PJ viu instrutor de condução a entregar "saco azul" a examinador em Vila Verde
Falando no Tribunal de Braga, no primeiro dia de julgamento daquele processo, que conta com 47 arguidos, o mesmo inspector da PJ disse ainda que um aluno, concretamente o futebolista Fábio Coentrão, confessou que foi ajudado no exame de código.
Um inspector da Polícia Judiciária (PJ) que participou na investigação a um alegado processo de corrupção com cartas de condução afirmou hoje que viu um instrutor a entregar um "saco azul" a um examinador em Prado, Vila Verde.
No entanto, sublinhou que não viu o que estava dentro do saco, entregue após a realização de um exame de código.
Falando no Tribunal de Braga, no primeiro dia de julgamento daquele processo, que conta com 47 arguidos, o mesmo inspector da PJ disse ainda que um aluno, concretamente o futebolista Fábio Coentrão, confessou que foi ajudado no exame de código.
Segundo testemunhou o inspector, quando Coentrão estava a fazer o exame entrou na sala um segundo examinador, tendo sido então que o futebolista respondeu, "em sete ou oito minutos", à esmagadora maioria das perguntas.
No dia do exame, Coentrão terá chegado ao volante da sua viatura a uma escola de condução em Prado, tendo daí sido transportado pelo instrutor até ao centro de exames de Vila Verde.
O inspetor da PJ disse que, normalmente, examinadores, instrutores e gerentes das escolas de condução combinavam por mensagens escritas (SMS) ou por chamadas telefónicas as ajudas aos alunos.
A investigação incluiu escutas telefónicas e vigilâncias, além de cruzamento de informações com o Instituto de Mobilidade de Transportes Terrestres (IMTT).
De acordo com o mesmo inspector, a partir de determinada altura, quando suspeitaram que estava em curso a investigação, os responsáveis pelos exames passaram a ser "mais reservados" nas comunicações entre eles, tendo mesmo um deles dito que era "preciso ter mais cuidado".
Entre os 47 arguidos, contam-se examinadores, industriais de condução, instrutores e um agente da GNR. De acordo com a acusação, deduzida pelo Ministério Público (MP), 24 dos arguidos respondem por corrupção passiva para ato ilícito e os restantes por corrupção ativa por ato ilícito.
Entre os que respondem por corrupção ativa está um militar do Destacamento de Trânsito da GNR de Braga, que, segundo o MP, terá pedido a um examinador que facilitasse o exame a três alunos.
O principal arguido no processo é um examinador do Centro de Exames de Vila Verde, classificado pelo MP como o "interlocutor privilegiado" nos episódios de corrupção, "por ser o mais velho" e o que ali exercia funções há mais tempo. Este arguido é acusado de 35 crimes de corrupção passiva para ato ilícito.
O objectivo era que os alunos fossem auxiliados pelos examinadores, a troco de quantias monetárias que, em média, variavam de 1000 a 1500 euros, no caso dos exames teóricos, e de 100 a 150 euros nos práticos.
Mas havia quem pagasse mais, como, ainda de acordo com a acusação, foi o caso do futebolista Fábio Coentrão, que terá desembolsado 4000 euros. Um pagamento feito em numerário, "por ter sido recusado o pagamento em cheque".
A acusação diz que, com este esquema, cinco examinadores conseguiram arrecadar 1,1 milhões de euros, dinheiro que o MP quer que seja declarado perdido a favor do Estado.
O processo, com epicentro em Vila Verde, envolve ainda escolas de Barcelos, Ponte de Lima, Vizela, Guimarães, sendo que os factos terão decorrido entre 2008 e 2013. Foi iniciado por uma denúncia de um empresário que é dono de uma escola de condução em Cabeceiras de Basto e de outra em Vila Nova de Famalicão e que é assistente neste processo.
Na investigação, desenvolvida durante anos pela Polícia Judiciária, também foram "apanhados" vários alunos, mas em relação a estes o MP optou pela suspensão provisória do processo.
Um dos que beneficiaram da suspensão foi Fábio Coentrão, que para o efeito aceitou pagar 3.000 euros ao Banco Alimentar Contra a Fome de Braga.