A tradição do cante chama outro Alentejo ao palco

Vozes do Alentejo junta no Centro Cultural de Belém e na Casa da Música um dos máximos expoentes do cante, o Grupo da Casa do Povo de Serpa, a novas interpretações musicais do Alentejo.

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Vozes do Alentejo Rita Carmo
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 “Essa é uma das preocupações que deve estar presente – o que é preciso é que as pessoas tenham contacto com esta música”, acredita Carlos Arruda, membro do Grupo Coral e Etnográfico da Casa do Povo de Serpa, presente na cerimónia de Paris. Sexta-feira e sábado, a formação apresenta o espectáculo Vozes do Alentejo no Centro Cultural de Belém (Lisboa) e na Casa da Música (Porto), num dos primeiros grandes momentos de celebração da nova visibilidade conseguida para o cante.

Vozes do Alentejo, no entanto, não foi pensado como o habitual ajuntamento de vários grupos corais, antes chamando para o convívio com o colectivo de Serpa músicos que, tendo a música alentejana no sangue, a reinterpretam de acordo com outras paisagens sonoras. Assim, Celina da Piedade, Paulo Ribeiro (vocalista dos Anonimato) e Bernardo Espinho (dos Bubedanas) levam para palco uma visão menos purista do cante, “com toda a contemporaneidade, todas as influências e toda a formação musical com que foram construindo o seu caminho”, descreve Arruda. “Só que essa raiz, o cante, continua sempre presente na sua forma de se expressarem.”

Foi, na verdade, nas tertúlias de cante alentejano animadas por Celina da Piedade às terças-feiras na Casa do Alentejo, em Lisboa, que a cantora e acordeonista se cruzou com Carlos Arruda e começou a crescer a ideia de concerto agora consumada. “Vou entrar no espectáculo no papel de um dos solistas convidados”, refere Celina ao PÚBLICO, “um pouco para representar os novos caminhos que estão a ser traçados com o reportório do Alentejo. Represento uma face não muito habitual: sou mulher, instrumentista e trabalho com o reportório alentejano mas não só.” Ainda assim, o último registo da cantora, O Canto das Ervas, incide precisamente sobre música da região.

Sem surpresa, com o cante no centro de Vozes do Alentejo, o Grupo da Casa do Povo de Serpa garantirá a apresentação do “cante puro e duro”, convidando depois os cantores e demais músicos a juntarem-se numa mostra das outras sonoridades que hoje em dia mesclam já esse legado com um conjunto de outras referências menos ancoradas na tradição. Pelo palco passará, por exemplo, um arranjo de Paulo Ribeiro para Circo de Feras, tema original dos Xutos & Pontapés subitamente transformado em canção para a planície alentejana.

Para Celina da Piedade, o desafio que agora se coloca ao cante passa por “conquistar o país todo”, lembrando que o processo de candidatura “aproximou muito os alentejanos do cante, de uma forma quase revolucionária e renovadora, porque em poucos anos conseguiu-se acercar dos jovens, algo muito difícil de fazer acontecer durante décadas”. “Essa geração, de repente, representa hoje uma força gigantesca no cante alentejano e isso vai ser provado neste espectáculo.” Para Carlos Arruda, todas estas experiências, desde que feitas com equilíbrio, respeito e sem desvirtuar o legado que os grupos corais querem manter vivo, apenas podem enriquecer a música do Alentejo e a sua divulgação.

Cuidar dessa riqueza inscrita na tradição passa ainda por contrariar a míngua de registos gravados a que o público pode aceder. Por isso, ainda que sem garantias de edição futura, Vozes do Alentejo será gravado nestas duas ocasiões. Para que o interesse mais generalizado pelo cante possa, afinal, ir encontrando novas formas de ser alimentado e reforçado.

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