SNS pagou menos seis milhões de análises no sector convencionado só em 2012

Dados fazem parte de estudo apresentado pela Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica, que diz que as dívidas ao sector estão a crescer e já ultrapassam os 90 milhões de euros.

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As quebras no sector estão a ter impacto no investimento em novos equipamentos que caiu 40% num ano Adriano Miranda

No período de apenas um ano, foram feitas menos seis milhões de análises clínicas no sector convencionado pagas pelo Serviço Nacional de Saúde, poupando o Estado 39 milhões de euros com esta redução. Porém, ao mesmo tempo, desde o final de 2011 que a dívida do sector público às empresas que vendem materiais nesta área tem vindo a crescer, atingindo agora prazos de pagamentos na ordem dos 550 dias e um montante que ultrapassa os 90 milhões de euros só nas empresas associadas da Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica.

Os dados foram divulgados no âmbito do Estudo de Caracterização do Sector do Diagnóstico in Vitro em Portugal, feito pela consultora Deloitte, a pedido da Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (Apifarma), e apresentado nesta sexta-feira em Lisboa.

O trabalho, que teve como objectivo perceber o impacto das medidas tomadas ao longo dos últimos três anos nas empresas ligadas ao sector das análises clínicas, contou com inquéritos a 19 das 35 empresas que estão no mercado nacional, segundo explicou Sílvia Moreira, da Deloitte, acrescentando que a amostra corresponde a 90% do mercado total. Destas, 12 empresas estão integradas na Apifarma, o que cobre 80% do total do mercado.

Antónia Nascimento, da direcção da Apifarma, destacou que o estudo permitiu perceber que a contenção de custos no sector da saúde está a ter um impacto directo tanto nas empresas que vendem os materiais necessários para se realizarem este tipo de exames como nos laboratórios com convenções para os fazerem. Por exemplo, só o investimento em equipamento caiu perto de 40% entre 2011 e 2012, de 24 para 16 milhões de euros.

“A renovação dos aparelhos instalados a nível hospitalar não está a ser feita da mesma forma que anteriormente porque não há capacidade por parte das empresas com a diminuição dos preços pagos e com os pagamentos em atraso”, admitiu a também responsável pela Comissão Especializada de Meios de Diagnóstico in vitro desta associação, acrescentando que “hoje vários estudos mostram que 60% a 70% das decisões clínicas são baseadas em testes de diagnóstico laboratorial e daí a importância de não se cortar de forma cega em meios importantes para a decisão clínica”.

No que diz respeito ao valor do chamado mercado do diagnóstico in Vitro em Portugal, em 2010 representava 277 milhões de euros – um valor que caiu para 239 milhões em 2013, estando com uma perda média de 7% ao ano. Tendo em consideração que os hospitais do SNS, as farmácias e os armazenistas são os principais clientes desta indústria, a tendência de queda tanto no volume como no valor pago pelas análises está a ter também “efeitos preocupantes”, segundo Antónia Nascimento. Além de estarem a ser feitos menos seis milhões de exames (menos 11%), o preço médio de cada exame é de 3,09 euros, quando em 2011 estava em 3,5 euros. Se recuarmos até 2007, o valor nesse ano era de 3,8 euros, o que corresponde a uma queda global de 215 milhões para 145 milhões de euros no período de cinco anos.

Questionada sobre se parte destes exames que eram feitos no sector convencionado não estão agora a ser feitos pelos próprios hospitais, já que o Ministério da Saúde deu orientações no sentido de as unidades internalizarem o máximo de produção possível, Antónia Nascimento contrapôs, justificando que só nos hospitais as empresas que vendem estes produtos e que integraram o estudo tiveram uma perda de 10% no volume de negócios em 2012. E garantiu que a mudança de comportamento, que relaciona também com a entrada das receitas electrónicas e a capacidade de maior controlo, é visível no número de exames pedidos em cada requisição médica, que baixou de uma média de 4,5 em 2009 para 4,2 em 2012.

Dívidas a aumentar
Porém, ao contrário de outros sectores da indústria farmacêutica em que a tutela tem vindo a regularizar a dívida em atraso por parte dos hospitais, Antónia Nascimento disse que, no caso das empresas que vendem estes materiais, a situação tem sido de degradação. Segundo os números de que dispõem para as 12 empresas associadas da Apifarma, que correspondem a 80% do mercado, o valor em falta por parte das unidades hospitalares ascende a 92 milhões de euros e a uma derrapagem de 550 dias – sendo que os valores anteriores a 31 de Dezembro de 2011 representam mais de 30 milhões de euros e não estão a ser pagos, completou o director-executivo da Apifarma, Heitor Costa.

“É um desafio convencer as casas-mãe [empresas internacionais com presença em Portugal] a continuarem a investir num país onde não vão receber”, sublinhou Antónia Nascimento, dizendo que é visível que os hospitais estão a regularizar as dívidas apenas mediante a chamada “lei dos compromissos”, ou seja, pagando só as que ultrapassam os prazos e que já podem resultar em sanções aos gestores. Além disso, a responsável alertou que as dificuldades tiveram tradução na redução de empregos nestas empresas, que passaram de 813 trabalhadores em 2011 para 770 em 2013. Do lado dos laboratórios de análises, o resultado é visível no número de espaços, que caiu 6% desde 2008, existindo agora 343 locais.

Por seu lado, Heitor Costa, questionado no sentido de se perceber a razão pela qual estas empresas não estão a ser alvo de pagamentos extraordinários como acontece no sector dos medicamentos, explicou que na maior parte dos casos o dinheiro apenas é canalizado para os laboratórios da indústria farmacêutica que assinaram um acordo de controlo de despesa nos hospitais com o Ministério da Saúde, com a contrapartida de receberem o dinheiro em atraso.

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