Quatro tempos até chegar a uma proposta chumbada

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O secretário de Estado da Energia foi o coordenador do Grupo de Trabalho que juntou Bloco de Esquerda e Governo Enric Vives-Rubio

Entre Novembro de 2015 e Novembro de 2017 várias são as vezes em que o Governo e o Bloco de Esquerda debateram e acordaram pontos sobre a energia, em especial as rendas da energia. Dessa linha do tempo, há quatro momentos a registar e um facto comum a todos: o Governo esteve sempre contra a ideia de os bloquistas de aplicação de taxas às renováveis. Tem também protagonistas comuns.

11 Novembro 2015 

Acordo de Governo entre o PS e o Bloco de Esquerda 

Um dos dois documentos que deram origem à geringonça foi o acordo assinado entre António Costa e Catarina Martins. Nele se anuncia a criação de um “grupo de trabalho para a avaliação dos custos energéticos com incidência sobre as famílias e propostas para a sua redução” e especifica-se como motivação “os custos das famílias com a energia eléctrica e gás”. Nele nada é, no entanto, dito sobre novas taxas sobre o sector energético. Em concreto, a tarefa pedida ao grupo de trabalho que viria a ser constituído era “redesenhar a tarifa social”, de modo a torná-la mais acessível às famílias, e “retirar da factura de energia eléctrica a Contribuição do Audiovisual e incorporá-la no universo das comunicações sem perda da receita para a RTP”.

Signatários do documento: António Costa, Catarina Martins, Carlos César e Jorge Costa.

Fevereiro de 2017

Relatório do grupo de trabalho conjunto sobre custos energéticos 

Na lista das medidas debatidas para a redução do défice tarifário e da factura das famílias figura o “alargamento da contribuição extraordinária do sector energético (CESE) aos centros produtores em regime especial (PRE)”, o equivalente  ao alargamento da taxa da energia aos produtores de electricidade de fonte renovável. Em causa estava uma proposta do Bloco, com a qual o Governo e PS não concordaram, o que também vem mencionado no documento. O Bloco calculava que o sector tinha tido um “lucro excessivo” de 500 milhões de euros, visando especificamente a EDP Renováveis e o diferencial de preços praticados em Portugal e Espanha. Justificava assim a criação de um novo “contributo para baixar a dívida tarifária e os custos energéticos das famílias”.

Governo e PS opõem-se à ideia que esse “alargamento a uma área de investimento estratégico e de grande prioridade política poderia ultrapassar qualquer eventual vantagem de curto prazo”. Afirmam, em contrapartida, que “as renováveis são o sinal correcto que deve ser dado ao sistema eléctrico nacional” e que o “quadro regulatório e fiscal dos investidores em renováveis deve ser mantido até porque a sua estabilidade é indutora de maiores investimentos, criando uma vantagem competitiva face a outros países”.

Para o Governo e o PS, o caminho deve ser “transformar, por via do novo licenciamento sem qualquer subsídio à tarifa, as condições de mercado com impacto directo sobre os consumidores, no sentido da redução dos encargos com o sistema e da tarifa”.

Grupo de trabalho: Jorge Seguro, secretário de Estado da Energia (coordenador); Carlos Pereira e Luís Testa, deputados do PS; Jorge Costa e Adelino Fortunato, deputados do Bloco; Cristina Portugal, Presidente do Conselho Tarifário da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), convidada do Governo; Dulce Lopes, professora universitária, convidada do Bloco.

17 Novembro 2017 

Último dia da entrada de propostas de alteração ao OE2018 

Bloco de Esquerda entregou até esta data uma primeira proposta de aditamento ao Orçamento de Estado para 2018. Propõe, de forma breve, a criação de uma contribuição aos produtores de energia renovável, que, à luz dos trabalhos anteriores, já contava com a oposição do Governo e do PS. Tem apenas uma alínea na qual se prevê que “o Governo definirá uma contribuição sobre os produtores de energia actualmente isentos da Contribuição Extraordinária sobre o Sector Energético (CESE)”. O objectivo era fazer esse trabalho durante o ano de 2018 “com a finalidade de entrar em vigor com o Orçamento de Estado de 2019”.

Na nota justificativa desta proposta, o BE dizia: “não é aceitável que o sector renovável continue isento de qualquer contributo para reduzir a dívida tarifária.

24 Novembro de 2017

Plenário para votação das propostas de alteração ao OE 2018

O Bloco apresenta, antes da votação, uma nova proposta que substitui a anterior. A segunda proposta já define a nova taxa como “contribuição solidária para a extinção da dívida tarifária do Sistema Eléctrico Nacional (SEN)” e as respectivas condições de aplicação, tendo sido acordada com as Finanças e a Economia.

A proposta que viria a ser aprovada sexta-feira — e depois chumbada segunda-feira — cria a SEN com “natureza extraordinária” a aplicar a todos os produtores de electricidade renovável em regime em Portugal desde 1 de Janeiro de 2018. Açores e Madeira ficavam de fora.

Nas quatro páginas da proposta, o Bloco determinava que seria uma taxa de 30% incidindo sobre o que chama “sobrecusto”, traduzido na "diferença entre o preço médio da electricidade no dia da venda e o valor da tarifa garantida e paga que se repercutiu na factura” do consumidor. Os produtores abrangidos não podiam repercutir esta nova taxa “para efeitos de determinação do respectivo custo de capital”, ou seja, em termos fiscais.

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