Quem tramou Viktor Ianukovich?

Sem o apoio dos oligarcas, o Presidente recuou e irritou Moscovo.

A imprevisibilidade é uma característica da política ucraniana. Os acontecimentos dos últimos dias têm sido a prova disso mesmo.

O acordo entre a oposição e o Presidente Viktor Ianukovich, patrocinado pela União Europeia, chegou no dia seguinte à jornada mais sangrenta desde que os protestos começaram, há três meses. Surgiu num momento em que a violência parecia ir engolir tudo. Mas ainda é cedo para medir quanto vale esse acordo.

Em primeiro lugar, porque Viktor Ianukovich é um homem de assinar compromissos, mais do que respeitá-los. Mas sobretudo porque a rua, a Maidan, onde se instalou a fronteira entre a liberdade e a ditadura, não esquece os mortos e exige a demissão do Presidente – a única saída aceitável para um chefe de Estado que deixou a sua capital transformar-se num teatro de guerra.

Que motivos levaram Ianukovich a recuar? Mais do que a pressão, tímida, dos ministros da UE, foi a evidência de que a rua não ia ceder. E, sobretudo, porque os oligarcas que patrocinam o Presidente e do qual ele depende deram sinais de que iriam deixar de o apoiar. Compreender os oligarcas é compreender o essencial da política ucraniana. A maioria dos actores políticos depende dos oligarcas, que construíram as suas enormes fortunas com a desagregação do aparelho produtivo soviético. Os oligarcas ucranianos, mesmo os que são culturalmente russófonos, não gostam da Rússia, por terem medo de serem engolidos pelos oligarcas russos. Gostam da União Europeia, mas preferiam não ter de respeitar as regras e o código de conduta comunitário. E têm medo de vir a ser atingidos pelas sanções.

Pressionado pela rua e sem o apoio dos oligarcas, Ianukovich cedeu e irritou os seus aliados russos. Moscovo não se revê no acordo e cortou os financiamentos que tinha acordado com o Presidente e dos quais a Ucrânia depende para não entrar em bancarrota. No imediato, alguém terá que pagar essa factura. A crise ucraniana está longe do desfecho. Abriu-se uma porta à mudança, mas esta ainda está longe da consolidação.

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