E depois das eleições, quem consegue governar a França?

Face a este cenário, face à pulverização do eleitorado e ao progressivo distanciamento entre os candidatos, a única coisa certa é que a França vai ter muito a discutir depois do dia D.

O que é que pode acontecer em apenas 12 dias? Ontem, no dia em que a campanha presidencial começou oficialmente em França, as capas dos jornais encheram as bancas de pontos de interrogação. “Incerteza sem precedentes”, anunciava o Le Monde, apontando num calendário o ano em que as sondagens mais se assemelhavam ao ponto de partida que temos hoje.

Sim, também em 2002, apenas a duas semanas das eleições presidenciais, os estudos previam um duelo à segunda volta (Jospin e Chirac). Mas anotavam uma subida dos indecisos e questionavam o que queria dizer um número tão alto de prováveis abstencionistas. Bastaram duas semanas para que todos, em França e fora dela, percebessem a resposta à pergunta: a indecisão era só vergonha de dar uma resposta a quem perguntava. No segredo da cabine de voto, os franceses colocaram na segunda volta das presidenciais o primeiro dos Le Pen.

Passaram 15 anos e alguns analistas comentam as coincidências, fazem contas e anotam as probabilidades. O que quererão dizer tantos indecisos e prováveis abstencionistas, na primeira e na segunda voltas? Uma nova pista aumenta ainda mais as interrogações: se Fillon estabilizou à direita e Mélenchon subiu seis pontos à esquerda (em duas semanas), o que quer dizer tanta flutuação nas intenções de voto?

E voltamos à pergunta inicial: o que é que pode acontecer em 12 dias de campanha? Pensando no que aconteceu no Reino Unido há quase um ano, na América há cinco meses, pode acontecer tudo. Mas a verdade é já aconteceu muito. E deixará marcas: pela primeira vez na história da França moderna, os eleitores afastaram-se dos candidatos dos grandes partidos, mostrando que não era um mito o cansaço da bipolarização e a radicalização da política; pela primeira vez na história da Europa moderna, uma campanha divide-se precisamente na questão europeia, questionando o euro, o mercado livre e as regras de integração (ou de afastamento).

As sete sondagens do fim-de--semana, explicadas pelo Jorge Almeida Fernandes, mostram que a França está perante a sua grande divisão, com os eurocépticos (e soberanistas, embora em sentidos diferentes) a poder chegar bem perto dos 50%.
Face a este cenário, face à pulverização do eleitorado e ao progressivo distanciamento entre os candidatos, a única coisa certa é que a França vai ter muito a discutir após o dia D — porque, mesmo não ganhando Marine Le Pen, sobrará sempre uma derradeira e decisiva interrogação: depois das votações, das presidenciais e das legislativas que decorrem já em Junho, o novo Presidente governará a França com o apoio de quem?

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