A importância do Direito Internacional

Se mais argumentos não houvesse a seu favor, a cimeira de Paris chegaria para, no mínimo, qualificar de indiscutível a importância do Direito Internacional.

Um dos habituais equívocos daqueles que não compreendem os mecanismos do Direito Internacional é avaliarem-no como algo de confuso e distante da vida real, por ele regular as relações dos Estados entre si e dos Estados com as Organizações Internacionais. Fazem mal, porque esquecem-se de que o Direito Internacional, por se encontrar tão presente no nosso quotidiano, acaba sempre, de uma forma ou de outra, por condicionar a nossa própria existência.

Exemplo mais recente é o primeiro e histórico acordo mundial, legalmente vinculativo, que visa conter o aquecimento global, aprovado, no passado dia 12 de Dezembro em Paris, em plena Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas e no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima. Estiveram presentes nada menos que cerca de 150 chefes de Estado e de governo ao acto com que abriu a dita Conferência.

As mudanças climáticas decorrem do aumento dos níveis de emissão de gases de efeito de estufa na atmosfera, aumento esse resultante do nosso modelo industrial, que é, como se sabe, um modelo que essencialmente radica nos séculos XIX e XX e que, não obstante os aperfeiçoamentos entretanto introduzidos, em tudo se respalda num aproveitamento prolongado da energia fóssil, na queima de florestas, na agricultura e na pecuária.

No seguimento do acordado na capital francesa, a comunidade internacional, dando provas de assinalável unidade de pontos de vista, comprometeu-se a combater os efeitos resultantes das mudanças climáticas e a lutar pela redução das emissões de gases de efeito de estufa, agendando, para tanto, medidas tais como a economia de energia, e a fazer maiores e melhores investimentos em energias renováveis e reflorestação, tudo isso, como é lícito esperar, sem prejuízo da produção de alimentos, e sem abdicar dos esforços globais de erradicação da pobreza.

O Direito Internacional encerra os mesmos fundamentos e razão do restante Direito: contém, entre outras disposições, uma estrutura normativa com preocupações éticas, que convive em permanente tensão dialéctica entre os valores universais da justiça e da segurança, e procura a coordenação entre os interesses dos Estados, para que nem sempre a lei do mais forte prevaleça. Ora, em Paris, isso foi alcançado, com o reconhecimento de que países desenvolvidos devem ser tratados de forma diversa daquela com que são tratados países em vias de desenvolvimento, tudo em nome da equidade de procedimentos entre as partes signatárias e de molde a respeitar as suas particularidades. Os países mais ricos comprometeram-se a criar um fundo de fluxos financeiros consistentes, no valor mínimo de 100 mil milhões de dólares, a fim de fomentarem a adaptação dos países em desenvolvimento à redução da emissão dos gases de efeito de estufa.

Uma abordagem duplamente diferente da que havia sido feita até agora na chamada diplomacia climática: não se impuseram metas aos países, uma vez que são eles que decidem que medidas adoptar, e todos têm de participar. O documento aprovado entra em vigor até 2020, e os países que o levarem à prática deverão rever as suas contribuições quinquenalmente.

Para ajudar a manter o nosso planeta como um lugar habitável, protegendo-o das mudanças climáticas provocadas pela acção humana, mais de 100 empresas comprometeram-se a diminuir as suas emissões, 127 milhões de hectares de áreas degradadas serão recuperados por intermédio de programas como o African Forest and Landscapes Restoration Initiative, e a previsão para investimentos em energia solar ultrapassará a soma redonda de 1 bilião de dólares.

Depois da intervenção do Direito Internacional nas negociações e nas assinaturas finais dos acordos de Paris, chegará a vez do Direito Constitucional de cada Estado subscritor para concluir a vinculação com aprovação dos ditos acordos. Por cá, será aprovado pelo Parlamento, cabendo em seguida ao Presidente da República assinar para que seja posteriormente publicado no jornal oficial, no Diário da República

Em seguida, os referidos acordos, depois de ratificados e devidamente assinados, têm de ser depositados no Secretariado da Organização da Nações Unidas, após o que, só então, passarão a ter carácter vinculativo a partir de 2020. Se mais argumentos não houvesse a seu favor, a cimeira de Paris chegaria para, no mínimo, qualificar de indiscutível a importância do Direito Internacional.

Advogado, Sócio-partner da Dantas Rodrigues & Associados 

Sugerir correcção
Comentar