Quem manda na Casa Branca de Trump?

Bannon, Priebus, Flynn, Kushner, Ivanka — todos ajudam à desordem. Mas como diz um conselheiro, o Presidente é um darwinista e "deixa-os lutar pelo que querem". Desde que no fim, mande ele.

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O chefe de gabinete Reince Priebus, Mike Pence (vice-presidente), o conselheiro Steve Bannon, o porta-voz Sean Spicer e o conselheiro de Segurança Nacional National Michael Flynn, na sala oval da Casa Branca Jonathan Ernst/Reuters

Pouco depois de o helicóptero do Presidente Donald Trump ter levantado voo do relvado da Casa Branca para um fim-de-semana prolongado na Florida, as equipas de comunicação e política reuniram-se para uma primeira reunião de apresentação.

O encontro de sexta-feira no Edifício Eisenhower tinha tanto de social como de prático: muitos ainda não conhecem os nomes uns dos outros, as atribuição de pastas ou as extensões de telefone numa altura em que as falhas de comunicação estão a fragilizar a jovem presidência.

Mas o briefing depressa deu lugar a uma outra crise na tarde de sexta-feira, quando um juiz federal suspendeu temporariamente a proibição de viagens decretada no início da semana. A decisão deixou novamente a Administração em dificuldades por causa de uma questão que atormenta os funcionários, semeou a confusão nos aeroportos e levou milhares de manifestantes para as ruas. Uma decisão que chegou no final de uma semana em que Trump, preocupado com percalços iniciais que minaram as suas políticas e a imagens de executivo que faz as coisas acontecer, tinha dado passos para tentar mostrar um novo sentido de competência.

Numa reunião com os dirigentes da sua equipa, na segunda-feira passada, conta um conselheiro que esteve presente, o Presidente emitiu um decreto inequívoco: "Reince [Priebus] é quem manda. Ele é o chefe de gabinete. Tudo tem de passar por ele". A directiva incluía fronteiras claras entre os vários departamentos e visava resolver rumores sobre lutas internas, que os seus assessores dizem ter enfurecido o Presidente.

No resto da semana, Priebus tentou assumir o controlo sobre a definição das políticas e a comunicação entre as agências, desacelerou a linha de produção de decretos presidenciais para evitar erros e tentou organizar os ritmos diários da Casa Branca.

O grande ideólogo continua a ser o estratega principal Stephen Bannon, que usa o caos como instrumento de transformação política, mas que os assessores dizem que está a tentar adaptar-se ao trabalho com a estrutura montada por Priebus. "Alguns de nós são mais agressivos do que outros, uns têm uma influência mais calmante, o que resulta numa parceria perfeita", diz Bannon. "Não há uma grande distância entre nós, nem entre nós e o Presidente".

A crescente visibilidade de Bannon – captada na capa da revista Time, que o descreve como "o Grande Manipulador" – chamou a atenção tanto de altos responsáveis como do próprio Trump, que se orgulha das suas aparições nas capas, ao ponto de ter interrogado seus assessores sobre a estreia de Bannon na Time.

As notícias têm apresentado a cúpula de Trump como estando formada por duas facções em disputa, colocando Bannon e o conselheiro-chefe de política Steven Miller contra Priebus e os seus vices. Mas os responsáveis rejeitam esse retrato, dizendo que passam a maior parte do tempo a trabalhar em conjunto. "Nós vivemos basicamente juntos e estamos sintonizados", diz Priebus, referindo-se a Bannon, à sua vice Katie Walsh e a Miller. "Nós os quatro tornámo-nos super-unidos", garante.

A conselheira Kellyanne Conway tem assumindo um papel abrangente, por trás da ribalta, definindo a estratégia de comunicações. Garante que participa nas reuniões de planeamento de política, controlando tudo, desde o cenário das aparições presidenciais ao planeamento dos seus decretos presidenciais, preocupando-se com aquilo a que chama "RPI: real people impact" (o impacto no cidadão comum".

A equipa de Trump queixa-se que a imprensa se centra demasiado nos erros que a nova Casa Branca ainda não teve oportunidade de corrigir (apenas dois assessores ocuparam postos de relevo em administrações anteriores). E alegam que as críticas externas ridicularizam de forma injusta Trump e a sua equipa por agirem sem pensar, tal como fizeram durante a campanha — apesar de os problemas iniciais terem resultado das suas próprias acções".

"A única história destas duas primeiras semanas é o sucesso sem precedentes de uma administração a mudar o governo e a cumprir as promessas centrais da campanha presidencial — uma a seguir à outra", diz Miller.

Houve alguns sucessos. Na semana passada, a nomeação de Neil Gorsuch para o Supremo Tribunal e o decreto presidencial reduzindo as regulações financeiras, por exemplo, foram lançadas sem erros — em parte porque os assessores da Casa Branca se deram ao trabalho de explicar os seus planos aos funcionários do Capitólio e os jornalistas sobre os seus planos.

Ainda assim, a Administração continua a ser assombrada por deslizes, meias-verdades e tiros no pé, alguns dos quais desencadeados pelo próprio Presidente. Respondendo à decisão do juiz que suspendeu o veto migratório, a Casa Branca divulgou sexta-feira um comunicado em que anunciava que o Departamento de Estado iria apresentar um recurso de emergência contra aquela "decisão escandalosa", mas 12 minutos mais tarde enviou um comunicado actualizado omitindo a palavra "escandalosa".

A correcção, destinada a afirmar um tom mais moderado, foi revertida sábado de manhã quando o Presidente foi ao Twitter. Do resort de Mar-a-Lago, em Palm Beach (Florida), Trump escreveu três mensagens denunciando a decisão "ridícula" de um alguém a quem apelida de "pseudo-juiz". As missivas de Trump deixaram frustrados alguns assessores e sublinharam a tensão no governo entre os funcionários que tentar mostrar-se mais profissionais e um Presidente habituado a comentar indiscriminadamente.

Além disso, houve a declaração da Casa Branca a assinalar o Holocausto que não mencionou os judeus, quebrando uma prática bipartidária dos presidentes, que levantou polémica; e o telefonema agressivo de Trump com o primeiro-ministro australiano, Malcolm Turnbull, cujos pormenores foram relatados em primeira mão pelo The Washington Post, criou um problema diplomático com um dos aliados mais sólidos da América.

“Se vacilamos e parece que não sabemos o que estamos a fazer, isso diminui-nos perante as pessoas que votaram em Trump pensando que era um competente líder empresarial”, disse Ed Rollins, um estratega republicano que dirigiu um super-PAC pró-Trump. “Neste momento corremos esse risco.”

O próprio Trump parece estar a dirigir a gestão da Casa Branca, sugerindo que o conselheiro de Segurança Nacional, Michael Flynn, fizesse uma declaração em pessoa no briefing de quarta-feira, pondo o Irão na agenda devido ao teste com mísseis balísticos. Trump viu a performance de Flynn na televisão e ficou satisfeito, disse um assessor, dando-lhe depois pessoalmente os parabéns.

Muito do debate interno é mais sobre as linhas ideológicas do que sobre as questões pessoais, com as alianças a dependerem do tema. Trump concorreu como um empresário pragmático e não como um republicano, e moldou a sua Casa Branca dessa forma, com o Presidente a consultar tanto conservadores, como o vice-presidente, Mike Pence, como um contingente de conselheiros oriundos da ala mais liberal e de Manhattan.

De alguma forma, o ethos a que a Administração Trump aspira é o da eficiência e da realização, não o da ideologia. Jared Kushner, que é um dos principais conselheiros da Casa Branca e genro de Trump, está a trabalhar para criar uma firma de consultadoria interna, que por agora tem o nome de Grupo de Desenvolvimento Estratégico, e que pode vir a ser dirigido pelos executivos Chris Liddell e Reed Cordish e reconfigurar o trabalho da burocracia federal.

A decisão de Trump de não avançar com um decreto a desfazer várias das decisões de Barack Obama relativas a lésbicas, gays e transgénero deveu-se à acção da sua filha Ivanka e do genro, como noticiou o Politico em primeira mão.

Os filhos mais velhos de Trump, que são ambos ávidos caçadores, funcionam como uma voz moderada junto do Presidente no que diz respeito à protecção de terras federais.

Gary Cohn, um democrata que já foi presidente do Goldman Sachs e que é presidente do Conselho de Economia Nacional, ajudou a trazer uma abordagem mais progressita e mais sensível a Wall Street. Cohn orquestrou a proibição da entrada do comentador da CNBC Larry Kudlow, um conselheiro económico de longa data de Trump, na Administração e tentou afastar Peter Navarro, um crítico da China e um homem da linha dura no comércio, disseram fontes familiarizadas com as suas movimentações.

Figuras de Wall Street e activistas progressistas também encontraram um aliada em Dina Powell, antiga executiva do Goldman Sachs que se juntou à Administração e que é próxima de Ivanka Trump e Kushner.

Ken Blackwell, conselheiro principal de política interna na equipa de transição e investigador principal no conservador Family Research Council, disse que Trump vê a sua base como “um movimento que transcende o Partido Republicano”, onde as melhores ideias nascem da desordem.

“A abordagem dele é um bocadinho darwinista”, diz Blackwell. “Ele deixa-os lutar pelo que querem.”

No Capitólio, onde os legisladores controlam o destino da agenda de Trump nos temas principais, como a saúde e os impostos, a equipa do Presidente trabalha para reparar os danos causados pelo decreto da imigração.

Pence admitiu erros iniciais num almoço privado na terça-feira no Capitólio, em que disse aos republicanos, “Vamos fazer melhor”, como relataram alguns dos que participaram. Pence, que um republicano definiu como estando sempre à procura de uma agulha no palheiro, já se habituou ao seu papel — defender perpetuamente o Presidente e as suas acções.

Dois assessores da Casa Branca — o vice-chefe de gabinete Rick Dearborn e o director de questões legislativas Marc Short — também abordaram individualmente os legisladores com a mesma mensagem.

Depois de o senador Rob Portman se ter distanciado do decreto de proibição — “É uma proposta de veto que não teve o veto que merecia”, disse na CNN —, foi imediatamente abordado por funcionáriso da Casa Branca. Foram conciliadores, disse Portman, e passaram uma mensagem que se tornou o mais recente mantra da Casa Branca: “Vamos fazer melhor.”

Exclusivo PÚBLICO/The New Washington Post

 

 

 

 

 

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