Seis anos para reler o século XVIII

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Precisamente duas semanas depois de lhe ter cabido abrir o festival à Volta do Barroco na Casa da Música – com um notável programa de suites para cravo de Froberger, Händel e Bach – Fernando Miguel Jalôto apresentou-se em Aveiro com o Ludovice Ensemble, agrupamento dedicado à interpretação de música antiga, que criou em 2004 com a flautista Joana Amorim.

No centro do programa que trouxe aos Festivais de Outono (FO) de 2017 encontra-se exactamente o mesmo conjunto de três Leçons de Ténèbres, de Michel Richard de Lalande (1657-1726), com que preencheu o concerto realizado na Igreja da Misericórdia, nos FO de 2011. Trata-se das terceiras Leçons de Ténèbres de quarta, quinta e sexta-feira santas (as primeiras e segundas, de cada um desses mesmos dias, não chegaram até nós).

A memória desse concerto foi tão grata a António Chagas Rosa (director artístico dos FO desde 2008), que, seis anos mais tarde, lançou novo desafio ao Ludovice Ensemble: revisitar o mesmo programa, desta vez tirando partido do órgão da Sé de Aveiro (inaugurado em 2013) nos interlúdios às obras de Lalande.

O que se perdeu na ausência dos discretos elementos cénicos e de um certo intimismo do concerto de 2011, conquistou-se agora em som. Jalôto foi bastante comedido, mas consistente, na registação a que recorreu nas peças para órgão de André Raison (ca 1640-1719), Louis Marchand (1669-1732) e Pierre du Mage (1674-1751). Poder-se-ia até dizer que teria tido aqui uma prestação superior à da abertura do festival À Volta do Barroco, não fosse a incomparabilidade de exigência das obras e instrumentos de um e de outro concertos.

Eugénie Warnier encantou com uma voz límpida e óptima afinação, nesta que foi para si e para Miguel Henry (teorba, que assegurou o período de deslocação de Jalôto entre o órgão dos solos e o positivo do conjunto) a primeira apresentação em Aveiro. Do elenco “original”, manteve-se a dupla Jalôto e Sofia Diniz, cuja viola da gamba, seguríssima e muito presente, representou um elemento bastante forte do sucesso deste concerto.

Entre os onze eventos que os FO oferecem dispersos por 40 dias, em que a valorização da música e músicos portugueses parece manter-se como lema, a presença do Ludovice Ensemble permanecerá certamente na memória por, pelo menos, mais seis anos.

O festival prossegue este domingo, no Museu de Aveiro, com sonatas para violino e piano de Luís de Freitas Branco, interpretadas por Nuno Soares (violino) e Youri Popov (piano).

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