2016: caras e momentos para afagar o ego

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Telma Monteiro conquistou o bronze no judo olímpico durante os Jogos do Rio 2016

António Costa

A confiança em vez da austeridade

António Costa disse-o logo na posse como primeiro-ministro: “Este é um governo confiante.” Isto depois de ter sido sufragado em Congresso como líder do PS, em 30 de Novembro de 2014, sob o lema “Confiança”. Repetiu-o no primeiro debate quinzenal a 16 de Dezembro de 2015: “É assim que com segurança viramos a página da austeridade e abrimos um novo tempo de esperança para os portugueses e de confiança em Portugal.” E voltou a proclamá-lo no debate do seu primeiro Orçamento de Estado: “Depois de todos estes anos de incerteza, instabilidade, insegurança na vida das famílias e das empresas é essencial vencer o défice de confiança, restaurando um quadro seguro, que estabilize as expectativas dos agentes económicos.”

Antes mesmo de poderem ser medidos índices, valores, metas, o primeiro-ministro fez um intenso trabalho de auto-motivação. É certo que nem tudo foi só motivação psicológica, nem apenas palavras e propaganda. Mas numa primeira fase, António Costa apostou na capacidade de convencer os portugueses de que o país podia progredir, se fosse tentado um caminho diverso e alternativo à governação anterior.

Essa mensagem começou a passar mesmo antes de começarem a ser concretizadas as políticas de devolução de rendimentos e de reposição de medidas de austeridade tomadas pelo Governo anterior, liderado por Pedro Passos Coelho, obrigado então à aplicação das orientações imposta pelo Memorando assinado pelo Governo de José Sócrates em 17 de Maio de 2011 e que serviu de garantia para o Estado português receber um empréstimo de 78 mil milhões de euros, contraído junto da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu e do Fundo Monetário Internacional.

O Governo foi concretizando ao longo de 2016 as suas promessas de devolver os rendimentos e alterar as prioridades no que respeita à política de poupanças na política orçamental. Repôs assim os cortes na tributação directa dos rendimentos do trabalho, apostando na tributação indirecta e gerindo em termos espartanos a execução orçamental com radicais medidas de cativação de verbas destinadas ao aparelho do Estado.

Mas o clímax foi atingido com a forma como o Governo geriu a sua relação com a União Europeia. Enfrentando a iminência de sanções e de cortes nos fundos estruturais por ter excedido os 3% de défice em 2015, o Governo nunca cedeu nas negociações com a Comissão Europeia. O resultado foi que, logo em Maio, a Comissão Europeia deixou cair a aplicação de sanções. O passo seguinte aconteceu em Setembro, com Portugal a ser declarado fora do processo de cortes nos fundos estruturais, depois de o debate ter sido alargado também ao Parlamento Europeu e uma revisão do crescimento do PIB em 2015 pelo Instituto Nacional de Estatísticas ter recolocado o défice desse ano abaixo dos 3%.

O país aguarda agora por Março, para ver concretizada a saída do procedimento por défice excessivo a que está submetido há anos, uma vez que em 2016 o défice ficará abaixo do limite de 3% imposto pelo Tratado Orçamental. O país poderá voltar a afirmar-se como um parceiro de pleno direito na União Europeia. São José Almeida

Marcelo Rebelo de Sousa

O arauto da estabilidade política

Marcelo Rebelo de Sousa tinha um desígnio e passou o ano a trabalhar para ele: unir o país que saíra dividido das eleições e magoado do período de ajustamento, desdramatizando-o politicamente, estabilizando-o economicamente e mimando-o socialmente. Em 2016, o novo Presidente tornou-se o arauto da estabilidade, dentro e fora de portas.

Para tal, teve de transmitir uma ideia de “lua-de-mel” com o Governo da ‘geringonça’ que muitas vezes contrastam com as picardias trocadas com o líder do seu próprio partido. Mas o discurso afinado com o Executivo não foi à custa do apagamento do chefe de Estado. Pelo contrário, Marcelo nunca se calou ou escondeu por trás de António Costa.

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Adriano Miranda

Em apenas nove meses, usou por três vezes o veto político – duas vezes contra leis da Assembleia da República (gestação de substituição e novos estatutos dos transportes do Porto, STCP e Metro) e uma do Governo. Neste caso, relativo à lei que acabava com o sigilo bancário sobre contas acima de 50 mil euros, foi pública a radical oposição do Presidente a qualquer tentativa semelhante – e o Governo, contrariado, acabou por deixá-la cair.

Muitas foram as vezes que Marcelo promulgou diplomas do Governo e do Parlamento com avisos – pelo menos duas dezenas (mais ou menos em igual proporção) mereceram comentários do chefe de Estado. E isso valeu-lhe críticas a ele. “Quando há dúvidas, o Presidente deve vetar as leis, para dar à Assembleia da República a oportunidade de as aperfeiçoar, ou enviá-las para o Tribunal Constitucional”, considerou o constitucionalista Reis Novais ao PÚBLICO quando Marcelo promulgou a lei das 35 horas com avisos. Promulgá-las com recados “enfraquece as leis e não tem vantagem nenhuma”, defendeu o antigo colega de Marcelo no corpo docente da Faculdade de Direito de Lisboa.

Outra crítica, de outro constitucionalista, ouviu Marcelo a propósito da que publicou sobre a polémica das declarações de rendimentos dos administradores da Caixa Geral de Depósitos. “Nas funções do Presidente não cabe intervir publicamente e emitir parecer, feito jurisconsulto oficioso (por melhores que sejam os argumentos) sobre a interpretação da questão legal, cuja decisão cabe ao Tribunal Constitucional (TC). Há o princípio da separação dos poderes...”, escreveu Vital Moreira no seu blogue Causa Nossa.

O claro intervencionismo do chefe de Estado leva-o muitas vezes a fazer a sua própria defesa, afirmando que “cumpre escrupulosamente os poderes consitucioais”, que ele bem conhece enquanto deputado constituinte e professor de Direito que foi. Certo é que, em nove meses,  Marcelo Rebelo de Sousa transformou o perfil do Presidente da República, tornando a sua presença no espaço público e mediático mais constante que a de qualquer agente político, incluindo o primeiro-ministro. Leonete Botelho

António Guterres

"A maior vitória da diplomacia portuguesa"

"A maior vitória da diplomacia portuguesa depois de Timor-Leste", foi assim, medindo as palavras, que o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, qualificou a eleição de António Guterres para secretário-geral da ONU. Houve unanimidade e aclamação no Conselho de Segurança (CS), no dia 6 de Outubro. A Rússia, que era vista como o principal obstáculo à eleição do português (por alegadamente preferir uma candidatura do Leste europeu), assumira a presidência rotativa do CS e isso foi aproveitado pela candidatura de Guterres como uma "janela de oportunidade". Como? Dando a Moscovo a chave para a solução do impasse.

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Sem estar "presa por nenhum compromisso", a candidatura do português já era, desde Julho, assumida como second-best da diplomacia do Kremlin, que de facto preferia uma candidatura de Leste. Mas o Leste dividiu-se, e Sergei Lavrov, o ministro dos Negócios Estrageiros de Putin, assumira perante Lisboa que Guterres "seria um bom secretário-geral".

Isto tudo aconteceu antes do advento Donald Trump, mas a posição do novo secretário-geral pode não sair fragilizada neste novo equilibrio global. Desde logo porque um desanuviamento entre Washington e Moscovo, que parece ser uma das marcas da nova política externa americana, pode ser aproveitado para concentrar os esforços da ONU na resolução de problemas imediatos. Desde logo a crise dos refugiados, que Guterres bem conhece e não se esquivou de trazer para o primeiro plano do debate antes da eleição ou a situação na Síria, outra das suas emergências, que tem sido o palco privilegiado da escalada de tensão entre os EUA e a Rússia. Pode estar aí a chave da sua estratégia para ganhar espaço num xadrez inesperadamente complexo. Paulo Pena

Fernando Santos

O homem que acreditou sempre

Seja pela sua assumida condição de católico, seja pela absoluta convicção na qualidade do trabalho que vinha a fazer desde que assumiu o cargo de seleccionador nacional de futebol, a 23 de Setembro de 2014, Fernando Santos foi dos poucos que sempre acreditou no sucesso de Portugal no Campeonato da Europa. Ficou célebre a frase que proferiu depois de dois comprometedores empates frente à Islândia e à Áustria: “Só vou dia 11 para Portugal e vou ser recebido em festa.” E foi exactamente isso que aconteceu.

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Sem nunca ter deslumbrado, primeiro a selecção nacional ultrapassou  a fase de grupos no terceiro lugar, sem qualquer triunfo (somou um novo empate frente à Hungria) e beneficiando do resultado que os islandeses conseguiram contra os austríacos. Nos “oitavos” bateu a Croácia no prolongamento, seguindo-se a Polónia nos “quartos”, a qual só derrotou no desempate por grandes penalidades. Nas “meias” finalmente um triunfo nos 90’, perante o País de Gales. Estava assegurado o acesso à final de um Europeu de futebol, pela segunda vez na história da selecção portuguesa. Mas faltava dar o passe final. Contra a França, que jogava em casa, e sem Cristiano Ronaldo, que se lesionou nos minutos iniciais do primeiro tempo, Fernando Santos foi capaz de manter a equipa nacional com o sangue frio necessário para aguentar a pressão gaulesa. O golo do triunfo, apontado por Éder, já na fase final do prolongamento, entrou para a história. E Fernando Santos regressou a Portugal dia 11 de Julho e foi mesmo recebido em festa. Jorge Miguel Matias

Cristiano Ronaldo

Consagrado pelo mundo do futebol

As palavras são do próprio: “Foi o melhor ano da minha carreira a nível colectivo e individual.” Com uma história no futebol já longa e repleta de pontos altos, Cristiano Ronaldo reconhece que 2016 foi excepcional. Campeão europeu com a selecção portuguesa e pelo Real Madrid, o futebolista conquistou há poucos dias a Bola de Ouro, prémio que distingue o melhor jogador do mundo. É a quarta que recebe, deixando para trás mitos do futebol como Platini, Cruyff ou Van Basten. Pelo meio, viu o seu contrato com o Real ser renovado até 2021 por valores astronómicos e prepara-se para, já no mês que vem, ver também a FIFA entregar-lhe o prémio de melhor do mundo de 2016. J.M.M.

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Web Summit

Foram 50 mil por causa do empreendedorismo e da tecnologia

O irlandês Paddy Cosgrave foi durante algumas semanas um nome assíduo nas notícias. Cosgrave é co-fundador e o rosto mais conhecido da Web Summit, uma conferência de empreendedorismo e tecnologia que trouxe quase 50 mil pessoas a Portugal (foram 53 mil participantes no total), naquela que foi a primeira edição fora de Dublin. O Governo não se cansou de aproveitar o evento (e de aparecer ao lado de Cosgrave) para mostrar um Portugal amigo dos empreendedores. Por ora, estão garantidas mais duas edições em Lisboa, muito embora estejam a ser feitos esforços para convencer a organização a ficar mais tempo. J.P.P.

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Telma Monteiro 

A medalha que o país exigia

Foram 12 anos atrás da medalha olímpica mas, desta vez, ela não escapou a Telma Monteiro. A judoca chegou ao pódio dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro e conquistou o bronze na categoria -57kg. Foi a única medalha que Portugal trouxe do Brasil, nuns Jogos que ficaram aquém das expectativas em termos de presenças no pódio.
Constantemente apontada como candidata às medalhas, face aos bons resultados que obtinha em Campeonatos da Europa e do Mundo da modalidade, Telma Monteiro sucumbia nos Jogos. Falhou em Atenas 2004 (12.ª), em Pequim 2008 (9.ª) e em Londres (17.ª). Mas provou que era capaz no Rio 2016. J.M.

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PISA

O mérito de que todos querem ser pais

Ministros de agora e do passado apressaram-se a chamar a si o mérito: pela primeira vez, os alunos portugueses de 15 anos ficaram à frente da média da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) no megaestudo internacional para avaliar a literacia em Português, Matemática e Ciências, o PISA. Portugal é dos poucos países que tem registado uma melhoria contínua nos resultados desde 2000. O estudo mostrou que 38,1% de estudantes portugueses de meios pobres conseguem ficar entre os melhores a nível internacional, o que coloca o país em 13.º lugar nesta variável num conjunto de 70 estados. C.V.

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