Subinspector diz que trabalhadores de edifícios com amianto “têm que pressionar responsáveis a agir”

Quercus afirma que “não é tecnicamente e financeiramente realista" que haja avaliação de risco em menos de cinco anos. Amianto foi detectado em 16% dos edifícios públicos.

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Enric Vives-Rubio /Arquivo

Mais de dez anos depois de a Assembleia da República ter recomendado a divulgação de uma lista dos edifícios públicos com amianto, ela aí está: 16% terá esta substância na sua construção. Mas nada se sabe sobre o que vai ser feito a seguir. O subinspector-geral da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), Manuel Roxo, diz que os trabalhadores dos edifícios com suspeitas de terem amianto “devem pressionar os seus responsáveis a agir”.

Dezasseis por cento dos 12.944 edifícios públicos terão na sua construção amianto, um material tóxico e potencialmente cancerígeno que está proibido desde 2005. A lista dos 2.015 dos edifícios que “presuntivamente contêm amianto” foi ontem publicada no Portal do Governo, sendo o Ministério da Educação e Ciência o que tem mais estruturas com o material. São cerca de 800 escolas, universidades e politécnicos.

No Ministério da Saúde são 11% dos edifícios, incluindo alguns hospitais e centros de saúde, no da Ministério da Economia são 32%, a Defesa Nacional  tem 17%, Solidariedade, Emprego e Segurança Social  16%, Ambiente 14%, o da Justiça, que terá 8% de edifícios com a substância, informa "que todas as situações estão a ser monitoradas para, onde se detectarem fatores de risco, se proceder à sua remoção no mais curto espaço de tempo". No mesmo sentido vão as informações do Ministério da Administração interna, com 10% de imóveis potencialmente perigosos: "Em colaboração com a ACT, serão confirmadas as situações e identificadas aquelas que comportam maior risco, mediante a realização de alguns exames laboratoriais. As situações de maior risco terão prioridade. A calendarização da monitorização e das acções corretivas será definida respeitando essas prioridades", refere a tutela das polícias, acrescentando que já antes tinha efectuado "intervenções em alguns edifícios". O Ministério das Finanças surge em último na lista.

Mas agora é preciso passar à fase seguinte, que é avaliar, para cada de um dos edifícios, qual é mesmo “o risco de exposição”, realça Manuel Roxo e haverá riscos para a saúde.

Isso inclui saber quantos trabalhadores estão expostos, de que tipo de amianto estamos a falar, se há libertação de fibras. E, no fim da linha, em quantos casos é que se impõe, de facto, a remoção, em quantos bastará ser isolado, ou ser feita uma manutenção periódica, enuncia Manuel Roxo. “Quando está em bom estado é melhor não mexer”, nota.

Esta lista “é uma identificação de suspeitas”, a seguir é precisa “uma análise mais fina que cada serviço vai ter que fazer e tem que haver um processo de decisão”. A ACT, que acompanhou e coordenou o levantamento, não tem competências para agir, mas diz que “as pessoas que trabalham nesses edifícios sabem agora que estes têm amianto”, sublinha.

“Têm que perguntar o que é que vai ser feito, os trabalhadores devem pressionar os responsáveis a agir”, notando que a lei obriga a que sejam informados e consultados sobre os riscos que podem correr no seu local de trabalho. “Havendo suspeitas têm que se desfazer, se não há suspeitas têm que ser tornadas públicas e informados os trabalhadores”.

Carmén Lima, do grupo de resíduos da associação ambientalista Quercus, diz que ter uma lista já “é alguma coisa”, sublinha. O importante agora é haver “um plano de acção com prazos e metas, uma estratégia”, tendo a Quercus entregue uma proposta de estratégia à Presidência do Conselho de Ministros, em final de Maio. Em todo o caso, “não é tecnicamente e financeiramente realista que tudo aconteça em menos de cinco anos”, o que significa que é preciso comprometer este governo e os próximos com esta estratégia, reitera.

Também Mário Nogueira, da Fenprof, ouvido pela Lusa, defendeu que é preciso que fique claro onde está o amianto, qual é o grau de degradação e qual o prazo para a intervenção.

O relatório nada diz sobre prazos, referindo apenas que é preciso determinar os que devem ser “apenas sujeitos a acções regulares de monitorização” e os que devem “ser submetidos a novas análises no sentido ou de confirmar informações já recolhidas ou determinar a necessidade de realizar eventuais acções correctivas”.

Em bom estado e sem contacto com o ar interior, é considerado como um material sem grande risco e a sua remoção não é aconselhada senão quando um edifício é demolido ou remodelado. Mais problemáticos são os materiais com amianto “friáveis”, passíveis de libertar fibras, como os revestimentos de tubulações e caldeiras.

O Ministério da Educação chegou a fazer a sua lista de escolas com amianto em 2007. Mas o resultado deste esforço ficou em grande parte esquecido nas gavetas do Governo, não tendo conduzido a nenhuma estratégia centralizada.

As doenças relacionadas com o amianto mataram pelo menos 231 pessoas em Portugal entre 2007 e 2012, segundo dados da Direcção-Geral da Saúde. Em média, houve 36 mortes por ano por mesotelioma, um cancro raro que está associado à inalação de fibras de amianto. Portugal está longe dos países com maior taxa de mortalidade por amianto.

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