguir”, conta Susana. “A ideia é visitar a maioria dos países do sudeste asiático. Ir à Índia, Nepal, Tibete e depois descer para a Indonésia, Austrália e Nova Zelândia”, enumera, assumindo mais uma vez que “como é tudo muito espontâneo” o percurso pode ser alterado a qualquer momento.

Praia, montanha e natureza

O sonho? Só terminar na América do Sul, na volta ao mundo que ambicionavam antes de serem obrigados a “encurtar os planos” por falta de fundos. “Se a viagem correr bem e se encontrarmos algum trabalho até pode ser que tenhamos dinheiro para continuar”, sonha Susana. No entanto, por agora a meta é mesmo chegar à Nova Zelândia, o país que o casal aguarda com mais expectativa. “Tem tudo: praias, montanha, natureza, é bonito e distante, sempre tive esse encanto”, conta Susana. “Tem qualquer coisa de mágico”, remata José.

Admitem que sempre foram “mais direccionados para a natureza do que para grandes cidades e metrópoles” e, por isso, os locais que não querem deixar de visiatr fazem-se de flora e fauna abundantes, paisagens a perder de vista. À Nova Zelândia acrescenta-se a Mongólia, “pela natureza e horizontes vastos”; o Nepal e o Tibete, “pela carga espiritual, pela cultura muito simples e o facto de viverem bem com a natureza envolvente”; e um sítio da China, “pelas montanhas que parecem diferentes de tudo o que já vimos até hoje e amigos dizem ser das melhores paisagens de sempre”. Confessa Susana: “tenho o nome escrito há anos no caderno, mas não sei dizer [risos], só sei que vi uma fotografia e podemos não ir a mais lado nenhum, mas temos de ir ali”. Mais tarde descobrimos: o sítio é Zhangjiajie, com os seus finos e vertiginosos penhascos.

No entanto, garantem que o mais importante “não é propriamente os sítios onde vão, mas o viajar e andar sem data ou destino certo”. “Acho que isso é que nos traz mais experiências e nos valoriza enquanto pessoas”, defende José. Por isso, ainda não sabem onde terminam ou quando regressam, mas é provável que voltem sempre a partir. Afinal de contas, Susana confessa-se uma “eterna inconformada” e de vez em quando sentem necessidade “de sair do país e procurar novos ares, experiências e pessoas”. “Não sei se alguma vez me vou sentir mesmo bem nalgum sítio”, resigna-se, recordando a música de António Variações: “Só estou bem aonde não estou”.

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