Inspectora da PJ Ana Saltão absolvida pelo Tribunal de Coimbra

Inspectora da PJ acusada de matar a avó do marido foi absolvida pela segunda vez. Tribunal de Coimbra colocou em questão tese do Ministério Público, que diz que vai recorrer.

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Ana Saltão (ao centro) LUSA/PAULO NOVAIS

Absolvida, condenada e agora novamente absolvida. Na repetição do julgamento em que era acusada de matar a avó do marido, a inspectora da Polícia Judiciária Ana Saltão foi absolvida. Vingou o princípio in dubio pro reo.

A leitura da sentença estava marcada para as 16h desta sexta-feira, mas minutos antes já mais de cem pessoas esperavam à porta da sala de audiências, que foi depois alterada para uma de maior dimensão. Já dentro da sala, a oficial de justiça teve de pedir ao público para que os que já estavam sentados se encolhessem de modo que os que ainda estavam em pé se pudessem sentar.

O Tribunal de Coimbra entendeu que a acusação do Ministério Público (MP) não apresentava argumentos suficientes para condenar a arguida pelos crimes de homicídio qualificado e de peculato. O caso tem quase cinco anos, já deu várias voltas nos tribunais. A 21 de Novembro de 2012, o corpo baleado da avó do marido de Ana Saltão foi encontrado na sua residência, em Montes Claros, Coimbra. Da sala da habitação foram recuperados 14 projécteis. Filomena Gonçalves tinha 80 anos.

Nesta sexta-feira, durante pouco menos de hora e meia, Ana Saltão ouviu a terceira leitura de sentença sobre o caso em que é acusada de homicídio e de peculato e a segunda que a considera inocente. O presidente do colectivo de juízes, Miguel Veiga, entendeu que a tese de motivação económica apontada pelo MP é pouco credível e levantou também dúvidas sobre as circunstâncias do crime. Explicou ainda que tanto a decisão do colectivo de juízes como do tribunal de júri criado para este julgamento foram unânimes. O MP vai interpor recurso.

Uma primeira decisão em primeira instância já tinha absolvido a arguida em 2014, mas o MP recorreu. O Tribunal da Relação de Coimbra condenou depois a inspectora da PJ, em 2015, a 17 anos de cadeia. Dessa vez foi a advogada de defesa, Mónica Quintela, que recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ). Já em 2016, este decretou a repetição do julgamento — que teve início em Maio deste ano — por entender que várias perguntas continuavam por responder.

Logo no início da sessão, nesta sexta-feira, o presidente do colectivo de juízes avisou que a sentença era longa, pelo que ia apenas dar nota dos pontos essenciais. Segundo o tribunal, o MP fundamentava a acusação em três pontos: o casal vivia em sobressalto financeiro e, por isso, a arguida terá decidido tirar a vida à avó do marido; a inspectora ter-se-ia apropriado da arma que estava na gaveta de uma colega de trabalho; a arguida deslocou-se a Coimbra e atirou contra a idosa.

Relativamente ao desaparecimento da arma da colega de Ana Saltão, o tribunal não conseguiu apurar se “foi extraviada ou subtraída”. A pistola estava num móvel fechado à chave e seria necessário aplicar pressão e fazer algum barulho para o arrombar. “É possível. Pode também não ser possível”, referiu Miguel Veiga. A execução do crime foi igualmente posta em causa. “Se a ideia era ser um golpe subtil, despejar 14 tiros não é propriamente muito subtil”, afirmou, fazendo ainda referência a outras dúvidas. Por exemplo, o facto de a rua onde habitava a vítima ser de sentido único e a arguida ter de deixar o carro longe do local para não ser associada. Não haver certeza sobre se Saltão teria tido tempo para chegar a Coimbra à hora a que terá acontecido o crime.

Mais: a acusação procurou retratar a actuação da arguida ao longo do julgamento como sendo marcada por “uma dose de calculismo e frieza”, próprias de quem “arquitectou o plano”. Mas na avaliação do tribunal “a execução do plano arriscou-se a um completo fracasso”, o que não condiz com o retrato feito pelo MP.

Vestida de preto e sentada em frente do juiz, Ana Saltão só olhou para trás quando um membro do júri se levantou e abandonou a sala. Quando o magistrado declarou a absolvição, Mónica Quintela sorriu, olhou para audiência e para a arguida. Já fora da sala, afirmou que esta decisão “era expectável, atendendo à prova produzida”, realçando que “é a segunda vez que Ana Saltão é absolvida por um tribunal de júri”, o que significa que já são 14 pessoas. “Esta investigação não tem sentido nenhum, foi mal feita e deixou por descobrir efectivamente quem terá sido o autor do crime”, lamentou.

Durante o processo, referiu a advogada, Ana Saltão esteve sempre a trabalhar na PJ do Porto, exceptuando os períodos em que esteve de baixa.

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