É Carnaval? É arraial? Não, é o Mundial

O Brasil "parou" para assistir ao jogo inaugural do Campeonato do Mundo.

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Os brasileiros assistiram como puderam ao jogo entre o Brasil e a Croácia e festejaram o triunfo Siphiwe Sibeko/Reuters

Uma espécie de Carnaval fora de época, um imenso arraial antecipado ou, sobretudo, uma festa do tamanho do planeta: o Mundial começou e trouxe com ele mais um motivo de celebração. Na Bahia, por estes dias, ninguém se faz rogado – ou não viessem aí os arraiais do São João, qualificada como “a maior festa regional do Brasil”. Pelo aquecimento, a festa promete.

O dia de arranque do Mundial começou a meio gás, num ritmo tímido, mas à medida que se aproximava a hora do Brasil-Croácia a animação começou a tomar conta das ruas. Numa proporção inversa ao número de carros na estrada, que se torna cada vez mais reduzido: “As empresas libertaram os funcionários às 12h. A esta hora já todo o mundo está em casa, tomando uma cervejinha”, explicou ao PÚBLICO a dona Vicência, vestida de baiana dos pés à cabeça.

Não seria bem todo o mundo. A Praça Municipal, onde chega quem usa o Elevador Lacerda para subir da Cidade Baixa para a Cidade Alta, é o ponto de passagem obrigatório para a multidão que segue rumo à festa. Deixamo-nos levar na corrente, pelas ruelas típicas do Pelourinho, em direcção ao Terreiro de Jesus – e a sentirmo-nos como a personagem dos livros "Onde está o Wally?", porque quase toda a gente veste as cores da selecção brasileira.

Excepto os bares, a meio da tarde todos os outros estabelecimentos estão de portas fechadas. “Graças a Deus”, responde o homem que colocava o cadeado na porta do Shopping do Pelô quando lhe perguntamos se fechou mais cedo para ver o jogo. Logo a seguir largou a andar de forma apressada, sem tempo para mais perguntas. Mas ao mesmo tempo que as lojas fecham, surge uma variedade de vendedores ambulantes que, em bicicletas, à cabeça ou em carrinhos de supermercado vendem bebidas, pipocas, amendoim, caju, algodão doce, buzinas e bandeiras – do Brasil, claro.

A esplanada da Cantina da Lua está a transbordar de gente. Com duas televisões, atraiu um grande número de adeptos: para além de brasileiros, claro, há australianos, holandeses, chilenos, espanhóis... As garrafas de cerveja vazias acumulam-se nas mesas e nem o dono do restaurante, “seu” Clarindo, sabe bem quantas centenas de grades teve de comprar para fazer frente à procura suplementar destes dias. “Não tenho nem ideia”, diz entre uma corrida e outra à esplanada.

Uma chuva morna cai durante alguns minutos mas não chega para arrefecer o espírito. O ritmo dos batuques entra pelos ouvidos e atrai-nos, como hipnotizados, na sua direcção. Olodum, uma espécie de palavra secreta que ouvíamos desde o início do dia, revela ser o nome de um bloco-afro do Carnaval de Salvador, autêntico emblema da capital baiana. Não conseguimos nem chegar perto do sítio onde actuam, porque a fila para entrar na zona onde também está o “telão” é gigantesca. Mas não há problema: logo na rua ao lado a banda Didá espalha animação ao ritmo do samba-reggae.

A actuação termina exactamente dois minutos antes do pontapé de saída. Subitamente, as pessoas dispersam em passo acelerado. Chegar ao “telão” é missão impossível, mas a resposta a essa dificuldade surge de improviso: as televisões viram-se para a rua, onde se juntam largos grupos a acompanhar o arranque do Campeonato do Mundo.

O golo na própria baliza de Marcelo foi um balde de água fria e trouxe silêncio e incredulidade às ruas do Pelourinho. “Eu não tenho coração para isto, já não chegava ser do Corinthians?”, exclama alguém em tom indignado. Mas a alegria explodiu com os golos de Neymar, assim como os foguetes no céu de Salvador. A festa começou e tão cedo não vai terminar.

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