Leia, veja o filme, e depois vá ao jogo

A história da equipa argentina que surgiu num folhetim semanal, foi adaptada ao cinema e só depois chegou aos relvados

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A festa da subida do Sacachispas DR

Como todas as histórias, esta também começa com “era uma vez...”. Era uma vez uma ficção que se tornou realidade: uma equipa de futebol imaginada num folhetim semanal assinado na revista argentina El Gráfico por um jornalista uruguaio, que foi adaptado ao cinema em 1948 e quatro anos depois chegou finalmente aos relvados. O nome Sacachispas já era associado ao futebol ainda antes de haver o clube e, na próxima temporada, vai pela primeira vez na sua existência disputar o terceiro escalão.

“Borocotó” era o pseudónimo utilizado por Ricardo Lorenzo para assinar as histórias de futebol que escrevia na El Gráfico. A rubrica Apiladas, na última página da revista, contava as aventuras de um grupo de miúdos de um bairro pobre e do clube de futebol que tinham criado, o Sacachispas. Os textos conquistaram grande popularidade e em 1948 foram adaptados ao cinema por Leopoldo Torres Ríos. O filme “Pelota de trapo” também foi um êxito e representou o último passo antes de o Sacachispas se tornar real.

A primeira equipa do Sacachispas consistia num grupo de miúdos com idades entre os 11 e 13 anos que participou num torneio infantil que levava o nome da primeira-dama Evita. Perón providenciou um terreno onde construir um campo para a equipa e “Borocotó” escolheu as cores da camisola: branco e lilás em listas verticais. Mas não foi fácil satisfazer esse desejo, conforme narrou num dos seus textos. “O comerciante abanou a cabeça: ‘Lilás não temos’. Equivalia a não ter sonhos, tornava-se difícil explicar. Por outro lado, mesmo que entrasse em detalhes, não creio que me entendesse. Como expor essa mescla de recordações, sentimentos e nostalgias em torno de umas cores que eram tudo isso e muito mais? ‘Não pode ser violeta?’ Era parecido, mas não igual. Não podia ser igual. O meu Sacachispas vestia de branco e lilás, o novo vestiria as mesmas cores. ‘É a cor das glicínias’, atrevi-me a dizer”, escreveu o autor, evocando as flores que cresciam no recém-criado campo.

As dificuldades foram ultrapassadas e o Sacachispas iniciou um percurso maioritariamente feito nos escalões inferiores do futebol argentino. A equipa distingue-se pela originalidade com que entra em campo – já usou máscaras de super-heróis, barretes de pai Natal e também fez a haka, o ritual de guerra dos maori que a selecção de râguebi da Nova Zelândia adoptou e que executa antes de cada jogo – e recentemente fez um brilharete: eliminou o Arsenal de Sarandí, do primeiro escalão, e apurou-se para os 16 avos-de-final da Taça da Argentina.

Foi a primeira festa da época para o Sacachispas, que também comemorou o maior feito da sua existência com a promoção à B Metropolitana (terceiro escalão) pela primeira vez. O clube de Villa Soldati, bairro de Buenos Aires, veio das páginas da imprensa mas também já está nas páginas dos livros de história.

* Planisférico é uma rubrica semanal sobre histórias de futebol e campeonatos periféricos. Ouça também o podcast

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