PCP "expulsou" administrativamente dezenas de renovadores em menos de um ano

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Nem todos os renovadores atingidos foram tratados da mesma forma e nem todos reagiram à expulsão pacificamente Nuno Veiga/Lusa

O PCP "expulsou" administrativamente em menos de um ano várias dezenas de militantes que pertencem à direcção do movimento renovador, segundo estimativas destes comunistas, que se dizem vítimas de "processos estalinistas".

Depois das expulsões dos ex-dirigentes Edgar Correia e Carlos Luís Figueira e da suspensão do ex-líder parlamentar do PCP Carlos Brito, em 2002, todos acusados de actividades fraccionárias, a direcção comunista optou em Abril deste ano por outra estratégia, mas com o mesmo objectivo: excluir os renovadores da actividade partidária.

Deixar de convocar aqueles militantes para as reuniões e actividades partidárias, recusar o pagamento das quotas e retirar a confiança política aos eleitos são os métodos aplicados aos que a partir de 22 de Março de 2003 integraram a direcção do Movimento da Renovação Comunista, composta por 109 pessoas.

Nem todos os renovadores atingidos foram tratados da mesma forma e nem todos reagiram à "expulsão" pacificamente, tentando alguns retomar a actividade no partido ou pedido explicações que ficaram na maioria dos casos sem resposta.

Hoje, alguns elementos reconhecem que os métodos conseguiram atingir os objectivos: houve desfiliações, como no caso do médico João Semedo, do Porto, e houve quem optasse por "ser comunista fora do PCP", mantendo o cartão de militante, como Carlos Guedes, de Lisboa.

Manuel Almeida, militante do PCP "desde Abril de 1974" foi dos que recebeu resposta por parte da comissão política aos seus pedidos de explicação, quando deixou de ser convocado para participar nos organismos em que estava integrado - a direcção regional do PCP do Porto, a assembleia municipal do concelho e a assembleia de freguesia de Campanhã, onde continua como independente.

"Neste momento não me considero militante do PCP", afirmou à Lusa Manuel Almeida, que até Abril exerceu o seu mandato na Assembleia Municipal do Porto, até lhe ter sido comunicado, por carta da comissão política do PCP, que lhe tinha sido retirada a confiança política e que por essa razão iria ser substituído.

Depois de nova troca de cartas com a direcção central comunista, Manuel Almeida recebeu uma última, de Albano Nunes, do Secretariado, dizendo "ó camarada Manuel Almeida, entendemos que o que diga respeito ao partido deve ser tratado por via orgânica".

Uma resposta que Manuel Almeida classificou de "estalinista, sem lógica formal e sem respeito pelos estatutos" e que permitiu aos renovadores perceberem que a estratégia da direcção era tratar "os afastamentos" como "questões regionais".

Contactado pela Lusa sobre a não convocação de militantes para reuniões e a recusa em receber o pagamento das quotas, o gabinete de imprensa do PCP afirmou que "não há comentários a fazer", alegando que se tratam de "questões locais".

No Porto, vários militantes, alguns dos quais integram a dinamizadora nacional do Movimento da Renovação Comunista, preparam-se para apresentar um pedido de demissão conjunto, por sector.

Manuel Almeida, também vice-presidente da Associação das Colectividades do concelho do Porto, disse à Agência Lusa que pretende "a curto prazo" apresentar a sua demissão do PCP, "em conjunto com outros elementos do movimento associativo".

Outros renovadores do Porto preparam-se para fazer o mesmo, por sectores, adiantou.

João Cunha Serra, professor e dirigente da Federação Nacional dos Professores, também obteve resposta da comissão política do PCP aos seus pedidos de explicação quando em Abril deixou de ser convocado para as reuniões.

"É uma espécie de degredo. Entenderam-me auto-suspenso por integrar o que disseram ser uma estrutura concorrente com o PCP e que não fazia sentido estar nos dois lados", afirmou João Cunha Serra à Lusa.

Neste momento o renovador afirma estar "dividido", não tendo ainda decidido se se demite formalmente do PCP ou não, e frisou que "a maioria dos que pertencem à dinamizadora foi afastada" pelos mesmos métodos.

Já Carlos Guedes, bancário de Lisboa, não obteve qualquer resposta aos e-mails que enviou aos organismos de direcção do PCP, atitude que classificou de "anti-democrática".

Viriato Jordão, presidente da direcção do Sindicato das Telecomunicações e Comunicações Audiovisuais, é dos poucos que tenta ainda obter resposta às três cartas que enviou à direcção partidária.

Sem participar nas reuniões e com o pagamento das quotas recusado, Viriato Jordão diz que continua "a ser comunista. Eles é que não".

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