Os ouvidos também comem

Da cor à textura, passando pelo cheiro, tudo conta. O que muitas vezes não imaginamos é que o som também pode determinar o gosto dos alimentos

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Ulterior Epicure/Flickr

Que o sabor e o prazer da comida depende tanto do paladar como do olfacto já todos sabemos. Da cor à textura, passando pelo cheiro, tudo conta. O que muitas vezes não imaginamos é que o som também pode determinar o gosto dos alimentos. Parece-me que está a chegar a altura em que, além da ementa, a “playlist” também vai ter um papel determinante nos restaurantes.

Esta área tem sido já há alguns anos explorada. O som tem sido considerado um “modulador” do sabor. O som pode ser mesmo a fronteira final da apresentação da comida. De uma forma geral, o que acontece é que sons de alta frequência podem aumentar a sensação de doce, enquanto que sons a baixas frequências podem realçar o amargo.

O chefe de cozinha Heston Blumenthal já fazia tal associação em 1997, quando sugeria, por exemplo, que o som ideal para comer peixe é o barulho do mar. Um dos pratos mais famosos do seu restaurante é chamado “O som do mar” — os clientes podem deliciar-se com um prato de frutos do mar enquanto ouvem sons gravados à beira-mar através de um iPod colocado dentro de uma concha em cima da mesa.

No entanto, foram as várias experiências realizadas que mostraram que até os sons abstractos têm a grande capacidade de alterar a percepção do sabor. Um desses estudos foi realizado no restaurante londrino House of Wolf. Ao longo de um mês foi servido o apelidado “sonic cake pop”, um bolo de chocolate com uma cobertura agridoce acompanhado ainda de um número de telefone para os clientes ligarem. Do outro lado da linha estava um operador que dava opção de pressionar a tecla um para realçar o sabor doce ou a tecla dois para o amargo. Segundo a chefe do restaurante, Caroline Hobkinson, resulta sempre.

Como? Ao ouvir um som de baixa frequência a consciência diminui o foco na parte de trás da língua, o que permite realçar os sons amargos, enquanto que o som das altas frequências permite o foco em todas as zonas da língua, especialmente da zona que permite saborear o doce. No fundo, o segredo está, mais uma vez, no cérebro.

Empresas como Unilever ou Nestlé já apostam também neste tipo de investigação. E até os produtores dos gelados Ben & Jerry's parecem ter percebido o potencial deste “tempero” sonoro, e estão mesmo a considerar uma gama sonora de sabores de gelados. 

Os mais curiosos que queiram comprovar a sensação, podem experimentar aqui. Eu própria já experimentei com chocolate — em nome da ciência, claro.

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