Questões económicas ditam abandono escolar na Universidade de Vila Real

Reitor desafia o Governo a desenhar programas de acção contra o abandono escolar no ensino superior. Cerca de 20% dos estudantes não pagam as propinas a tempo.

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Abandono ocorre sobretudo no primeiro ano do ciclo de estudos Nelson Garrido

As questões económicas são decisivas para o abandono escolar na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), em Vila Real, um problema que afecta principalmente os estudantes do primeiro ano que se queixam ainda de dificuldades de adaptação e desapontamento com o curso.

Estas conclusões fazem parte de um estudo divulgado esta segunda-feira e que abarcou os cerca de 7.500 alunos de licenciatura e mestrado integrado da UTAD matriculados em 2013-2014. Foram identificados 1.117 estudantes em situação de incumprimento no pagamento de propinas e 86 alunos em situação de anulação de matrícula. Dos 1.203 identificados, foram contactados 355, dos quais 37 foram inquiridos por telefone e oito aceitaram participar numa entrevista presencial.

"Apontamos para uma pluralidade de causas que estão na base do abandono escolar, causas que têm como elemento fundamental a privação económica ", salientou Fernando Bessa, o coordenador do estudo.

Mais de 81% abandonaram a UTAD durante o primeiro ano do curso e apontaram como principais motivos: "licenciatura não correspondeu às expectativas", "dificuldades económicas", "adaptação à cidade e à vida académica", "conciliação com a vida profissional".

O desapontamento em relação à licenciatura está ligado, fundamentalmente, ao não ingresso no curso pretendido. O estudo revela ainda que se está perante alunos que, na grande maioria, "vivem de forma austera". Aliás, de acordo com Fernando Bessa, a maioria destes alunos não tinha acesso a bolsa de estudos, usufruindo, no entanto, de rendimentos familiares ou próprios baixos", isto, é, “não ganham o suficiente para pagar as suas despesas com os estudos.

Os 19 alunos que trabalham e participaram na investigação têm um rendimento médio de 515 euros. O rendimento familiar mensal é baixo, com 85.7% das famílias a viver com até quatro salários mínimos, verificando-se que 28.6% não superam dois salários mínimos. Metade dos alunos despendia, com os estudos, até 300 euros por mês.

O estudo refere ainda o incumprimento dos prazos de pagamento das propinas por mais de um milhar de estudantes (perto de 20% do total), situação que pode também indiciar carências económicas.

Na sequência deste estudo, a Universidade de Vila Real já disse que quer introduzir mecanismos de sinalização para evitar o abandono escolar, elaborar um manual de procedimentos, reforçar o apoio financeiro e possibilitar a prestação de trabalho na academia para os alunos com dificuldades económicas.

O reitor, António Fontainhas Fernandes, disse à agência Lusa que algumas das recomendações que não têm qualquer tipo de implicação financeira podem ser implementadas de imediato, nomeadamente a introdução de mecanismos de sinalização, aconselhamento e apoio aos alunos em risco de abandono, num trabalho que terá em especial atenção os caloiros, já que mais de 80% dos casos de abandono ocorrem entre os alunos que iniciam a sua vida académica.

A UTAD vai ainda criar um balcão único de atendimento aos estudantes para fazer a triagem dos casos sociais sinalizados. Além disso, o estudo recomenda o apoio financeiro aos alunos que, embora estejam acima do limiar mínimo para beneficiar de bolsa, têm um rendimento familiar que impede o prosseguimento de estudos. Aconselha também o reforço dos trabalhos na universidade para os estudantes em dificuldades, uma medida que já está em curso na academia e possibilita a realização de trabalhos na biblioteca, refeitórios ou eventos.

No entanto, o reitor considerou que para contrariar "este fenómeno" é preciso que o Governo fique também sensível e ajude a nível financeiro, nomeadamente a desenhar programas de acção contra o abandono escolar no Ensino Superior, em especial nas instituições mais periféricas, como é o caso da UTAD. Por isso mesmo, Fontainhas Fernandes referiu que o estudo vai ser enviado à tutela, bem como a eventuais mecenas, que possam contribuir para o reforço do Fundo de Apoio Social (FAS), introduzido no anterior ao lectivo e que ajuda financeiramente os alunos mais carenciados. 

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