O fantasma de Emmet e a América de hoje

Volta a pairar sobre a América o fantasma de Emmet, onde racismo e impunidade se misturam.

Nova Iorque, Ferguson, Cleveland, Phoenix: tudo parece conjugar-se para traçar, nos Estados Unidos, um cenário de abusos policiais onde as vítimas são sempre cidadãos negros e os agressores acabam sempre ilibados ou livres de julgamento. O que daqui resulta é um outro cenário, potencialmente perigoso: o de uma generalizada revolta. Como é possível que mortes ocorridas em condições tão duvidosas não sejam, pelo menos, levadas a julgamento, para que haja uma decisão séria sobre as circunstâncias em que ocorreram? Como é possível pensar que casos destes podem ser desvalorizados sem que isso acarrete, não apenas revolta pública, mas danos a médio prazo para o tecido social americano? A verdade é que, desde meados do ano, tudo se conjuga para os piores cenários. Eric Garner, 43 anos, morreu sufocado porque o polícia que tentou manietá-lo usou uma técnica de domínio proibida pela polícia de Nova Iorque e asfixiou-o; acusação contra Garner: suspeito de vender cigarros sem licença. Michael Brown, 18 anos, foi abatido com seis tiros, todos disparados de frente, um deles na cabeça; acusação contra Brown: agredir e provocar a polícia. Tamir Rice, 12 anos, foi abatido a tiro; acusação contra Rice: estaria a fingir que alvejava pessoas com uma arma que (foi essa a informação passada à polícia) se supunha ser – e era – falsa…

A 28 de Agosto de 1955, na cidade de Money, Mississipi, um rapaz afro-americano de 14 anos foi morto à pancada e a tiro e o seu cadáver desfigurado por ter assobiado a uma mulher branca. Chamava-se Emmett Louis Till. Os seus algozes atiraram o corpo a um rio, mas o cadáver foi depois encontrado e os culpados levados a tribunal. Foram todos absolvidos e a indignação que isso provocou acirrou a luta do Movimento pelos Direitos Civis. Hoje paira sobre a América o fantasma de Emmet: a morte violenta, inexplicável; e a também inexplicável impunidade dos autores. É preciso inverter este caminho.

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