Conflito na ex-Jugoslávia transfigurou a selecção suíça

Seis dos 11 jogadores mais utilizados pelo adversário de Portugal na última jornada do Grupo B da fase de qualificação para o Mundial 2018 têm raízes no Kosovo, Bósnia-Herzegovina ou Macedónia

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Muitos jogadores suíços têm as suas origens em territórios da ex-Jugoslávia LUSA/GIAN EHRENZELLER

Apesar de em Fevereiro de 2014 50,3% dos eleitores suíços terem aprovado em referendo uma iniciativa “contra a imigração em massa”, a Suíça continua a ser um dos países com a maior proporção de estrangeiros no seu território. O fenómeno não é novo e teve início no século XIX, com a construção dos caminhos-de-ferro que geram a primeira onda de imigração, quase exclusivamente dos países vizinhos (Itália, França, Alemanha e Áustria), da Suíça moderna. No entanto, na segunda metade do século XX, com rápido desenvolvimento económico do pós-guerra em terras helvéticas, o fluxo migratório mudou. A necessidade de mão-de-obra não qualificada atraiu, principalmente, trabalhadores de Portugal e da ex-Jugoslávia, e o conflito nos Balcãs, no início da década de 90, acabou por transfigurar a selecção suíça de futebol: seis dos 11 jogadores mais utilizados pela Suíça na fase de qualificação para o Mundial 2018 têm raízes no Kosovo, Bósnia-Herzegovina ou Macedónia.

Quando na primeira metade da década de 90 uma talentosa geração de jogadores, onde se destacavam nomes como Hottiger, Sforza, Sutter, Türkyilmaz e Chapuisat, recolocou a Suíça em fase finais de grandes competições de selecções (Mundial 94 e Euro 96) após quase três décadas sem qualquer presença helvética em Campeonatos do Mundo ou da Europa, os Balcãs estavam em guerra civil. Com os conflitos provocados pela desintegração da ex-Jugoslávia, milhares de trabalhadores originários desta região do centro da Europa, que trabalhavam na Suíça com contrato temporário de trabalho, tiveram direito ao estatuto de refugiado; a grande maioria aproveitou para retirar os familiares dos palcos de guerra, levando-os para a Suíça. Cerca de 25 anos depois, os efeitos deste processo são bem visíveis no futebol suíço.

Segundo um relatório da Secretaria Federal de Estatísticas da Suíça publicado em 2015, 15,2% dos dois milhões de estrangeiros que habitam na Suíça são originários de países da ex-Jugoslávia (os portugueses são 13,1%), e estes números estão bem reflectidos no último adversário da selecção nacional na qualificação para o Mundial 2018. Nos nove jogos dos suíços no apuramento, o seleccionador Vladimir Petkovic, que nasceu em Sarajevo, na Bósnia, utilizou 29 jogadores. Olhando para os 11 mais utilizados, é possível fazer uma equipa-tipo onde apenas o guarda-redes Yann Sommer, e os defesas Stephan Lichtsteiner e Fabian Schär não são emigrantes ou filhos de emigrantes.

Johan Djourou, que habitualmente faz parceria com Schär no centro da defesa, nasceu em Abidjan, na Costa do Marfim, e foi viver para a Suíça quando tinha 17 meses, após ser adoptado. Poupado contra a Hungria, Ricardo Rodríguez, que esta época transferiu-se para o AC Milan, nasceu em Zurique, mas é filho de pai espanhol e mãe chilena.

Se no sector defensivo não se sente a influência dos Balcãs, do meio-campo para a frente nos seis jogadores mais utilizados por Petkovic há quatro que nasceram em países da ex-Jugoslávia e dois que são filhos de emigrantes originários desta região. Fora das preocupações de Fernando Santos por estar lesionado, o médio defensivo Valon Behrami, que joga na Udinese, nasceu no Kosovo e mudou-se com a família para a Suíça quando tinha cinco anos. Xherdan Shaqiri, uma das estrelas helvéticas, tem um percurso similar: nasceu em Gjilan, cidade kosovar, em 1991, mas um ano depois já estava a viver nos arredores de Basileia. A influência do Kosovo não se fica por aqui. Os pais de Granit Xhaka, que foi utilizado em todos os jogos, são kosovares albaneses. Já Blerim Dzemaili e Admir Mehmedi, nasceram na Macedónia – em cidades a menos de 50 quilómetros da fronteira com o Kosovo -, mas emigraram para a Suíça com a família com menos de cinco anos. Finalmente, um dos principais perigos para Portugal será Haris Seferovic e o nome do benfiquista não engana. O ponta-de-lança da Suíça nasceu em Sursee, cidade do Cantão de Lucerna, mas as suas origens estão no norte da Bósnia: os pais de Seferovic nasceram na cidade bósnia Sanski Most e emigraram para a Suíça no final dos anos 80.

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