Vereador de Lisboa defende "discurso radical" em defesa dos peões

Numa conferência sobre acalmia de tráfego promovida pela Câmara de Lisboa foram várias as vozes a defender que deve ser dada prioridade a quem anda a pé na cidade.

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"Os peões são os mexilhões nesta história", afirma o especialista em transportes Mário Alves Pedro Cunha

“Porque é que os passeios são interrompidos pela estrada”? A pergunta é do vereador dos Direitos Sociais da Câmara de Lisboa, que considera que “o predomínio do carro sobre a pessoa não faz sentido” e que é tempo de “optar por um discurso radical”, que coloque os peões como “prioridade”.

“A nossa primeira condição, desde que nascemos até morrermos, é a de peão”, sublinhou João Afonso, notando que “o direito à segurança na rua é algo essencial”. “A disputa permanente da rua entre o carro e a pessoa é algo que nos preocupa”, admitiu ainda o autarca dos Cidadãos por Lisboa, que falava numa conferência sobre acalmia de tráfego que se realizou esta segunda-feira.

Outro dos oradores nessa conferência, promovida pela equipa do Plano de Acessibilidade Pedonal da câmara, foi o mestre em Transportes Mário Alves. “Os peões são os mexilhões nesta história”, defendeu o técnico, considerando que é “um enorme falhanço da democracia” o facto de “alguém" - o automobilista - “estar a impor os seus direitos” no espaço público.   

E esse, sublinhou Mário Alves, “é um problema político com soluções políticas”. Até porque, notou, os investimentos necessários para promover uma acalmia de tráfego na cidade “são muito baratos quando comparados com o TGV ou com o aeroporto”.

Entre as obras possíveis para garantir que os direitos dos peões são salvaguardados, o especialista em transportes apontou os passeios corridos, as chicanas que obrigam os automobilistas a andar em ziguezague, as ruas “desconstruídas” com árvores e bancos e as zonas 30 e de coexistência. Algumas dessas medidas, observou, contribuem “não só para a segurança rodoviária”, mas também para a “coesão social” e para que haja “mais qualidade ambiental”.

Já Rita Castel Branco, responsável pela Divisão de Planeamento de Mobilidade e Transportes da Câmara de Lisboa, constatou que é necessário investir em acalmia de tráfego “porque o Código da Estrada não basta”. A arquitecta lamentou que hoje as ruas sejam vistas pelos peões como “espaços para andar de um lado para o outro, para atravessar”, e não como “espaços para viver, lugares de estadia”.

Membro da equipa do Plano de Acessibilidade Pedonal, Maria João Frias deu a conhecer nesta conferência alguns dos resultados de nove focus groups realizados no mês de Março com 43 cidadãos com deficiências visuais. Segundo a técnica, de uma forma geral as pessoas que neles participaram percepcionam as passadeiras, as paragens de autocarros e os passeios como “perigosos”. Um dos entrevistados referiu-se inclusivamente à estrada como “um oásis”, por estar livre de obstáculos como carros.

Também mencionados foram os números relativos aos atropelamentos ocorridos em Lisboa entre 2010 e 2013: nesse quadriénio houve 2746 peões vítimas de acidentes rodoviários no concelho, 27 dos quais faleceram em consequência dos mesmos. “São números que nos arrepiam”, reconheceu o vice-presidente da autarquia, Duarte Cordeiro, defendendo que embora deva haver “uma coexistência entre as várias formas de circulação” deve ser dada “uma centralidade” ao peão.

“São números de facto preocupantes”, aquiesceu João Afonso. Quanto ao facto de Alvalade e Avenidas Novas serem as freguesias com mais atropelamentos, o vereador notou que isso acontece “não porque seja pior andar nessas freguesias”, mas por serem aquelas “onde há muita circulação de pessoas, onde elas optam por andar a pé”.    

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