Olhemos para o campo

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A cacofonia que tem rodeado os acontecimentos laterais do Benfica-Sporting do passado sábado é um bom sinal de como se vive o futebol em Portugal: muita atenção aos pormenores extra, falta de escrúpulos, violência e chico-espertice, memória curta e assumido desprezo pelo jogo propriamente dito. Proponho, portanto, que olhemos para a partida da Luz, mas lá para dentro do relvado, onde duas boas equipas mostraram que o futebol pode ser intenso sem ser destravado.

1.

O Sporting jogou o suficiente para não perder e o Benfica mostrou menos do que seria de esperar para quem queria ganhar. Isto numa primeira parte em que a táctica leonina de “secar” Aimar matando os seus alimentadores foi conseguida praticamente a tempo inteiro. Jogar para anular as principais armas do adversário é sempre uma admissão de inferioridade – e isso também não tem nada de mal quando se joga em casa do líder e a nossa equipa ainda procura assentar a sua estrutura. Dizer, portanto, que o Sporting jogou para não deixar o Benfica ganhar não é diminuir o bom trabalho de Domingos e da sua equipa. Por outro lado, o Benfica mostrou menos do que se esperaria devido ao bom trabalho dos adversários, mas também nunca deu mostras de perder a cabeça. Ou seja, assumiu que o adversário era valente e que teria de sofrer para ganhar.

2.

A expulsão de Cardozo, já na segunda parte, aconteceu numa altura em que a pressão do Sporting parecia estar a perder gás e quando a desvantagem obrigaria, certamente, os leões a virem para a frente, abrindo espaços. O Benfica, que chegara à vantagem de bola parada (e o aproveitamento deste tipo de lances é fundamental em duelos equilibrados), poderia então aproveitar. Mas não foi assim. Ou melhor, até foi, nos minutos finais, só que isso aconteceu já com os encarnados em sofrimento. O Sporting aproveitou a superioridade numérica para repor o seu controlo sobre o meio-campo adversário, ainda que sem o brilhantismo e a rapidez de execução que mostrara na vintena de minutos iniciais.

3.

Ou seja, o Benfica venceu e manteve os níveis de confiança. Mas o Sporting, que perdeu, não saiu diminuído desse ponto de vista. É claro que são três pontos a menos, mas é proeza de vulto conseguir manietar de forma sustentada uma equipa do Benfica que, apesar de longe do fulgor de há duas épocas, se apresenta agora com uma solidez exibicional muito respeitável. Em dez jogos destes, com o adversário a este nível, o Benfica não ganharia nem metade não fosse a sua reconhecida capacidade para maximizar as oportunidades de que dispõe. Isso e um guarda-redes gigante.

No Dragão, frente ao Braga, o FC Porto passou a bola a Hulk e ele tratou de ganhar o jogo. Exagero? Claro que sim, ninguém ganha jogos sozinho. Mas, perante um adversário que sabe jogar à bola e raramente se desune, foram a força e a magia do brasileiro a criar as brechas necessárias para chegar aos golos. Começam a aparecer sinais de vida por outras paragens – Moutinho, Defour, James... – e o pêndulo de Fernando continua a não falhar o compasso. Ainda assim, a noite poderia ter sido bem mais dura se não houvesse Hulk. O desafio agora é aproveitar esse balanço para acordar o conjunto. Depender apenas da inspiração e transpiração de um jogador é algo a que as grandes equipas não podem habituar-se. Mesmo que aconteça com alguma regularidade.

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