Kim Ki-duk, abusador

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Kim Ki-duk em Veneza Reuters

Kim Ki-duk, 18.º filme - no genérico, o currículo, não se desse o caso de alguém não ter reparado ou de ter feito mal as contas.

Foi com A Ilha, entrada na competição de Veneza na edição de 2000, que este sul-coreano começou a mostrar as garras a nível internacional, e, no caso desse filme, as garras eram anzóis: adereço com papel principal nos desmaios e vómitos de espectadores na sessão, rezam os relatos daquela edição.

Desde então, Kim Ki-duk tem feito para não desmerecer. Cada filme deixa a dúvida se a razão para os planos, para a história ou para as personagens não é tão-somente fazer jus a esse tipo de notoriedade. O que se espera de um filme de Kim Ki-duk? Nas excepções à regra, num filme como “3-Iron” (2004), história de amores que ocupam casas abandonadas, o exibicionismo da crueldade era suspenso, mas respirava-se em contrapartida um odor de falsidade e cinismo: parecia remake não assumido de uma obra-prima de Tsai Ming-liang, “Vive l"Amour” (1994).

Eis o novo, Pietà (concurso), história de um homem que vive da crueldade que inflige aos outros (e da usura). Um dia, nesta mistificação dostoievskiana num bairro pobre de Seul, surge na sua vida uma mulher que diz ser sua mãe, a mãe que o abandonou e que está na origem do trauma que fez dele um homem sem piedade. Nesse momento, o homem vai provar do seu próprio veneno... Um projecto de corrida de estafetas da crueldade, física e mental, preexiste aqui a qualquer projecto de cinema. O que faz de Kim Ki-duk um realizador... abusador.

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