Estágio: puro eufemismo da palavra exploração

Chegou o momento em que nos devemos, individual e colectivamente, manifestar dando a conhecer todo o descontentamento e a tristeza que nos envolve

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Sean MacEntee

 

As pessoas servem-se da verdade quando ela lhes é útil, mas recorrem com retórica paixão à falsidade assim que se deparam com um momento em que a podem usar para produzir a ilusão de um meio-argumento (…), GOETHE, Johann Wolfgang von, "A Nossa Falsa Verdade"


Etimologicamente, a palavra exploração representa, de um modo sucinto e objectivo, um abuso ou um aproveitamento consciente detido sobre uma determinada situação ou sobre uma determinada pessoa que se encontra, impotente e inconstitucionalmente, numa situação precária desprovida de qualquer tipo de direito, dignidade e, consequentemente, remuneração.

Neste sentido, julgo que podemos considerar que, embora seja uma palavra histórico-social detentora de um elevado grau de negatividade, a exploração é, no âmbito da disciplina da Arquitectura, o termo que melhor substitui e, consequentemente, caracteriza todo o período que, erradamente, todos os responsáveis pela sua criação e pela sua realização descrevem como estágio. Este, constituído por uma enorme diversidade de atrocidades e compadrios, despoletou, como consequência de um controlo diminuto ou inexistente, uma contratação selvagem e desmedida de jovens arquitectos que, infelizmente, estão dispostos a ser explorados até ao limite das suas forças e dos seus conhecimentos sem qualquer tipo de benefício ou recompensa.

De modo a contrariar e a denunciar todo este sistema eticamente reprovável, acho que chegou o momento em que nos devemos, individual e colectivamente, manifestar dando a conhecer todo o descontentamento e a tristeza que nos envolve quando, indesejavelmente, nos encontramos sob a alçada de um conjunto de pessoas eticamente repugnantes que, enquanto arquitectos empregadores, se aproveitam, alegre e convenientemente, da situação frágil em que nos encontramos. Como tal, através da identificação e do aprofundamento de todos estes factores e de todos os intervenientes que empobrecem, social e disciplinarmente, a arquitectura, pretende-se alcançar, se possível, alguma conclusão conjunta que possibilite uma melhoria significativa deste fenómeno ou sistema que fustiga continuadamente toda esta jovem e qualificada classe trabalhadora!

Por sua vez, convém salientar que se pretende, ainda, conhecer e discutir qual é a posição, a participação e a mais-valia que o organismo denominado Ordem dos Arquitectos poderá ou deverá representar ao longo de todo este processo, de forma a privilegiar e a defender todos os direitos e todos os princípios éticos ou deontológicos que regem e dignificam a profissão e a actividade do arquitecto. A par da publicação de um regulamento deontológico e da emissão, pontual, de comunicados relacionados com esta temática, considero que a Ordem dos Arquitectos deve procurar ter um papel muito mais activo e preponderante perante este conjunto de entidades patronais fraudulentas e execráveis.

Posto isto, é com um enorme prazer que, com o intuído de contrariar toda esta submissão e de gerar uma desejada reflexão ou discussão conjunta, gostaria de apresentar este tema sensível, incontornável e preponderante na Concentração Portuguesa de Arquitectos em Mação.

Acredito que chegou o momento de dizer, pública e convictamente, basta!

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