De Guimarães a Palermo (e volta)

Este circuito, o único que se faz entre todas as cidades europeias do desporto, terá na sua totalidade cerca de 6.500 quilómetros

Foto
Xerones/Flickr

Quando comecei a viajar de moto estava longe de pensar que a travessia, por superfície dos territórios, me levaria um dia a uma dinâmica tão aventureira quanto esta. Tudo começou num gesto simples, numa primeira volta pelas fronteiras da província. Depois o Minho ficou para trás, e foi num instante que cheguei da fronteira do país às planícies quentes de Espanha; à costa agreste e recortada da Normandia; à beleza agreste e natural dos Dolomites ou ao verde profundo das florestas bavaras, estendendo a vista o mais que podia, na ânsia de chegar um pouco mais longe.

Em tudo me acompanhou o Victor Vilaça, companheiro inegável de viagem e que, do alto dos seus 62 anos, me instiga sempre a continuar. Depois foi África, e nela o cumprimento da “Alma dos Lugares”, um projecto que criamos para estudo e divulgação do património português espalhado pelo mundo. Por isto reencontramos Safim, Azamor, Mogador ou Mazagão, todas elas praças-fortes quinhentistas portuguesas na costa de Marrocos. Ou então o incontornável Bojador (no Saara Ocidental), que mantém ainda os seus bancos de areia, impondo atenção a todos quanto se aventuram ao longo do mar, por cabotagem. Ou ainda Ouadane, no interior da Mauritânia, e Muscat no Sultanato de Omã.

Há sete anos que viajo nesta métrica dos lugares, sobretudo os mais esquecidos, perdidos na memória mais imediata das pessoas, mas que ainda subsistem fruto da sua (e da nossa) história ou da importância do seu património, edificado à sombra da mais longa diáspora. O espírito de viagem mantém-se inalterado, na ânsia do despojo das coisas e dos ritmos do quotidiano e no purgar da alma, através do denso percorrer das estradas que se estendem na superfície dos lugares.

Foto
Abel Cardoso, arquiteto de Guimarães e um dos motards que fará um périplo pelas Cidades Europeia do Desporto 2013

Trago sempre na mente a memória dos mapas traçados por Hugo Pratt, ao longo das suas pranchas lindíssimas, à medida que nos desvenda em desenhos de traços soberbos, as aventuras e desventuras de Corto Maltese. Também eu tenho sede de lugares e também eu os desenho (por formação) à medida que os vou descobrindo, cumprindo mais uma etapa num mapa previamente apontado num caderno de viagem. Sede dos lugares afastados, despojados de comodidades, onde o tempo demora em passar e a vista se perde pela escala da lonjura dos espaços.

Este ano um outro desafio se impôs. Pretendemos levar Guimarães à Europa, através das cidades europeias do desporto. Alba, Cremona, Modena, Reggio Calabria, Castelldefels, Lorca e Estepona serão as cidades visitadas por nós (nesta precisa ordem), num circuito que terá na sua totalidade cerca de 6.500 quilómetros e que nos levará dos Pirinéus até aos Alpes da Provença; desde a província de Piemonte até ao final da Calabria; desde o estreito de Messina ao de Bonifácio, tudo para se levar um pouco da Cidade-Berço a estes lugares, deixando prova que esta iniciativa lusa é a única, com este carácter, que se faz entre todas as cidades europeias do desporto.

Deixaremos o testemunho físico, nas oferendas que transportamos, mas também nos hábitos e nos gestos da gente do Norte, e que transpirará nos contactos (in)formais que teremos ao longo da agenda prevista. Viajaremos sozinhos, mas nos alforges das Harleys levaremos, mais uma vez, a alma de uma cidade que, através dos seus cidadãos, se pretende dar ao mundo.

Sugerir correcção
Comentar