À procura do 80.º membro

O encerramento da Convenção do BE atrasou meia hora, enquanto, no palco do Pavilhão das Olaias, um conjunto de dirigentes discutia. Perante o resultado das votações em que a moção de Catarina Martins e João Semedo tinha conseguido mais oito votos que a de Pedro Filipe Soares, mas em que as duas listas tinham ficado empatadas com exactamente 259 votos cada, entre quem assistia colocou-se a hipótese de que Pedro Filipe Soares estava a contestar o direito de Catarina Martins e João Semedo poderem continuar. Uma expectativa que foi desfeita pela explicação de um assessor: a discussão devia-se ao facto de que, pela contagem de votos, tinham sido eleitos apenas 79 membros, quando a Mesa Nacional tem 80 lugares, e a discussão em curso era para saber se entrava ou não mais uma pessoa ou se se ficava pelos 79.

A história parece bizarra ou mesmo absurda mas é verdadeira e serve de forma simbólica para demonstrar o que foi esta Convenção do Bloco: um partido em perda eleitoral e dividido, que em vez de tentar colar os cacos e encontrar uma estratégia de afirmação, fica com as divergências e as feridas mais expostas.

As duas tendências que se confrontaram na Convenção herdam o passado de 15 anos. De um lado o grupo Socialismo, protagonizado por Catarina Martins e João Semedo, do outro a associação UDP, protagonizado por Pedro Filipe Soares. E prolongam uma diversidade interna que no Bloco existiu desde a fundação, quando PSR, UDP e Política XXI se juntaram no novo partido/movimento em 1999.

Mas se as tendências internas são mais ou menos as mesmas, já que o grupo Socialismo junta a linha do PSR com a Política XXI, a realidade é que, o Bloco hoje está exaurido. Pedeu rasgo criativo, originalidade de apresentação de propostas e de discurso. Quem atentou no que se passou nesta Convenção percebeu como o discurso – quer no tom, quer no léxico – se fechou numa retórica de extrema-esquerda que quase surge como desajustada num partido que nasceu com a tentativa de inovar politicamente.

A forma como o Bloco chegou exausto a esta Convenção é demonstrado até pela forma como se posicionam dois dos principais fundadores. O antigo dirigente da UDP Luís Fazenda não teve hesitação e ser o mentor da candidatura de Pedro Filipe Soares. E mesmo no momento final, quando Semedo chamou à unidade no palco, Fazenda manteve-se ligeiramente afastado e isolado do grupo.

Já Francisco Louçã, ex-líder do PSR e durante anos o coordenador do BE, deixou a atitude equidistante de antigo líder e apelou à unidade em volta do grupo Socialismo, protagonizado por Catarina Martins e João Semedo. E afastou-se em definitivo da direcção, não deixando de deixar o rastro da diferença abissal entre o que são as suas capacidade de tribuno e as dos novos protagonistas do poder partidário no Bloco de Esquerda.

Sem o cimento do poder, que se foi esvaindo a cada uma das últimas derrotas eleitorais que o BE tem sofrido, sob a ameaça de ver esse poder esfarelar-se ainda mais nas próximas legislativas, o BE enfrenta um dos momentos mais difíceis da sua curta existência. E quando no domingo, os trabalhos encerraram foram negativos os indícios de que será conseguida a conjugação de esforços para que o Bloco recupere politicamente.

É possível que sim, que o Bloco venha a ter sucesso. Mas, por mais que João Semedo, no discurso de encerramento, garantisse: “Este Bloco é melhor e mais forte do que há três dias”.  Quem estava no Pavilhão das Olaias não pode deixar de ver que, quando Semedo, numa inteligente atitude de quem percebe que teve uma vitória de Piro, chama todos os membros da Mesa Nacional para junto de si no palco, Pedro Filipe Soares recusou apertar-lhe a mão.

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