O triunfo do medo

A Europa está hoje muito mais frágil e não se vê na burocracia de Bruxelas uma ideia estratégica para o continente.

O estado de emergência que foi renovado até 2017 torna mais evidente a fragilidade de uma França que não conseguiu recuperar do trauma de há um ano. E tudo se conjuga para que os próximos meses sejam ainda mais explosivos, com as eleições presidenciais em Maio, em que a segurança e a liberdade vão ser as duas faces de uma mesma discussão: a integração da população imigrante que vai a caminho de ser um
décimo de todos os habitantes.

Mais preocupados em conseguir que as muçulmanas que vão à praia exponham a pele ao gosto europeu do que em mostrar a todos o respeito pela diversidade e liberdade, o Estado francês falhou e continua a falhar na integração das comunidades estrangeiras. E por isso, pelo estado de fragilidade em que está a pátria gaulesa, Marine Le Pen está muito próxima do poder. Apoiada num discurso que explora as fraquezas da sociedade aberta, Le Pen constrói uma base de seguidores que quer reavivar a França e garantir a prosperidade económica. Mas quer acima de tudo recuperar a identidade que julgam perdida nos bidonvilles de Paris e nas madrassas do Sul. Se ela vencer, em Maio, saberemos que os terroristas triunfaram também.

A Europa está hoje muito mais frágil. O golpe mais sério veio de um “Brexit” em que o medo também foi chamado às mesas de voto, mas os problemas vão muito para além do fim da relação com os britânicos. Na União, não há sequer força para colocar na ordem a Hungria, cujos líderes insistem em atacar os fundamentos que deram coerência à ideia do continente unido. Schengen é pouco mais do que uma anedota, submerso em excepções que permitiram aos Estados reerguer as suas fronteiras. A ideia da solidariedade europeia afundou-se depressa num Mediterrâneo pejado de imigrantes — a quem ninguém quis responder como se devia e podia. São esses mesmos imigrantes que servem como figurantes nos filmes de terror que os populistas agitam em Inglaterra, na Holanda, em França, em Itália. E acabámos de ver este filme na sua versão de Hollywood, com direito a pipocas mas sem final feliz.

Com a Turquia numa deriva fascista, o Norte de África em constante estado de pré-implosão, a Rússia de Putin a exercitar os poderosos músculos militares e os EUA prestes a anunciarem um desinvestimento na NATO, é preciso ser muito optimista para acreditar num futuro risonho para a Europa. Até porque não se vê na burocracia de Bruxelas uma ideia estratégica para o continente.

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